quarta-feira, maio 14, 2014

Na estrada, de Boa Vista rumo a Santa Elena de Uairén


Dia 6 de maio fui a Santa Elena de Uairén  tentar resolver um problema com a minha documentação venezuelana. Havia tempos que não fazia essa rota sozinho, fosse de carro ou de ônibus. Puxando pela memória, diria que pelo menos uns 10 anos. Acho que a última entrada solitária gerou esta postagem. Ou teria sido esta, fruto de uma outra viagem mas só perpetuada bem depois?

Enfim, seja quanto seja, acordei cinco da manhã e seis horas estava deixando a casa. A estrada está com quase todos os buracos tapados, o que a deixa feito um tapete preto. Para ficar mais segura, só falta sinalizar verticalmente. 

Fiz os 230 km entre Boa Vista e Pacaraima em exatas duas horas. No posto da polícia militar encontrei equipes da produtora contratada pelo governo para fazer os VTs publicitários. O povo estava filmando as ações do programa Tolerância Zero nas Fronteiras, implantado recentemente para tentar controlar o tráfico de drogas e afins naquela parte do Estado. 

Pessoalmente, achei engraçado ver todo ser abordado para que o pessoal pudesse filmar. Depois de apresentar RG, habilitação e documento do carro à policial, vi que um antigo colega de prefeitura estava na equipe da produtora. Sai da parte coberta do posto da PM e buzinei para o Tino Cabeção, mas ele já estava atrás de outro carro, fora de minha visão. 

Quando ia embora, um PM, desses cinquentões, bateu no carro e mandou parar. Pediu todos os documentos de novo, perguntou o motivo de não ter parado na blitz (?), respondi que havia parado sim, perguntou por que o IPVA 2014 não estava pago, respondi irritado (mas controlado, claro, que ninguém se mete com polícia na fronteira) que não precisava pagar pois ainda estava valendo. Perguntou se haviam visto meus documentos, disse que sim e, insatisfeito e talvez querendo fazer bonito pras câmeras, foi perguntar dos colegas se haviam me checado mesmo. Voltou mansinho e mandou que prosseguisse a viagem usando o velho jargão: “pode ir, cidadão”.


Enfim, a viagem foi legal, apesar de não ter resolvido a questão que me levou até a atravessar a fronteira. Meter o pé no acelerador e ouvir a música no máximo faz bem para relaxar. Inclusive, na ida, aproveitei para ouvir todo o novo disco do Calle 13, Multi-viral, que havia baixado um dia antes. 

E agora, fotos e legendas que sintetizam a viagem:

Meu destino: o Saime

Precisa de pessoal para trabalhar ambos sexos? Hum...dubiedade, aqui me tens sem nunca ter saído.

É de lei: chicha para beber toda vez que entro na Venezuela. Aliás, chicha é a melhor coisa da Venezuela

Companheiros de lanche na panaderia perto das 4 esquinas de Santa Elena

Fui caminhar na cidade e aproveitei para entrar pela primeira vez na biblioteca de Santa Elena. Lá, olha quem achei: o livro O livre arbítrio, de Adair J. Santos, pai da patroa

Acho que nem na biblioteca central de Roraima deve ter cópia deste livro e dos outros dois abaixo

Ficha do livro, editado em 1986

Mais dois exemplares da coleção

Aproveitei e deixei um exemplar de meu livro Sem Grandes Delongas na biblioteca.

Frescolita, a segunda melhor bebida da Venezuela depois da chicha

Parada para lavar o rosto no terminal de ônibus de Pacaraima antes de voltar


Ao voltar,  às 13h30, os PMs continuavam pedido documentos do povo e pedindo para abrir os porta-malas 

Parada na BR 174 para esticar as pernas, molha o rosto e olhar ao fundo a serra do Parima, região onde meu pai nasceu

Os campos gerais, o lavrado, o cerrado de Roraima

Seguindo reto, sobe-se a serra e para-se na Venezuela

Fruto de muita pergunta no comércio: casabe, chamado de beiju no Brasil, e catalina (ou cuca, como também é chamada na Venezuela),  coisa gostosa que no Rio Grande do Norte chamam de bolacha preta ou sorda. Isso com queijo é uma delícia. =D

sexta-feira, maio 02, 2014

sexta-feira, abril 25, 2014

Tutorial simples e fácil: como fazer uma arte postal e como participar de uma mostra de arte postal


Arte postal, dito de forma bem simples, é uma produção feita no formato de cartão postal (10 x 15 cm) usando desenho, colagem, xilogravura e qualquer outra técnica imaginável que se encaixe nessas medidas. 

