terça-feira, dezembro 23, 2008

Arte no Front Brasil - Venezuela



15h do penúltimo domingo de 2008. É hora de partir, baixar a Serra de Pacaraima e voltar para casa, que segunda tem trampo. Os carros que transportam a banda Iekuana pegam a estrada, esquivam dos buracos e dizem adeus à turma que esteve no II Front, o encontro cultural da Tríplice Fronteira Brasil, Venezuela e Guiana. Mas peraí, que este é o final da história e nem sempre o final reserva a grande surpresa.


É preciso voltar até a terça-feira (16), quando meu amigo Rhayder Abensour, guitarrista da Iekuana, me convidou para acompanhar os roqueiros até Pacaraima. Viagem liberada pela dona da casa, deixamos Boa Vista, capital de Roraima, às 15h30 do sábado. A viagem, já com duas horas de atraso criadas pela espera do término de gravação do CD demo da banda, foi mais demorada do que se pensava. O carro onde estavam o batera Jamil Abensour e o baixista Dant Aliguieri quebrou depois da ponte do rio Uraricoera, a uns 80, 85 km da cidade. Pára, reboca, pára, conserta, anda devagar, a noite chega, os buracos na estrada aparecem, o vidro do retrovisor cai de tanta pancada e estamos em Pacaraima, sede do município homônimo, por volta das 19h.


Chegamos na quadra coberta coberta de Pacaraima, local onde o fotógrafo, doutor em plantas medicinais e amante das artes Joacir Freitas decidiu realizar o II Front desta vez. O primeiro foi há um ano, reunindo artistas do Brasil e da Venezuela no Centro Cultural Terra de Makunaima (sem acento mesmo), chalé erguido numa das encostas da área central da cidade, numa área que preserva a mata da serra e fomenta a interação com a natureza.


Chuva forte, vento frio, o II Front começa. Toca reggae a banda Gui-bras, tocam rock e outros sons quem estiver presente, como Airton Vieira (Tom Vi), professor Nelson, Raul Cover, uns hippies que estavam na cidade e, para fechar a programação oficial, a Iekuana, que entrou meia-noite e pouco em cena.


Mais de uma hora depois, programação oficial encerrada, a gatíssima ex-vocalista da falecida banda LN3 assume o microfone e começa a mandar rock, reggae e hip-hop com uns carinhas muito bons que acompanharam quase todo mundo na noite do Front. Em dueto e sozinha, Alessandra, se não me falha a pesquisa no Google, empolga o restante da turma que ainda não foi dormir ou voltou para o Centro Cultural. 30, 40 minutos e larga o microfone, que é assumido, entre outros, por Avinashi (guitarrista da Iekuana), Stalen (vocal Iekuana, mandando ver com Capítulo 4, Versículo 3, do Racionais MCs) e outros doidos que subiram a serra apenas para cantar e ouvir música.


Este é, sem dúvida, o melhor momento da noite: começa a rolar uma roda-viva de músicos e vocalistas tocando e cantando no improviso, sem ensaio, apenas seguindo a música. Nesta jam sessiom fronteiriça surge uma banda com guitarra base e solo, batera, baixo teclado, bongo, gaita e dois ou três vocalistas. Muito bom. Pena que ninguém filmou ou gravou esta madrugada musical.


Depois de recolherem tudo, parte da turma volta para, supostamente, dormir nas barracas montadas no Terra de Macunaíma. Que nada. Quem havia saído cedo do ginásio estava lá tocando e cantando, fazendo rimas em espanhol, português e inglês, bebendo e rindo, conversando sobre o mundo e sobre arte, olhando as fotografias e desenhos em exposição ou simplesmente deliciando-se com uma boa Polarcita, a cerva venezuelana.


Enquanto isso, eu pensava em ter que entrar cedo na fila da gasolina e no cansaço para dirigir de volta a BV. Por conta disso, fui dormir lá pelas 3h30. Quer dizer, fui tentar dormir. Como não quis ficar na barraca, deitei no banco do carro. 30 minutos chegou o primeiro do nosso grupo pedindo desculpas e abrindo o porta-malas. Mais 30 minutos e chega o restante fazendo barulho. E tudo

isso acontecendo e o povo da cantoria ainda na ativa, o que se estendeu até depois das seis.


Às 7h, estava de pé, tomando um banho frio numa manhã fria, e às 7h20 estava na fila do posto de combustível venezuelano que fica a 100 metros da fronteira, única fonte de abastecimento dos carros que chegam em Pacaraima. Gasolina a muito menos de um real, espera de duas horas e pouco, volto para o Terra de Makunaima e a cantoria já retornou, acrescida de leituras de poemas.


