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sexta-feira, novembro 26, 2021

Os meus bons resultados na Mostra Picuá

Sexta e sábado passado rolou a primeira edição da Mostra Picuá de cinema e literatura, lá na Serra do Tepequém. Na segunda noite fiquei atualizando o feed do instagram oficial do evento procurando pelo resultado e nada. Fui dormir e o domingo chegou com alegrias: curti o aniversário de 70 anos de minha mãe, dona Neide, e amanheci com a notícia linda de que meus textos foram premiados. 







Fiquei em segundo lugar na categoria Prosa, com o conto “Livro de Amor”, escrito em 2016/2017. Os atores do grupo Criart Teatral, dirigidos por Kaline Barroso, ficaram em primeiro lugar nas categorias performance  Prosa e Poesia com “Livro de Amor” e “Medo, monstros e lama”, respectivamente. 

A turma mereceu. Everton Alves,Julia Barroso, Felipe Medeiros, Kamylly Emanuelle e Luiza Danielle trabalharam pesado nas madrugadas ensaiando o conto e o poema. Fiquei feliz por eles e bem contente por mim. Não só pelo prêmio em dinheiro (mil reais que vão ajudar a fazer as estantes do escritório), mas pelo troféu que recebi, feito pelo artista Edinel Pereira com madeira de rio e uns cristais. Ficou bem show na prateleira aqui de casa. 

Resultado geral, resumindo: fiquei com dois textos no e-book, o segundo lugar na categoria Prosa, mil reais e o troféu (inclusive, foi quando vi a peça que comecei a desejar muito ser um dos premiados). 

Kaline Barroso, diretora do Criart Teatral






  







Se você não viu a postagem anterior com o e-book da mostra Picuá, clica aqui e confere.  


quinta-feira, novembro 18, 2021

Com prosa e poesia no e-book da Mostra Picuá de Cinema e Literatura

Este final de semana será realizada a primeira edição da Mostra Picuá de Cinema e Literatura. Muita coisa vai rolar na Serra do Tepequém, inclusive a encenação de dois textos meus que foram selecionados pela curadoria e vão concorrer aos prêmios da mostra. O e-book com as obras foi liberado nesta quinta pela organização. Olha a capa: 



Um dos textos é o poema “Medo, monstros e lama”, escrito em 2020. A interpretação será feita por Everton Alves e Julia Barroso. O conto “Livro de Amor” foi escrito em 2016 ou 2017 e será encenado pelos atores Felipe Medeiros , Kamylly Emanuelle e Luiza Danielle. Todos são da Cia. Criarte Teatral e serão dirigidos por Kaline Barroso. Desde que saiu o resultado eles estão ensaiando e este sábado será o grande dia. 

programação é esta:

 





Eu  não vou pra mostra. Além de não confiar na resistência do meu velho carro para subir a serra, ainda estou em tratamento contra a gastrite e a esofagite e vivo limitado no que posso comer e beber. E viajar para um evento deste sem poder beliscar porcaria e dar um gole numa cerveja, pelo menos, não tem graça. Sem contar que ainda ando cabreiro, muito cabreiro, com a pandemia. 

Os meus textos são estes: 




Zanny também está concorrendo com dois textos. Outros amigos também. Se quiser ler o nosso material, é só clicar aqui neste link do google drive e baixar o e-book da Mostra Picuá de Cinema e Literatura. 


quarta-feira, setembro 09, 2020

Sintiendo el camino (conto)

 



Nos perdimos, vale. Llegamos tarde a nuestra victoria y no hubo trompeta que le echase luz a nuestra rumba. La cerveza que me bebí tenía sabor a ti, a tus cosas, a esa mala costumbre que tienes de llamarme a tu cama, a tu sonrisa, a tus tardes antes de que salieras a probar a otros sabores de otros amores. Bailamos, bailaste, eras así: cuando no te acompañaba, te meneabas sola en la pista, como si nada, como si tu todo y yo, bueno, si no ayudo, que no estorbe.