A arte postal também pode ser aplicada/feita em envelopes. Aí a ideia é você mandar para alguém a sua arte e este reenviar para outro até que a produção dê a volta ao mundo embelezando as caixas de correios de seus amigos e conhecidos.
 

É claro que os formatos podem e devem ultrapassar os dois exemplos acima citados. O recifense Paulo Bruscky, para citar um dos maiores artistas brasileiros a navegar por esta ondas, ampliou, literalmente, o conceito de arte postal ao produzir e enviar pelos Correios a seguinte peça gigante nos anos 1970:





Olha o tamanho desse envelope

Aliás, recomendo que faça uma pesquisa sobre o Bruscky. Em 2011, tive oportunidade de ver no centro cultural dos Correios de Recife uma exposição com várias etapas de sua carreira. O cara é bom demais há décadas.  Saca um pouco de seu cotidiano neste vídeo:


 

Com as novas tecnologias, há quem se dedique a trocar cartões postais via e-mail. E há também quem monte projetos para receber cartões postais que ilustram segredos, muitas vezes eróticos, que você dificilmente contaria para o seu melhor amigo. Quer ver? Olha um exemplo aí, retirado do site Obvius, e depois clica aqui para saber mais sobre o PostSecret




"Meu marido prefere que eu use um strap-on toda vez que fazemos sexo. Isso parte meu coração.”


Bem, com esta carga de links que o post carrega já deu para ter uma ideia de quão amplo é o espectro da arte posta (ou mail art, em inglês). E agora, como se cria, se você já definiu sua plataforma? Vou dar o exemplo a partir da minha primeira experiência na área. Se liga nas etapas:

1.    Conheça alguém que lide com isso. Tive essa sorte quando participei de edição 2012 do programa Onda Cidadã em São Paulo e pude trocar ideias com o professor-artista-fotógrafo Alexandre Vilas Boas, integrante do Coletivo 308, de Guarulhos.


2.    Receba ou busque uma convocatória para participar de uma exposição de arte postal e fique instigado com a ideia. A minha teve como tema “1964-2014: 50 ANOS DE ARTE CONTRA O ESTADO”, organizada pelo 308.







3.  
  Após decidir participar, leia o regulamento para saber os formatos aceitos e comece a pensar. Pense muito bem e depois disso faça os esboços de sua arte.
 


4.    Reflita sobre a mensagem de sua obra e force suas habilidades até atingir seu objetivo. No meu caso, como artista plástica frustrado e com quase nenhuma habilidade, o tamanho do passo atende ao tamanho da perna.
 

5.    Depois da fase de estudos e reflexão, vem a fase de definir o suporte e as técnicas. Será tudo digital ou vai usar colagem, pintura, desenho, montagem ou uma outra técnica? Definido isso, parta para a produção. Veja exemplos deste que lhes escreve:



Corte do papel suporte

Separe os recortes, se for o caso. Esta etapa requer que o seu material já tenha sido fotocopiado
Testes de posicionamentos

Mais testes/estudos de design
 
A caminho da finalização
6.    Feita a obra, fotografe-a antes de mandar para a exposição. A arte postal, depois de enviada, não lhe pertence mais e possivelmente nunca mais verá a sua obra.
 


Fotografar é uma opção, mas o ideal mesmo é que você escaneie o material


7.    Encaminhe seu material dentro do prazo para não ficar de fora da exposição.


8.    Espere as fotos que a equipe de produção fará do material exposto e fique feliz ao reconhecer o fruto de seu trabalho sendo, cof, cof, cof, admirado em outras cidades. No caso, a minha foi parar no Centro Cultural São Paulo. Olha ela aí (força o olho que você consegue):
 

De baixo para cima, na segunda fileira, a arte que parece uma bandeira é a minha


Visão geral

 Veja mais fotos neste álbum do Facebook ou no blog da exposição

9.    Fique feliz por fazer arte e busque a próxima convocatória para poder expressar-se.
 


....................................................
Essas são as dicas de nosso tutorial simples e direto a respeito do que é arte postal e sobre como participar de uma exposição do gênero. Se gostou, compartilha, curte, espalha.
 

Beijos.
 

(É claro que o título é uma grande brincadeira. Poderia ter feito apenas um registro de minha participação na mostra mas arte postal é algo tão bacana, o Paulo Bruscky é tão impactante e a mobilização que o coletivo 308 foi tão legal que não resisti a dar uma de especialista na área.)

terça-feira, abril 15, 2014

Quando a publicidade fica mal posicionada


Detrás dessas árvores há um outdoor gigantesco, nesses formatos que agradam aos publicitários. Como refrão, usaram "Você pode ver!".

