quinta-feira, março 20, 2014

A noite em que fui analisado


Cês sabem como é ser analisado e descobrir que havia ali no dito muito mais do que havia alcançado a nossa vã filosofia?

Não, não estou falando de ir deitar no divã dos psicólogos, psiquiatras ou psicoanalistas da vida. Estou falando de ter uma criação poética analisada por um especialista na área e de escutar o cara falando coisas que fazem sentido e que transcendem o que se pensou no momento da criação.

A história é a seguinte: sou agora aluno especial do mestrado do Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Roraima (PPGL/UFRR). Então me senti na obrigação de participar de um evento muito bacana organizado pelo programa, o III Simpósio de Estudos de Linguagem e Cultura Regional: Regionalismo e Interdisciplinaridades.

Ontem à noite, quarta-feira, 19 de abril, estava na plateia da mesa-redonda Poéticas do agora: do regional ao universal. O último a falar foi o professor doutor Roberto Mibielli, que apresentou a análise de quatro poemas de poetas roraimenses: Avery Veríssimo, Cora Rufino, Francisco Alves e este que lhes escreve.

Quando o professor começou dizendo que o autor do próximo poema estava na plateia, que era jornalista, descendente de indígenas e, por último, venezuelano, fiquei surpreso. Sou eu, beleza, mas que poema o Mibielli terá escolhido?

A opção dele foi por Relatividades, publicado originalmente no blog no dia 23 de outubro de 2011.

Relatividade

A sugestão de pecado
Aparece de repente
Vestindo insinuante e
Indecente saia jeans curta.
Ainda seria sugestão
Se viesse de repente
Insinuante, exibida
Vestindo islâmica burka?


O que para mim é basicamente uma afirmação e uma pergunta sobre roupas femininas e o que podem ou não sugerir, no estudo do professor virou algo muito mais profundo. Finalmente entendi na carne o que significa a tal da análise poética.

Ele falou de olhar (isento ou não) jornalístico, de islamismo, do pecado na ótica cristã, de questões de gênero e umas outras coisas que não lembro. 

É que a cada frase eu pensava: caraca, mas eu só imaginei uma mulher de pernas bonitas usando roupa curta.

Pensamento curto meu à parte, foi muito legal o momento. Só fiquei pensando: e se não tivesse me inscrito no evento ou tivesse saído antes, será que ficaria sabendo? Quanto e quanto casos de análises de seus textos os colegas escritores estão perdendo?

Dia de preta: poema para Zanny Adairalba

 
A patroa celebra aniversário hoje. Achei mais barato fazer-lhe um poema do pé-quebrado do que gastar com futilidades. 

Dia de preta

Para Zanny Adairalba

Hoje é o dia da velha preta
Dia de celebração em nossa maloca
Hoje é o dia dessa negra poeta
Do olhar castanho-claro que me toca.

Hoje é dia de mais um dia
Com algumas dores e várias alegrias
Tempo de inventar-lhe alguma poesia
Com rimas nonsense, quiçá zombarias.

Hoje tem festa por Zanny, por mim apelidada Maria
Essa do olhar que no riso encanta e na fúria assusta
A preta velha, patroa, xamã, cangaceira de meu sertão
Essa que em nossa rotina toda hora um novo verso busca.

quinta-feira, março 06, 2014

Duas esquinas no mesmo cruzamento, duas faltas de respeito com o pedestre

Fui caminhar na quarta-feira de cinzas para ver se começo a perder o peso que ganhei nos últimos meses.

Fiz uns cálculos mentais de distância e decidi fazer uma rota diferente da que tenho percorrido desde que estamos numa casa alugada no São Francisco. Em vez de ir para a avenida capitão Ene Garcez, decidi embicar para a Ville Roy, minha avenida preferida na cidade.

Peguei a calçada direita da avenida Major Williams em direção à Ville Roy e no cruzamento com a Capitão Júlio Bezerra (mania antiga que havia na cidade de colocar nome de militar em tudo o que era rua), vi esta maravilha do respeito ao pedestre:



O tapume da obra não conta conversa: te joga direto na rua, sem espaço mínimo de segurança, bem de frente para um semáforo.

No retorno da luta contra as gordurinhas do mal, peguei a outra calçada. No mesmo cruzamento encontrei um exemplo de falta de respeito com os pedestres que passam em frente à igreja de São Francisco:



Como é que a pessoa tem tanta preguiça de caminhar um pouco do carro até a missa e falta de respeito com a legislação de trânsito na hora que vai para uma cerimonia religiosa? Pensando nisso, publiquei bem cedo a foto no Facebook com esta legenda:

Você que vai falar com Deus na quarta-feira de cinzas, tem preguiça de estacionar uns metros mais distante e deixa seu carro na calçada, obrigando pedestres a irem para a rua, correndo o risco de serem atropelados, ou pisarem no jardim do templo, deixa te avisar: estás fazendo tudo errado. Deus não curte sacanagem com seus outros filhos.

E olha que nem fã de discursos religiosos eu sou.