Nos perdimos, vale. Nos faltó ganas, nos faltó valentía.Lo nuestro podría haber sido eterno, pero que tanto la eternidad si hay vidas que no se entienden entre una madrugada y otra, si hay besos que no son para uno, sino para los que los pidan primero, para el que baile mejor, para el que se menea más sabroso al son de la música que esté tocando en la radio.

quinta-feira, outubro 17, 2019

Sobre chuvas, preocupações pós-vida e e meus quase livros publicados


Choveu. E muito. Choveu como se não fosse outubro esta semana. Ainda bem, ainda bem. Domingo o ar parecia estar sumindo, muito quente. Aí então choveu como se o mundo fosse desabar, com raios e trovões que fazem Balu, meu cachorro lindo, sair louco pela casa atrás do bicho que está fazendo “bruuuum” em nosso quintal.

Choveu e minhas articulações parecem que enferrujam. Como será o dia em que for mais velho e vá morar em um lugar frio? Chegará esse dia? A da velhice, digo. E se algo acontecer e, de repente, apenas traçando hipóteses, assim que levantar desta mesa eu escorregar lá na varanda molhada pela chuva? E se na queda bater a cabeça numa quina qualquer e tudo acabar ali, de maneira tão boba, tão irrelevante, uma cena improvisada de um filme ruim?

E se acaso morto, já em outra esfera, eu ainda ter consciência do mundo terrenal e ficar pairando por Boa Vista, vendo os desenrolares após a minha partida (partida é um nome bonito para eufemizar algo tão natural como a morte. Melhor que bater as botas, é verdade)? 

Possivelmente não vai acontecer assim, mas e se minha maior preocupação for saber o destino de meus textos não publicados? Ontem ou anteontem ou agora, dependendo de sua relação com o tempo, estava pensando nos livros que ainda não publiquei e deveria ter jogado ao mundo há muito tempo.

O primeiro é de antes de 2010. Seria uma coletânea de crônicas, poemas e contos divulgados inicialmente aqui no blog. E teria ilustrações de um ciclista passeando por todo o livro. A capa também seria um ciclista. Não lembro o nome que lhe daria, mas recordo-me que cheguei a propor à Rosana Santos, que dirigia o setor de cultura do Sesc nesse então, a publicação da obra. Ela pediu para levar a boneca do livro. Aí começou a caminhada sem fim. Demorei para separar o material. Então passei, não me lembro da ordem, para o jornalista Nei Costa ajudar na diagramação (ou revisão, talvez). Acho que antes havia dado ao também jornalista Plínio Vicente para ajudar em algo. 

Por último, sei lá quanto tempo se passou até isso, ficou com a designer Lidiane dos Santos a montagem, o tratamento das imagens (produzidas pelo ilustrador Two, hoje vivendo em local não identificado por mim) e a capa. Ah, essa capa seria uma foto minha numa bicicleta, feita por Zanny Adairalba, à época ocupando o status de namorada. Pelo projeto gráfico da Lidiane ficaria linda depois de trabalhada como se fosse uma pintura. Resumindo: vai e volta, vai e volta, o mundo girou muito, perdi a chance do patrocínio, perdi o arquivo e hoje não sei onde está o material.

O segundo livro seria apenas de poemas. Os textos não sei quando foram escritos, mas a produção começou numa fase difícil para mim, no auge da crise de minhas hérnias. Lembro que pedi para Zanny, já no status de esposa e mãe do Edgarzinho, digitar os textos escritos a mão. Aí a gente instalava o data show e projetava na parede do quarto os poemas para fazer a revisão e diminuir o risco dela ter trocado alguma letra e eu deixar passar. Acho que o ano era 2010, 2011. Foi um tempo difícil para mim, com as dores nos braços limitando muito a minha vida. Livro revisado, cheguei a inscrevê-lo em um ou dois concursos de poesia para livros originais. Não foi selecionado, dei uma nova olhada nos textos e já passei a gostar menos deles, achando-os pouco poéticos, muito “duros”. Larguei em algum lugar digital e esqueci, sem querer, a localização da pasta. Esse livro,vale destacar, foi uma intenção, um devaneio. Diferente da coletânea, não nasceu com possibilidades concretas de ser impresso.