Pena que não seja possível ler quase nada dele, seja de noite ou de dia. Primeiro, pela péssima localização (tomara que não cortem as coitadinha das árvores em nome da imagem institucional da nova-velha-continuidade da gestão estadual). Segundo, por ficar perto de uma esquina na qual há um sinal de trânsito.

Eu, pelo menos, chego aí olhando para o semáforo e para o cruzamento, checando se algum barbeiro não quer avançar a preferencial. Se estiver verde, vou embora sem olhar para os lados.

Se estiver caminhando no complexo Ayrton Senna, até consigo olhar o que está escrito, mas apenas parceladamente, conforme vou me deslocando. Quer dizer, péssimo lugar, né?

Mas vai que eu sou a exceção e na verdade o local foi escolhido após apuradas pesquisas de profissionais do setor, né?


segunda-feira, abril 14, 2014

Fim de semana quadrinístico

Sou fã de histórias em quadrinhos. De todo tipo, sem preferência, sem preconceito, bem coração vagabundo mesmo. Foi nos quadrinhos que aprendi a ler em português, era nos quadrinhos que passava horas divertindo-me aqui no Brasil, de férias, ou lá na Venezuela.

Quando vim morar no Brasil, uma das malas estava recheada de HQs nas línguas portuguesa e espanhola. Estão comigo até hoje.

Ao longo dos anos perdi muito material por empréstimos feitos a pessoas que não devolveram meus gibis. Também adquiri muita coisa em sebos e ganhei muito de amigos e parentes (quando vinha de férias, a ordem de lugares a visitar era esta: primeiro a casa dos avós maternos, onde ficava; depois a casa da vó paterna e em terceiro as bancas que ficavam perto da avenida Ville Roy. Meus tios já sabiam que ia pedir gibis deles).

Bem, pulando no tempo, aqui em Boa Vista conheci poucos colecionadores. Um deles é o Edney Barbosa de Melo, que fez capoeira comigo há décadas e tem uma caixa imensa, dessas que as operadoras de telefonia usam para colocar equipamentos, cheia de HQs bem conservados e protegidos. Destaco isso para dizer que apenas há poucos anos fui tratar com carinho de minha coleção.

Bem, o tema da postagem surgiu a respeito de um encontro de fãs de histórias em quadrinhos e colecionadores de miniaturas de super-heróis que rolou sábado passado no aeroporto de Boa Vista.
Alguns levaram parte de suas coleções e a turma passou a tarde inteira trocando informações e admirando os acervos expostos. 
Olha aqui todo mundo que participou do encontro no final de semana


  Neste link você verá mais fotos do encontro. Fui só olhar e não fiquei mais tempo por já estar comprometido com o Sarau da Lona Poética (que foi lindo, por sinal, e pode ser conferido aqui).

No domingo, recebi no apartamento em que guardo a minha coleção outros dois fanáticos: Michel Sales, jornalista que desenvolveu como trabalho de conclusão de curso uma HQ contando um famoso caso de corrupção local, e Aldemar Marinho de Brito, dono de uma coleção de milhares de revistas da DC e da Marvel Comix publicadas pela Abril e pela lendária Ebal. O material do cara está em perfeito estado de conservação e é de babar. Para guardar as revistas, mandou fazer uma estante que toma todo o corredor de sua casa. Olha ela:
Um mundo de gibis. Coisa par ficar doido

A minha coleção é bem modesta porém tem a riqueza da diversidade do material que veio da Venezuela e o que ganhei/comprei aqui. Aproveitando a visita deles, fui conferir as datas de compra e vi que tenho historinhas com pelo menos 32 anos.

Vamos ver o que o Michel Sales fotografou:



Kaliman, clássico semanal, virou até filme nos anos 1970, conforme descobri dia desses no youtube
Adaptação do filme Caldeirão Mágico, Melhores tiras do Recruta Zero, Tina e Penadinho, Condorito (que chegou a ser lançado no Brasil) e Pato Donald
Antiguidades



Entre mim e o Aldemar é possível ver lá trás uma pilha de HQs já conferida pelo colecionador

Exemplar de Aguila Solitaria


Marshal Law, quadrinhos apocalípticos

Impacto, HQ produzida no Brasil
Versão em espanhol de Lois Lane: Luisa Lane, com Jaime Olsen, o Jimmy Olsen do Super-homem

Fuego, outra série semanal que era publicada há muitos anos



 Bolinha, El Pájaro Loco, Super Ratón, Transformers (versão anos 1980), A Pantera Cor-de-Rosa e Luluzinha