Para fechar: todos os da Iekuana fomos a Santa Elena, compramos, voltamos, comemos o churrasco, conversamos, saímos às 15h e ainda não havia acabado a festa do Front. Só não ficamos mais tempo por que segunda é dia de chegar cedo e vender a alma ao chefe por uns trocados no fim do mês.


segunda-feira, dezembro 22, 2008

Quem manda lá em casa...


Definitivamente não sou eu. Bons tempos aqueles em que só perguntava de minha amiga Carla Cavalheiro se podia descer o continente até a casa dela, marcava a data e embarcava no avião.


Agora, com o indiozinho comandando a vida lá na aldeia, a caça que não rende muito na feira de domingo e apenas dois aviões embarcando o povo destas bandas, viajar não é tão fácil.


Ainda bem que nessas minhas lidas de extrativista arranjei uma lata de querosene que uso como cofrinho. Como a chefia liberou uma folga do cotidiano, pegarei as moedas que juntei o ano todo e vou até o Sul, pruma tal de Ilha da Magia, também conhecida pelos íntimos como a Linda e Bela Floripa.


Mas como a passagem do pássaro-de-ferro tá os oio da cara, optei por um transporte alternativo. Já aluguei espaço numa canoa que vai sair da Orla Taumanan. Vamos baixar o rio Branco até o Negro, pegar o Amazonas, chegar até o Atlântico e ir pelo litoral até Floripa. Já combinei com a minha amiga: quando chegar no manguezal que fica perto do Santa Mônica, grito pra tu jogar a corda.


Saindo da sessão Querido Diário, diz a lenda que dois índios de uma etnia ali entre Roraima e o Amazonas estiveram certa vez na vila Surumu, encravada na terra indígena Raposa Serra do Sol, para conhecer a Missão da igreja católica que funcionava como escola profissionalizante e tal. Daí voltaram de avião para a aldeia deles, lá no alto rio Branco, para bater um lero com a comunidade, pegar a autorização dos tuxauas, dar uns beijos de despedida na mulherada e tal.


A ano letivo começou e nada dos parentes. Três meses depois da visita, os caras bateram na porta da Missão. Os dois haviam voltado de canoa para começar a estudar...


Três meses navegando, pegando sol e chuva, sendo picados por mosquitos, comendo se acaso pescassem...


Cê tá vendo que eu nunca vou morar numa droga de aldeia que não tem táxi?

quinta-feira, dezembro 18, 2008

Previsões

Diz a manchete de página do jornal Roraima Hoje, um dos três que circulam em BV:




13º salário
Quase R$ 15 milhões circulando no final de semana

Escreve o repórter no lide:

Governo do Estado e Prefeitura de Boa Vista pagam, neste final de
semana, a segunda parcela do 13º salário de seu funcionalismo público,
o que representa cerca de R$ 14,730 milhões injetados na economia
local.

Diz o povo na sala:

- Vai ter tanto assalto este final de semana.
- Tanto neguinho caindo no golpe da baluda
- Os trombadinhas vão fazer a festa.
- O comércio vai ficar um inferno.
- E os caixas? Já pensou nas filas?
- A estrada para Santa Elena vai congestionar.
- Ei, e a fila da gasolina. O negócio é sair cinco da manhã e chegar
cedo para não pegar fila.
- Acho melhor usarem o cartão de débito. Grana viva só na segunda.
- É, mas é bom não usarem muito. Olha a crise.
- Ei, tá feio o negócio. Se vacilar, ninguém chega em fevereiro
- Tu viu a reportagem de ontem no Jornal Nacional? As montadoras tão
pagando para os operários ficarem em casa e vão dar férias coletivas.
Ninguém sabe se vão voltar.
- Eu, heim...
- E em fevereiro, que vem de uma só vez IPTU, IPVA, escola dos meninos...
- É...
- É...

- Vamos investir na exportação?

- Hum...sim...para aproveitar a implantação da ALC e da ZPE, né?

- Boa, boa, boa.
- Vamos trazer coca da Venezuela e revender para ganhar um extra?
- Ou então maconha da Guiana?
- E se a gente for pego?
- Pois é. Se tiver que pagar advogado, já era o IPTU, IPVA, escola dos
meninos...
- Melhor ficar quieto.
- É vero.
- Mas que era uma boa idéia, era. Se não fosse o IPVA...


quinta-feira, dezembro 11, 2008

Como chegar até Edgar Borges pelo monitoramento de visitas


Num certo dia, pessoas nesses pontinhos visitaram o blog Crônicas da Fronteira, localizado na ponta norte do Brasil.



Notem que é mais fácil fazer uma visita virtual que real a Roraima. Atualmente, para chegar aqui, só pela BR 174 ou por avião, voando sobre esse monte de verde.