No intervalo entre os dois quase livros veio em 2011 a publicação do Sem Grandes Delongas (se não baixou ainda, é só clicar aqui), uma série de projetos e ações feitas com o Coletivo Caimbé (quem produz sabe o extenuante que é fazer a pré e a pós-produção cultural, sobretudo os registros de memória), o trabalho da vida real, cansaço mental e as dores, tratadas com choques elétricos, gelo, aparelhos desinflamatórios, acupuntura, RPG e, o Santo Graal, os alongamentos no pilates.

O terceiro livro não publicado quase chegou lá no ano passado. Foi escrito totalmente a mão, no silêncio do meu antigo apartamento, com pouca luz e muita reflexão. Escrevia a primeira versão e já passava a limpo o rascunho, mexendo na estrutura caso não me agradasse mais. Depois de ter um monte de poemas prontos, passei para o computador, alterando novamente os textos. Ficou alguns anos parado na gaveta virtual até aparecer um edital do governo do Estado de Roraima prometendo uma grana para publicar cinco livros de autores radicados aqui. Fiz um projeto conforme as regras do edital, imprimi o material, fui selecionado, botei a Zanny (sempre ali, parceirassa) para me assessorar na busca da editora, aguardamos o pagamento e... tomamos calote na veia. A gestão da Suely Campos, governadora da época, não ligou pra gente e desprezou a própria iniciativa. 

Ficamos a ver navios (no final desta postagem quilométrica vou copiar a matéria que saiu no Jornal Folha de Boa Vista com as nossas reclamações em outubro de 2018). Ainda bem, aindaaaaa bem que não levei pra frente uma ideia que me chegou de repente no meio desse processo e que seria bem a minha cara de abestado confiador de que os outros vão sempre honrar seus compromissos: imprimir o livro por conta e gasto próprios, depois receber e ficar elas por elas de boas. Ainda bem que fiquei quieto...

Esse livro de poemas quase impresso em 2018 é o que acho mais bacana de todos, inclusive mais bacana que os contos do Sem Grandes Delongas. Estou pensando em bancar uma impressão independente dele ainda neste 2019, aproveitando que não perdi o arquivo ainda. Tem até prefácio já, feito pela poeta Elimacuxi.

Quantos livros foram até agora? Três. Ok. Não cansado de quase publicar sempre, aproveitei este ano para, no intervalo entre um parágrafo e outro da dissertação, escrever um novo livro de poesias, bem mais curto que o quase livro de 2018. 

Esta semana fiz a revisão dele, cortei uma coisas, mudei outras, arrumei ali, organizei ali. Vou ver se inscrevo ele em alguns concursos. Se nada rolar, tentarei publicar ano que vem. Se não der certo, serão quatro livros quase publicados por mim, o que deve me transformar num dos maiores autores quase publicados de Roraima.

Voltando ao começo do texto, já pensou tudo isso me atormentando numa pós-vida? Que agonia seria, que agonia...

P.S. : O colega escritor Aldenor Pimentel me lembrou lá no grupo de Whatsapp dos Escritores de Roraima que antes do Sem Grandes Delongas tive o e-book Roraima Blues como primeiro livro solo publicado.  Eu acho que em algum momento da redação pensei nele, mas o meu pensamento é meio linear às vezes-quase sempre-já passei vergonha por isso- e disse (ele, meu pensar, ou eu, dono do pensamento?) "estamos falando só dos impressos. Apenas dos impressos, não viaja...". Bem, descartei lá na hora, mas depois dessa observação do Aldenor, acho válido apontar que em 2008 a revista portuguesa Minguante publicou esse livro digital de microcontos. O site saiu do ar, eu não havia pedido nenhuma cópia do material  e apenas anos depois consegui um arquivo com os textos selecionados, mas sem a capa, que pode ser conferida nesta postagem feita por mim à época. Ah, e para variar, não sei em que canto está o arquivo...

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A seguir, a matéria falando sobre o calote do Governo de Roraima. Por desgosto e vã esperança de receber e esquecer o assunto nunca havia falado disso aqui no blog, mas sempre citava por aí nas conversas sobre literatura.