E só não vimos mais por conta da fome e das esposas dos caras, que foram pegá-los para almoçar. Devo dizer que gostei de falar minhas HQs para outros. Compartilhar conhecimento é minha vibe. Por isso que sempre falo nas palestras: o quadrinho é uma ferramenta fantástica para fazer a molecada gostar de ler.

sexta-feira, abril 11, 2014

Articulando poesia, articulando alegria

E nestes momentos, fazendo poesia, ouvindo gente falando poesia, catalisando a vontade de quem curte literatura, que eu fico feliz, nem que seja rapidamente, esperando o próximo momento:








Sábado tem mais um Sarau da Lona Poética na praça do Mirandinha




Sábado tem mais um encontro de amigos e conhecidos que curtem literatura. É o Sarau da Lona Poética do Coletivo Arteliteratura Caimbé, que retorna ao gramado da praça do igarapé Mirandinha, no bairro Caçari.

A sessão de leituras e declamações começa às 18h e vai até 20h, permitindo que todos aproveitem o pôr-do-sol e o começo da noite. Quem não souber poemas decorados pode ficar tranquilo que a turma do coletivo levará alguns livros de autores locais e de outras partes do Brasil e do mundo. O megafone também estará lá para quem quiser projetar ainda mais a sua voz.

A Lona Poética estreia um novo “serviço” neste sábado: o espaço do escambo literário, para que os participantes possam trocar seus livros com outros interessados.

Sobre bebidinhas e comidinhas, lembrem da dinâmica da Lona: cada participante leva o que vai querer consumir e dividir com as demais pessoas.

Então é isso: neste sábado (12) tem Sarau da Lona Poética, começando às 18h, na praça do Igarapé Miradinha, bairro Caçari. Te esperamos, gente linda!

quinta-feira, abril 10, 2014

Conversas com Edgarzinho: dias de sol, dias de sombra

O céu de Boa Vista, às 8h da quinta 10.04: nada de nuvens
7h30, no carro, vamos para a escolinha:

- Papai, eu não estou vendo nenhuma nuvem no céu.

Eu, que mais cedo havia visto na TV a previsão “Chove no Norte e em Roraima o tempo fica estável”, com um sol imenso sobre o nosso pedaço no mapa, respondo:

- É, filho, hoje vai ser muito quente. Toda vez que não tem nuvens no céu vai ser muito quente, com o sol pelando a gente.

Ele, vendo o lado positivo (?) do sol e da luz:

- É, vai ser quente mas vai ser muito bom para brincar de fazer sombras. Legal, né?

- Uhum...



quinta-feira, março 20, 2014

A noite em que fui analisado


Cês sabem como é ser analisado e descobrir que havia ali no dito muito mais do que havia alcançado a nossa vã filosofia?

Não, não estou falando de ir deitar no divã dos psicólogos, psiquiatras ou psicoanalistas da vida. Estou falando de ter uma criação poética analisada por um especialista na área e de escutar o cara falando coisas que fazem sentido e que transcendem o que se pensou no momento da criação.

A história é a seguinte: sou agora aluno especial do mestrado do Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Roraima (PPGL/UFRR). Então me senti na obrigação de participar de um evento muito bacana organizado pelo programa, o III Simpósio de Estudos de Linguagem e Cultura Regional: Regionalismo e Interdisciplinaridades.

Ontem à noite, quarta-feira, 19 de abril, estava na plateia da mesa-redonda Poéticas do agora: do regional ao universal. O último a falar foi o professor doutor Roberto Mibielli, que apresentou a análise de quatro poemas de poetas roraimenses: Avery Veríssimo, Cora Rufino, Francisco Alves e este que lhes escreve.

Quando o professor começou dizendo que o autor do próximo poema estava na plateia, que era jornalista, descendente de indígenas e, por último, venezuelano, fiquei surpreso. Sou eu, beleza, mas que poema o Mibielli terá escolhido?

A opção dele foi por Relatividades, publicado originalmente no blog no dia 23 de outubro de 2011.

Relatividade

A sugestão de pecado
Aparece de repente
Vestindo insinuante e
Indecente saia jeans curta.
Ainda seria sugestão
Se viesse de repente
Insinuante, exibida
Vestindo islâmica burka?


O que para mim é basicamente uma afirmação e uma pergunta sobre roupas femininas e o que podem ou não sugerir, no estudo do professor virou algo muito mais profundo. Finalmente entendi na carne o que significa a tal da análise poética.