Não. essa mancha clara não é desmatamento, não são plantações de arroz em terra indígena. Boa Vista, a capital do Estado, está localizada à margem direita do rio Branco e foi fundada numa área conhecida localmente como lavrado que os cientistas chamam de cerrado. Muito calor, vegetação rasteira, lagos e igarapés.

Na ponta esquerda superior da imagem do Google está Boa Vista. A mancha clara do lado direito, próxima ao rio, é um arrozal.



Sabe aquele marcador da imagem anterior? Então. Ele identifica um acesso bem pertinho do local onde trabalho, marcado com um círculo. Essa pista aí, com essa área de piçarra em frente, é o Estádio Jornalista Flamarion Vasconcelos, mais conhecido como Canarinho, fundado na década de 1970. O governo estadual tacou asfalto e cimento para "urbanizar a área". Ah, também plantou umas arvorezinhas para daqui a muitos ano ter uma sombrinha no local.


Se você tiver curiosidade de ver o, em algum lugar deste blog tem uma foto frontal dele antes da "urbanização".

terça-feira, dezembro 09, 2008

11 meses



Meu indiozinho completa 11 meses nesta quarta-feira. Já engatinha acelerado, empurra cadeiras para caminhar em pé, desce da cama segurando nas roupas dos pais e da irmã, faz manha e chora muito para não ficar no berço ou no cercadinho/curral e adora mexer no meu som.


Se eu te pegar mexendo no som de novo, arranco tua orelha, moleque!





O BB, como minha mãe chama o pequeno Borges Bisneto (mais detalhes sobre o começo da vida do moleque, favor clicar aqui) é insuportavelmente saudável. Sei, há uma contradição nesta frase. Explica-se: o indiozinho tem vitalidade extrema. Tanto que já pegou conjuntivite, pneumonia e duas gripes em 2008 e mesmo assim não parou quieto um minuto. Aliás, ficar quieto só quando está dormindo. Bom...na verdade, nem tanto assim. É adrenalina no estado mais puro possível.


Kung-fu Pemón, o filme



Essa adrenalina é o melhor presente que ganhei na vida. É claro que a Vida deixou as parcelas mensais para serem debitadas na minha conta bancária, sem prazo para encerrar a dívida.


Treinamento para caçar coelho: segura na roupa de seu papá

e exija que ele traga o Pernalonga para você




O indiozinho, sem nenhuma modéstia, é muito lindão. Amigos e amigas elogiam o moleque, sempre dizendo que puxou à mãe, pois o pai, além de antipático, é feio. Como um bom índio civilizado, concordo, já que é pura verdade.




Putz, o moleque já coube inteirinho no meu peito. Hoje, ocupa metade da cama sozinho



Reconhecendo plantas: urucum é bom para fazer coloral e para pintar o rosto e ir à guerra





Para celebrar o aniversário de 11 meses do indiozinho, o STF marcou para esta quarta o julgamento da ação contra a demarcação da reserva indígena Raposa-Serra do Sol em área contínua. Vai reunir num só lugar o governador José Anchieta, os senadores e deputados federais que assumem declaradamente serem contra a área, os primos e tios de meu filho que são contra e a favor, jornalistas, curiosos e etc.





Os jornais estão ligados no julgamento.Essa charge aí é

do Marco Aurélio. Deviam fazer matéria sobre o neném, isso sim.



Os ministros do STF já mandaram avisar lá em casa: no meio da leitura vão parar tudo e pedir para os presentes cantarem o parabéns para você. A turma que mandar melhor na afinação leva o prêmio: mantém ou desfaz a área contínua. Lá em casa a gente se contenta com quaisquer mil hectares à margem de um rio.



Pintando-se para a guerra por um pedaço de terra com

sombra, água corrente e crédito a fundo perdido



sexta-feira, dezembro 05, 2008

Atualizando

I

A coisa tá feia lá na aldeia. Da semana passada até hoje todos estão sofrendo com a gripe.

Primeiro fui eu, com o catarrão, fotofobia e dor de cabeça. Depois de me dopar com as drogas dos brancos e mais ou menos sarar, quem caiu por conta do vírus foi o indiozinho. Na seqüência, veio a Mamá dele.

Resultado: uma índia velha acabada e um neném doente mas com uma incrível vitalidade, daquelas que cansa os pais.

Graças a Macunaíma, tudo está melhorando, menos a mania de dormir tarde que o indiozinho tem.


II

Para mexer com fotos?

Faça um curso ou tente aprender sozinho.

Hum...aprender sozinho? E a disposição?

Faça um curso.É o jeito. Pague um curso.

Bá...pagar....gastar...bá...

Pois é...

Ah, se eu tivesse disposição para ser autodidata, conquistaria o mundo e não pagaria nada.

Pois é...


III

Chove no norte do Norte. Alegram-se as plantas, alegram-se as pessoas. Em compensação, quando abre o sol...