 CARTA DE REPÚDIO


Escritores reclamam de falta de pagamento

Escritores e agentes culturais de Roraima publicaram uma carta de repúdio nas redes sociais reclamando da falta de cumprimento do edital



Escritores e agentes culturais de Roraima publicaram uma carta de repúdio nas redes sociais reclamando da falta de cumprimento do edital l 07/2017 de incentivo e fomento a literatura da Secretaria de Cultura de Roraima.

De acordo com a carta, sete meses após a divulgação do resultado final, o Governo de Roraima ainda não entregou a premiação. A lista dos projetos aprovados foi publicada no Diário Oficial do Estado em fevereiro de 2018. Os autores dos projetos a serem premiados são: Edgar Borges, Eroquês Velho, Aldenor Pimentel, Lindomar Bach e Danilo Santos. O valor total do edital é de R$ 100 mil, sendo R$ 20 mil para cada um dos cinco projetos de livro selecionados para publicação.

“O edital estipula prazo máximo de 30 dias para a premiação, o que ainda não foi feito, ainda que as despesas tenham sido encaminhadas à Sefaz, para pagamento, em abril deste ano, pela Secult” 

Confira na íntegra:

Nota de repúdio

Nós, escritores e coletivos literários abaixo assinados, repudiamos a não entrega da premiação em dinheiro, pelo Governo de Roraima, dos cinco projetos aprovados no Edital N. 07/2017 – Incentivo e Fomento a Literatura, da Secretaria de Estado da Cultura (Secult), cujo resultado final foi divulgado oficialmente por meio da portaria N. 022/2018, de 23 de fevereiro de 2018, publicada no Diário Oficial do Estado de Roraima N. 3186, em 26 de fevereiro de 2018.

Destacamos que o mesmo edital estipula prazo máximo de 30 dias para a entrega da premiação, que, até o momento, sete meses após a divulgação do resultado final, não foi efetuada, ainda que as respectivas despesas tenham sido liquidadas em abril deste ano pela Secult e encaminhadas à Sefaz para pagamento, conforme despacho daquela secretaria.

Repudiamos ainda a postura da Secult, que em ofício, “lavou as mãos” em relação à entrega da premiação, eximindo-se de sua responsabilidade como coordenadora do certame, ao orientar estes escritores a procurarem a Sefaz, com o argumento de que os procedimentos por aquela secretaria “competem somente até a fase da liquidação da despesa”, o que é contraditado pelo próprio edital, cujo texto diz que a Secult pode, intervir mesmo após a entrega da premiação, ao, por exemplo, “acompanhar o desenvolvimento das atividades e, após a conclusão dos trabalhos, verificar o cumprimento das condições fixadas”.

Repudiamos também a desculpa do Governo do Estado de que está impedido de entregar a premiação em razão do bloqueio de suas contas, quando sabemos que o Governo pôde, mas não efetuou o pagamento deliberadamente. Prova disso é que em junho e julho deste ano foi realizado o Arraial do Anauá, quando foram realizadas diversas despesas da área da cultura.

Entendemos que o não investimento dos referidos recursos representará grande perda para o próprio Governo, a literatura e a cultura locais e, principalmente, a população.

Lamentamos tamanho atraso na entrega da premiação em dinheiro, o que apenas reflete o descaso histórico do Governo do Estado com a promoção de políticas culturais, em especial voltadas ao desenvolvimento da literatura e da leitura, enquanto no mesmo período este Governo firmou contrato para a destinação de R$ 89 mil, na modalidade de inexigibilidade de licitação, com o objetivo de adquirir obra artística de um único produtor cultural, autor de dezenas de outras obras, que, desde 2015, foram adquiridas ou estão em processo de aquisição com recursos do Estado, sem contar que a gestão atual abriu inscrições para edital cultural de outro segmento, mesmo alegando não haver recursos para o edital de literatura, cujo resultado já foi divulgado.

Assim, solicitamos a imediata entrega da premiação em dinheiro do Edital N. 07/2017 – Incentivo e Fomento a Literatura, aos projetos que tiveram, pelo próprio Governo do Estado, por meio de processo público de seleção, reconhecidos o mérito cultural e a qualidade técnica, para que se atinjam os objetivos do certame de “disseminar o conhecimento e a cultura do Estado de Roraima, e levar o leitor para novos caminhos”.