Ele falou de olhar (isento ou não) jornalístico, de islamismo, do pecado na ótica cristã, de questões de gênero e umas outras coisas que não lembro. 

É que a cada frase eu pensava: caraca, mas eu só imaginei uma mulher de pernas bonitas usando roupa curta.

Pensamento curto meu à parte, foi muito legal o momento. Só fiquei pensando: e se não tivesse me inscrito no evento ou tivesse saído antes, será que ficaria sabendo? Quanto e quanto casos de análises de seus textos os colegas escritores estão perdendo?

Dia de preta: poema para Zanny Adairalba

 
A patroa celebra aniversário hoje. Achei mais barato fazer-lhe um poema do pé-quebrado do que gastar com futilidades. 

Dia de preta

Para Zanny Adairalba

Hoje é o dia da velha preta
Dia de celebração em nossa maloca
Hoje é o dia dessa negra poeta
Do olhar castanho-claro que me toca.

Hoje é dia de mais um dia
Com algumas dores e várias alegrias
Tempo de inventar-lhe alguma poesia
Com rimas nonsense, quiçá zombarias.

Hoje tem festa por Zanny, por mim apelidada Maria
Essa do olhar que no riso encanta e na fúria assusta
A preta velha, patroa, xamã, cangaceira de meu sertão
Essa que em nossa rotina toda hora um novo verso busca.

quinta-feira, março 06, 2014

Duas esquinas no mesmo cruzamento, duas faltas de respeito com o pedestre

Fui caminhar na quarta-feira de cinzas para ver se começo a perder o peso que ganhei nos últimos meses.

Fiz uns cálculos mentais de distância e decidi fazer uma rota diferente da que tenho percorrido desde que estamos numa casa alugada no São Francisco. Em vez de ir para a avenida capitão Ene Garcez, decidi embicar para a Ville Roy, minha avenida preferida na cidade.

Peguei a calçada direita da avenida Major Williams em direção à Ville Roy e no cruzamento com a Capitão Júlio Bezerra (mania antiga que havia na cidade de colocar nome de militar em tudo o que era rua), vi esta maravilha do respeito ao pedestre:



O tapume da obra não conta conversa: te joga direto na rua, sem espaço mínimo de segurança, bem de frente para um semáforo.

No retorno da luta contra as gordurinhas do mal, peguei a outra calçada. No mesmo cruzamento encontrei um exemplo de falta de respeito com os pedestres que passam em frente à igreja de São Francisco:



Como é que a pessoa tem tanta preguiça de caminhar um pouco do carro até a missa e falta de respeito com a legislação de trânsito na hora que vai para uma cerimonia religiosa? Pensando nisso, publiquei bem cedo a foto no Facebook com esta legenda:

Você que vai falar com Deus na quarta-feira de cinzas, tem preguiça de estacionar uns metros mais distante e deixa seu carro na calçada, obrigando pedestres a irem para a rua, correndo o risco de serem atropelados, ou pisarem no jardim do templo, deixa te avisar: estás fazendo tudo errado. Deus não curte sacanagem com seus outros filhos.

E olha que nem fã de discursos religiosos eu sou.

quarta-feira, fevereiro 26, 2014

Cálico Electrónico – o super-herói espanhol


Procurando saraus em língua espanhola, descobri no ano passado o Cálico Electrónico, personagem de uma série web nascida na Espanha.

 É um super-herói bem fora dos padrões: acima do peso, misógino, boca suja, encabeçando histórias com alta carga de xenofobia e piadas homofóbicas, entre outras coisas que se enquadrariam no politicamente incorreto. Todos os personagens secundários o acompanham nesse estilo.

 Mesmo assim, é muito engraçado e assisti alucinado a todos os capítulos da série, disponíveis no site http://www.calicoelectronico.com

De todas elas, no espírito de compartilhar tão nosso dos blogueiros, escolhi esta, que considerei a mais amorosa, por ser inspirada nos quadrinhos Calvin & Haroldo. O final é lindo demais. 

O problema é que para entender é preciso dominar o espanhol da Espanha, incluindo os palavrões de lá. 

Atenção aos créditos, que sempre trazem uma mensagem do diretor. 





 E aqui, Cálico Eletrónico na primeira temporada, declamando poemas eróticos engraçados no final do vídeo para sua amada objeto de desejo, La Ladrona. 


segunda-feira, fevereiro 03, 2014

Fechando 23 anos de Roraima


 Hoje completo 23 anos morando no Brasil. Não sei se vou comemorar mais tarde. Só sei que, apesar de tudo o que deu errado, como é normal em qualquer vida, o saldo está positivo até agora.

