Rostos sem nome e história surgindo
de repente no meio da tempestade, engolindo a calma do domingo... Lá fora o
vento está bom, frio, parece que vai chover, espantando assim o calor do dia. Aqui,
os raios tomam conta do ambiente e não há voz nem paz, apenas trovejantes
mágoas.
Há horas para tudo, mas sempre há
alguém acreditando que devem ser exclusivas de sua autorização, de sua licença
para existir e para permitir viver. Que te faltem horas de vida se não forem
para mim, diz o cartaz colado no muro que se ergue rapidamente onde 30
minutos só havia serena pradaria.
A estupefação, a incredulidade, a
desconfiança, a mágoa, o rancor, a raiva, a indiferença, a vontade de sumir, a
certeza do ódio, sangue nos olhos, fogo nas palavras, dardos lançados para
ferir e matar, desabafos, faltas marcadas, ausências cobradas, o escancaramento
sobre a fragilidade do amor próprio e das vontades de receber amor de outra
pessoa... O papel não segura tanto peso sem rasgar e há lágrimas molhando o
chão já sujo de uma tediosa melancolia...
As acusações respingam nas paredes,
mas não encontram provas que as deixem suspensas no ar, à vista, seguras,
firmes, prováveis... Suspiros de impaciência e vontades de sumir... Provas
frágeis, suposições estapafúrdias, conexões ilógicas postas como certezas
sublimes, como santos graais iluminando a escuridão... Fantasmas sem casas para
assombrar, demônios de infernos alugados para o verão...
Cheiros que não existem, bocas que
não surgem, amores nunca pensados, camas nunca habitadas, hálitos que não foram
fumados e bitucas perdidas que agora tem dono... A noite parece parar enquanto
alguém do outro lado da porta pensa em recortar um coração e mandá-lo de
lembrança aos amigos.
Golpes baixos falando sobre baixos
desejos, ignorando que deveriam ser mútuas as vontades, mas há vontades que
caminham em mão única e nem sempre encontram abrigos para proteger-se, passar a
noite, alegrar a vida, encantar o cotidiano com a quebra da rotina, sustentar a
semana com novas histórias e o fim de antigos choros.
Ranços novos surgindo, ampliando antigas
manias de segurança que afetam o conjunto. O dedo em riste, apontado para o
passado, o presente, o futuro e a cara do outro, que está, com certeza, dirão
alguns, a sustentar as mesmas mentiras de sempre.
O cansaço de sempre, o silêncio de
sempre, os perdões de sempre... E lá vai a história da noite repetir-se logo,
logo, logo...