Outro lado – A Sefaz (Secretaria de Fazenda) informa que as contas do governo encontram-se bloqueadas, em cumprimento de decisão judicial, o que impede qualquer tipo de pagamento. Tão logo haja o desbloqueio, os pagamentos pendentes serão normalizados de acordo com a disponibilidade de recursos.

sexta-feira, abril 05, 2019

Sabores da noite passada

Meu hálito nesta manhã me lembra um pouco das alegrias e sabores da noite passada. Bebemos, rimos, cantamos e, sinceramente não tenho certeza, mas acho que também usamos alguma coisa levemente ilegal para adoçar ainda mais a madrugada.

Começamos cedo, com um happy hour que buscava espantar as dores de um dia pesado de trabalho para ambos. Eu não te conhecia. Não, eu já havia te visto uma ou duas vezes por aí. Sim, isso mesmo. Os amigos nos apresentaram formalmente, começamos a falar de filmes, livros, política e jardinagem. Chope vai, tira-gosto vem, desafinamos algumas músicas no karaokê, discordamos sobre os rumos da economia, sorrimos muito e, se não me engana a memória, trocamos uns beijos no estacionamento do bar. 

Quando a mesa começou a ficar vazia e iniciativas mais decisivas passaram a ser exigidas pelo horário, te fiz uma pergunta fundamental para definir os rumos daquela noite: 

- Dorme comigo? 

Então você abriu um sorriso, encostou tua boca em minha orelha e me disse, antes de mordê-la: 

- Claro. Só estava esperando o convite.  

Ainda bebemos mais um pouco e trocamos ideias sobre o futuro da nação antes de chegar em casa. Por sorte, meu companheiro de aluguel havia encontrado lugar melhor para passar a noite e ficamos à vontade para passear com os nossos corpos sem roupa da sala até o quarto. Li com a língua cada uma das tatuagens e sinais da tua pele enquanto lembrava de um som que ouvia quando era moleque: 

“Y yo que nunca tuve
Más religión que un cuerpo de mujer
Del cuello de una nube
Aquella madrugada me colgué”

Pendurado em tuas nuvens estava quando você falou que provavelmente não amanhecerias ao meu lado. Algo como um compromisso logo cedo com o trabalho, amigos, namorado, não sei... Confesso que naquele momento eu só pensava em sentir o teu gosto e isso afetava o meu raciocínio. O depois ficará para depois, pensei.

Amanhece, abro os olhos e fico olhando para o teto do quarto, cantarolando em minha mente a mesma música da madrugada. Só me acompanham teu cheiro grudado em minhas mãos e uma mensagem no celular, na qual dizes ter gostado da noite e prometes um dia talvez repeti-la. 

Enquanto tomo uma xícara de café preto, sorrio e penso em como promessas de noites boas são fundamentais para aguentar os dias cheios de rotina.

segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Almoço zen



Na seção de poesias, a moça do balcão pergunta se o senhor vai querer comprar alguma produção. Desiludido, responde que está a fim de um pedaço de sonetos. Bota também umas gramas do haicai mais barato que houver, completa.

Ah, este mundo cão, onde a imagem não vale mais o que custava antes do reajuste governamental. Agora o preço subiu. Imagem real, tanto; real, porém manipulada, tanto a mais.

Nem o sexo é como antigamente. O bom senhor, cuja única religião foi sempre um corpo de mulher, apela agora para uma simpática boneca inflável e umas pílulas que lhe perturbam o coração, na avaliação insistente do médico da família.

Com a poesia na sacola de plástico, pensa na filha, fugitiva de amor, cruzando o estado às pressas para entocar-se nos braços de um escritor liberal e dândi, autor de crônicas imorais, verdadeiros atentados à família, aos bons costumes e à gramática. Melhor, sobra espaço na casa.

Será que não teria sido melhor comprar um pouco de concretismo e versos alexandrinos?