Já falei condensadamente sobre minha vida em outras postagens: “1991: welcome to the aldeia” falava dos 15 anos em Roraima.

Já “Rumo ao 21° aniversário de vida em Roraima” tem um título autoexplicativo.  

Como já está na hora do almoço, serei breve. Dos 21 para os 23 anos de vida em Roraima, há coisas que estão aí, firmes: ainda tento fazer trabalhos culturais via Coletivo Arteliteratura Caimbé, ainda tento manter uma frequência de produção textual (estou construindo um novo livro de micronarrativas e já tenho umas 30 poesias inéditas para o meu primeiro neste gênero.), ainda estou com as dores frequentes nos braços por conta das hérnias e ainda faço pilates semanalmente.

O Edgarzinho está bem, muito bem, em mais um ano de estudos e com seis de idade (olha aqui um poema feito para ele por conta de seu aniversário).

Dos 21 para os 23 anos na cidade vou destacar:

1.Mudança de trampo da UERR para a UFRR em julho de 2013.

2. A coluna Rede Literária, que vai completar dois anos saindo na Folha de Boa Vista.

3. Não fiz nenhuma viagem de turismo nesses anos, mas viajei muito a trabalho, principalmente trampo literário, o que é uma delícia: Brasília (DF), Campo Mourão (PR), Rio de Janeiro, São Paulo, Nova Olinda (CE), Santa Elena (VE), Aishalton (Guayana) e algumas cidades de Roraima.

4. Quebrei uma pá de paradigmas e pensamentos retrógrados que nem sabia carregar, ampliando minha visão de mundo e aumentando a carga de tolerância. O desafio é repassar isso para o moleque.

5. Ganhei oito premiações ou destaques em concursos literários nestes dois últimos anos. Isso me deixa contente. 


Enfim, a vida continua, quente como só fevereiro pode ser, as rugas aparecem mais ousadas a cada manhã, novas leituras chegam, outras fomes aparecem e o lavrado fica cada vez mais amarelo. Não tenho vontade de ir embora de Roraima. Aqui, apesar de todos os problemas, dos preços altos, da dificuldade de fazer cultura e tals, ainda é um bom lugar.

Se acaso for lido, vai um muito obrigado a todas as pessoas, principalmente as meninas, que me trouxeram momentos felizes ao longo destes anos.


As fotos a seguir não têm exatamente muito a ver com o texto mas sim com Guasipati, minha antiga cidade. Por isso, as posto: 


Turma que morava perto de minha casa. Foto lá dos anos 1993, 1994, quando ainda era magro

Dizem que meu filho parece comigo quando eu era criança. Bom, na minha época não tinha máquina digital nem escanner e éramos obrigados a tirar fotos com as professoras. Essa é de março de 1980, no Kinder.



O moleque, numa foto de quando tinha 2, 3 anos de idade

Foto de meu primeiro passaporte

sexta-feira, janeiro 31, 2014

Texto na revista Fórum: Quando matar um índio não é algo mau: o caso Las Rubieras

Semana passada saiu um novo texto de minha autoria no Blog dos Indígenas, espaço aberto a colaborações na Revista Fórum. O material fala de um caso antigo de  massacre de índios na fronteira da Venezuela com a Colômbia. Foi inspirado a partir da descoberta de um clipe do grupo Campesinos Rap, que achei procurando artistas que misturassem joropo, ritmo tradicional de meu país nativo, com o hip hop. 

Do clipe, fui pesquisar o caso. Demorei um pouco até achar as referências textuais que linco no texto: um artigo falando do caso Las Rubieras e um blog escrito pelo advogado de defesa dos acusados da chacina. 

Depois disso veio a fase de criar coragem, muita coragem, para escrever. Entre a descoberta dos textos e a redação final, acho que se passaram uns dois meses...ando preguiçoso, né?

Lê o material e compartilha à vontade. Se você for indígena ou trabalha com os povos originários, manda seu texto, foto, filme, desenho, que a gente está querendo publicar.




Quando matar um índio não é algo mau: o caso Las Rubieras


O índio é um bicho preguiçoso, selvagem, sem cultura, sem o hábito de economizar e acumular que tanto bem fazem ao sistema econômico capitalista. Quer terras mas não sabe como produzir em larga escala. Só atrapalha o progresso e a economia, que tanto precisa de suas terras para desenvolver-se. Sendo assim, matar um indígena para garantir o avanço da mineração, da agricultura e/ou da pecuária é totalmente justificável. A razão estará sempre ao lado de quem atira ou manda atirar.

O parágrafo anterior bem poderia ter sido direcionado aos indígenas do Brasil, mas não sejamos exclusivistas. Eles têm parentes espalhados por todos os cantos da América do Sul. Ou seja, se atrapalham aqui o progresso, como não o fariam no Equador, na Colômbia, no Peru, na Bolívia?

Para esses estorvos, vale desde 1492 a lei do aço. Se com celulares e câmeras digitais os casos atuais de violência e conflitos são registrados facilmente (veja neste link matérias do arquivo da Fórum para saber mais e vamos em frente), vale a pena pensar sobre quantos casos houve sem serem anotados nos cadernos de história.

Quantos mortes de indígenas nas mãos de capangas de fazendeiros ficaram longe dos holofotes da justiça, da mídia? Difícil saber mas sempre aparecem. Foi o caso de um massacre acontecido na fronteira da Venezuela com a Colômbia nos anos 1960.

Donos de terras convidaram para uma festa um grupo de 18 indígenas da etnia Cuiba. Enquanto estavam comendo, foram atacados com terçados e facas. Os que tentaram fugir foram abatidos a tiros, fossem adultos ou crianças. Somente dois conseguiram escapar, seriamente feridos. Os corpos dos mortos foram queimados e misturados ao lixo e fezes dos animais da fazenda Las Rubieras, onde aconteceu o massacre.

Talvez tudo tivesse ficado por isso mesmo se os dos Cuibas sobreviventes não tivessem aparecido meses depois. O caso Las Rubieras foi parar na justiça. Ao defender-se, os acusados alegaram que não sabiam que matar índios era algo ruim, algo mau.

“Para nós, matar índios é como matar veados, pacas e capivaras, com a diferença de que os veados, as pacas e as capivaras não nos fazem dano e os índios sim”, declarou um dos acusados.

A defesa refletiu o contexto histórico da região. Desde 1870, conforme conta o historiador Augusto J. Gómez L. em seu artigo ‘A guerra de extermínio contra os grupos indígenas caçadores-coletores das planícies orientais”, havia registros de massacre dos índios que, sem terras e com a redução de animais silvestres para caça, abatiam gado dos fazendeiros para poder comer.

Os casos de agressão eram tão comuns e naturalizados pela sociedade que foram criados dois termos para identificar o tipo de violência praticado: “guajibiada” designava o ato de procurar e matar grupos de Cuibas e outras etnias da região. “Tojibiada” era a perseguição das mulheres indígenas por homens a cavalo. Quando finalmente elas ficavam cansadas, eram laçadas como gado, jogadas ao chão e estupradas.

Mais de um século de assassinatos em nome da defesa de seus interesses haviam criado na população dos Llanos (planícies) a convicção da normalidade destes atos. Como condenar alguém que agiu conforme os hábitos da região? O artigo do professor Augusto Gómez é cheio de relatos de outras mortes de índios, explicitando pactos mortais entre fazendeiros e autoridades para, pelo uso da força, garantir o uso e a ordem nas terras. Escrito em espanhol, o material pode ser baixado AQUI.

O caso Las Rubieras terminou com todos os acusados sendo absolvidos. A história teve repercussão mundial à época, como pode ser conferido nos textos publicados em 2012 em um blog por Jaime Rafael Pedraza, que atuou como advogado de defesa dos envolvidos.

Toda essa história resumida acima vai virar um filme na Venezuela. Em 2013, o grupo de hip hop Campesinos Rap gravou um clipe com cenas do longa, que deveria ter sido lançado ainda no ano passado.

O clipe apresenta cenas do futuro filme e a letra pode ser dividida em duas partes: a primeira relata o massacre e o julgamento e serve para protestar contra as inúmeras violências cometidas contra os povos indígenas. A segunda atira contra os países que utilizam argumentos antropológicos para oprimir e ocupar militar e economicamente outros países.

Confira o clipe do grupo Campesinos Rap:





Para encerrar, o trecho final do artigo do professor e historiador Augusto J. Gómez L., mostrando que se atualmente não há “guajibiadas” e “tojibiadas”, a situação dos Cuibas não melhorou:


Hoje, os últimos redutos indígenas estão confinados nos rincões das vastas planícies, fugindo dos enfrentamentos armados que, com crescentes intensidade, vêm acontecendo na região nas últimas décadas entre a guerrilha, o exército, os paramilitares e o narcotráfico. Outro grande número de famílias indígenas migrou para os centros urbanos. Lá, deprimidos, humilhados, prostituídos e alcoolizados, concluem sua agonia, depois de mais de um século de perseguição sistemática por aqueles que se chamam “civilizados” mas não demonstram sê-lo.