Talvez hoje saia para fumar um cigarro com os outros bons senhores da vizinhança. Nada muito exposto, que não convém. Depois, um cineminha, pipoca, refrigerante e gritos para que ninguém assista ao filme em paz.

Vai fazer um belo almoço. No cardápio, tem poética, metafísica e religiosidade. Para temperar, pitadas de infantil crueldade cotidiana. Pensa até em escrever à editora do cunhado e mandá-lo para o inferno. Mas hoje não. Hoje não tem sobremesa, só um drinque de muito cinismo e descaramento.

Parece que vai ser bom.

sexta-feira, julho 16, 2004

Salsa e ciúmes


 
Uma da manhã. A pista está cheia na boate mais animada da cidade. É sempre assim na quinta-feira, quando é noite de salsa, merengue e caribe. Suor escorre da maioria dos rostos. Homens e mulheres, mulheres e homens, todos exibem-se para todos.

No balcão do bar, Ricardo e Drica discutem. Ele está cansado e ela quer mais. Ele quer ir embora para dormir, acordar cedo e ir trabalhar. Para ela, que também trabalha daqui a pouco, o final de semana o momento ideal para descansar. "A noite não espera para acabar e o trabalho sempre estará lá quando o procures", afirma a jovem.

Do outro lado da pista, Alberto mexe-se desajeitadamente ao som do mais novo sucesso de  Gilberto Santa Rosa. Alberto não dança uma vírgula, mas gosta de freqüentar a boate para ver as apresentações dos bailarinos profissionais à meia-noite. Depois, sempre fica mais um pouco para tentar descobrir alguma mulher sem par, coisa das mais difíceis na boate, e sem esperança de encontrar alguém melhor que Alberto para dançar.

Mas hoje a noite parece ser muito ruim. Nem sequer Ana Rita, sua amiga e eterna salvação na dança apareceu. Deve ser por conta do namorado novo, pensa o aprendiz de dançarino enquanto se dirige ao bar para comprar uma bebida e ir embora.

Lá, surpreende-se ao encontrar Ricardo e Drica, seus monitores na escola de dança que começou a freqüentar na terça-feira passada. "Olá, como vão, gostei do espetáculo. Um dia chego lá", brinca. Percebe que o clima não é dos melhores, pede sua bebida e quando vai dizer adeus, estendendo a mão para o casal, Drica aproveita a deixa e o puxa para dançar. A bebida Drica põe na mão do atônito Ricardo enquanto o olha desafiadora.

Na pista cheia de bons dançarinos, Alberto usa tudo o que aprendeu na única aula de salsa e merengue que teve na vida. Drica diverte-se com o esforço e ri, linda, divinamente, enquanto seus cabelos lisos e negros grudam na pele morena e seus olhos parecem refletir toda a luz da boate. 

Mas uma noite assim não pode terminar bem. Ricardo, o sonolento bailarino que durante o dia é bancário, também acumula conhecimentos de boxe para ocasiões como esta. Na sua opinião, Alberto merece uma lição não de salsa e sim de ringue. Começa a atravessar a pista para iniciar a aula enquanto, alheio ao risco que corre, o futuro aprendiz de luta empolga­-se com o bailado de Drica e começa a apertá-no ritmo certo, puxando para um lado e para outro, do jeitinho que ela ensinou. 

A três passos do casal, o celular de Ricardo, o violento, toca. É a mãe de sua namorada, perguntando a que horas vão chegar. Afinal, ela tem de ir trabalhar cedo. "É tua mãe", diz, cavernoso. "Oi, mãe. Meu celular? Acho que ficou dentro do carro. Está bem, sei que é tarde. Vou agora. Beijos. Bem, Alberto, valeu pela dança. A gente se vê na próxima aula. E continua praticando. Você esteve ótimo", fala a moça para o rapaz, antes de beijar-lhe a face, pegar a mão do namorado e caminhar para a porta da boate.

Na pista, Alberto, só e ligeiramente menos desajeitado, continua balançando-se, desta vez ao  som de um antigo sucesso de Tito Rojas. "A noite não fui tão ruim assim", acredita, "e ainda bem que o professor não levou a mal nem ficou com ciúme. Ele é gente boa".