Edgar Borges, escritor, jornalista, ativista cultural, venezuelano, descendente da etnia Wapichana. Blog pessoal e Twitter.

quarta-feira, janeiro 29, 2014

Nova atividade: publicação da Rede Literária na revista Somos Amazônia

Desde julho de 2012 publico semanalmente no jornal Folha de Boa Vista e no blog Cultura de Roraima a Rede Literária, coluna de notas que traz informações sobre literatura, livro e leitura.

O foco é divulgar o que se faz em Roraima, mas muitas vezes é a maior dificuldade fechá-la com notícias locais. O povo não tem e não cria o hábito de encaminhar suas ações. Por isso há semanas em que peno para mandar a coluna.

Tem outros com preguiça de selecionar foto e que me pedem para entrar em seu perfil de facebook e buscar lá a imagem mais bacana. Quando encontro uma boa foto, está em baixa resolução. Aí peço em alta e me mandam buscar no facebook...isso sem falar no povo que diz querer divulgar sua atividade e envia informativos que não dizem nada com nada. Quando peço mais informações, reenviam o mesmo texto...

Mesmo com todas essas dificuldades e uma vontade quase semanal de parar de escrevê-la, vou fazendo. Acho legal a oportunidade de divulgar a minha área de atuação, de levar à comunidade parte do que faz localmente quem mexe com literatura, livro e leitura, mesmo que até agora não tenha ganho um centavo com esse meu trabalho...

Nessa vibe, a novidade de janeiro foi a, cof cof cof, ampliação do projeto Rede Literária. Agora, ai meu santo das ações não remuneradas, vou publicá-la também na revista Somos Amazônia, da Fecomércio.

A primeira edição saiu na revista de janeiro. São duas páginas com fotos e poemas das escritoras  Zanny Adairalba e Eli Macuxi.
Clica que amplia

A revista pode ser encontradas nas bancas de Boa Vista e tem distribuição regional. Já mandei o texto de fevereiro e até semana que vem enviarei a edição de março.

Vamos ver onde isso vai parar.

quinta-feira, janeiro 23, 2014

Ulisses: uma meta de leitura para 2014


Vou te dizer: ainda não fiz o meu balanço de 2013 e ando muito preguiçoso para projetar 2014.

Por enquanto, nem tanto como certeza mas sim como uma proposta a ser batalhada diariamente, a única meta que me propus foi a de, finalmente, ler Ulisses, de James Joyce.

O dito cujo

Se vou conseguir, só dezembro dirá. Acho que este é um bom ano para ler essa história, que sempre esteve nas listas que vi sobre os livros que jornalistas deveriam ler para ampliar sua base conhecimentos e blá-blá-blá.

Listas que vejo desde 1996, mais ou menos.

Uma vez conversei com um estudante de Letras na fila da biblioteca da UFRR. Ele ia devolver o tijolão do Ulisses depois de tê-lo lido por lazer. “Sabe como é, estava sem nada para fazer”, contou.

Pensei: gente desocupada assim é outro nível.

Vou tentar ser um desocupado desse porte em 2014.

Difícil vai ser enfrentar o costume de ler basicamente crônicas, contos e outras histórias curtas (me dá uma agonia pegar um tijolão e esperar centenas de páginas pelo final....).

terça-feira, janeiro 14, 2014

Conversas com Edgarzinho: histórias que vovó conta

Por dona Gracineide Borges, avó do Edgarzinho: Coisas do Edgarzinho Ligo para meu filho, e o Edgarzinho, meu neto, atende.

- Oi? Teu pai está em casa?

- Tá, vovó, mas está cochilando!

- Ok.  Eu ligo depois!

Minutos depois, voltei a ligar:

- Oi? Papai ainda está dormindo?

- Não, vovó, está cochilando! Você não sabe que de DIA as pessoas COCHILAM e que de NOITE é que elas DORMEM?

- Sei...(será que eu sabia?!). Depois eu ligo! Kkkk...

sexta-feira, janeiro 10, 2014

Seis anos com Edgarzinho

E hoje fazemos seis anos juntos:  
pedindo
negando
cedendo
gastando
reclamando
ficando chateados um com o outro
dizendo sim
dizendo não
abraçando
afastando
falando
silenciando
vendo desenhos juntos
brigando pela TV ou computador
saindo sozinhos
dizendo que hoje um vai e o outro fica
aprendendo
dormindo juntos
dizendo que hoje não queremos papo com o outro
contando histórias
construindo memórias
contaminando-nos de hábitos em comum
muitas vezes sendo diferentes dois
Outras tão semelhantes que parecemos um.