terça-feira, dezembro 23, 2014

Venezuela, um país sem bom destino

No lugar onde cresci na Venezuela, nada é como antes. Acabou-se a calma das noites, agora ocupadas pelo medo dos assaltos feitos por jovens em motos. Falta tudo nas prateleiras e nem sequer a gasolina escapa do racionamento. A propina move o mundo e quem deixa de pagar fica de fora do jogo. As gangues dominam as áreas de mineracao (vai sem til, pois o acento nao existe no teclado) e parte das cidades, criando máfias que cobram protecao dos comerciantes. 
As ruas de minha antiga cidade padecemo mal dos buracos na terra do petróleo. Só continua igual o carinho das pessoas com as quais cresci. Isso me reconforta enquanto visitante cada vez esporádico. A eles, no entanto, fica o cotidiano de um país destruído social, política e economicamente. E antes de que alguém diga que a culpa é daquele ou do outro governante, fica a certeza das ruas: venha quem venha governar, isso aqui ainda será a mesma Venezuela de hoje.

sexta-feira, dezembro 12, 2014

Check-list cultural da depressão



Em dezembro de 2014, as coisas estavam assim:

1.       Casa da Cultura: fechada
2.       Intendência: fechada
3.       Centro Multicultural da Orla: fechado
4.       Teatro Carlos Gomes: fechado
5.       Museu Integrado de Roraima: fechado
6.       Biblioteca municipal: fechada
7.       Biblioteca estadual: só funciona em horário comercial e não abre aos finais de semana... Quase fechada, então.
8.       Galeria do anfiteatro do parque Anauá: fechada
9.       Bibliotecas dos municípios: quase todas fechadas
1.   Prédio antigo da Secretaria Estadual de Educação: abandonado

quarta-feira, dezembro 10, 2014

Deixa a Estátua do Garimpeiro em paz




O coordenador-geral da Frente de Proteção Yanomami e Ye'kuana, da Fundação Nacional do Índio (Funai), João Catalano, criticou ontem um dos principais símbolos de Roraima, o monumento ao Garimpeiro, na Praça do Centro Cívico. Ele disse que a estátua seria uma apologia ao crime e que, por isso, vai propor a demolição do monumento.

Já havia lido algumas pessoas propondo a derrubada da Estátua do Garimpeiro por conta disto, por conta daquilo, blá, blá, blá. Mas foi a primeira vez que li alguém  com cargo público fazer a proposta.
Quer saber? Sou a favor de que permaneça aí. Se quando foi erguida tinha um significado, hoje adquiriu outro. É a lembrança do que não devemos louvar, mas também faz parte do imaginário de várias gerações. 

Eu mesmo tenho fotos feitas nele quando menino. Meu filho tem e recomendo a todo boa-vistense que leve seu filho para lá fazer a fotinha clássica com o garimpeiro ao fundo.
Quer derrubar "o que não nos representa"? 

Taca bomba no Monumento aos Pioneiros (havia índios aqui ocupando o espaço.No máximo, os brancos foram invasores), derruba a Igreja Matriz (a igreja católica, em certa fase e com certas atitudes, ajudou na opressão dos nativos), deixa cair a Casa da Cultura (opa, isso já está sendo feito) que abrigava os dirigentes vindos de fora para comandar a região; demole a Fazenda São Marcos e o que resta do Forte São Joaquim (ah, não, peraí. Isso já está acontecendo naturalmente e é bem feito, afinal, foi lá que os primeiros invasores firmaram seu controle no vale do Rio Branco).

Todas essas construções tem dualidades no que representam. Vão refletir sobre isso antes de mexer com a coitada da estátua e apoiem as ações contra a mineração ilegal. 

Beijos na bateia.

UP DATE em 11.12.14

Texto publicado no Facebook pela poeta e professora de História Elimacuxi a respeito da proposta de demolição:

Há poucos dias ministrei um minicurso sobre monumentos em Boa Vista e a violência discursiva de alguns deles sobre os indígenas. É preciso saber que a memória social é elemento essencial na composição da identidade e se forma sempre numa arena de disputas. Querer destruir um monumento central da cidade, como o Garimpeiro, é um ato político marcado pelo interesse de manipulação da memória coletiva, assim como também foi esse interesse que levou Helio Campos a erigi-lo, tantos anos atrás.

Eu escrevi parte da história de nosso estado baseando-me nos monumentos, que são importantes documentos históricos. Num estado como o nosso, onde não há arquivo público, onde tudo se apaga e a história é tratada como se fosse propriedade de uns poucos detentores de documentação, a proposta de demolição do Garimpeiro, feita por um representante dos interesses indígenas, não auxilia em nada no debate por uma sociedade mais justa, mais igualitária, mais respeitosa dos direitos (bem como da memória e da identidade) dos demais.

Ministrei o minicurso por crer que não é demolindo os monumentos que se construirá uma nova consciência, mas demonstrando sua importância enquanto documentos vivos da história de exclusão e violência contra os indígenas daqui.

Não é destruindo obra de arte e patrimônio que se abrem novos caminhos. Conhecimento e amor é que mudam o mundo.

quinta-feira, dezembro 04, 2014

Ouvindo gente reclamona na rua


 Estava eu lá ontem, com a patroa e o indiozinho, tomando meu guaraná no quiosque do Marivaldo, no meio da praça Ayrton Senna, curtindo um ventinho sem poluição e vendo a lua nascer, quando a conversa da mesa ao lado começou a me irritar.

Era uma senhora reclamando para a sua amiga do calor da cidade; de como a energia elétrica oscila e a obriga a tirar os eletrodomésticos da tomada à noite, deixando-a cansada; de como as interrupções no abastecimento de energia e água a estressam; da falta de uma bandeja de carne cortada a seu gosto nas prateleiras dos supermercados e da necessidade de toda vez ter que pedir ao açougueiro que lhe atendesse.

A foto do Centro de Boa Vista é de Orib Ziedson
A senhora ainda falava que na cidade tudo era espalhado e o mormaço do meio-dia a incomodava, sendo melhor almoçar no RU (Restaurante Universitário) para agilizar sua vida neste horário (aqui saquei que trabalhava ou na UFRR ou perto); de como isso possivelmente era a causa do mau humor dos colegas nas reuniões de colegiado (aqui eu já deduzi que fosse professora).

A professora universitária continuou suas lamentações: sente falta do mar (morava no litoral), do apartamento que era seu refúgio e no qual ainda adora ficar quando vai visitar os pais (morava em prédio). Disse que gostava muito de passear naquela região perto da UFSC (Ok, veio de Florianópolis) e que ali tinha tudo o que ela precisava. Já em seu bairro atual, é tudo difícil, não tem mercearia por perto, não tem um bom queijo para comprar se quiser receber os amigos, o que a deixa cansada, e nem sempre está funcionando a bomba de ar do posto de combustível perto de sua casa – “aquele que fica ali, na avenida que passa ao lado da universidade”.  Aqui eu deduzi que a docente tem um carro para locomover-se e mora em um dos bairros que mais tem vendinhas na cidade: Mecejana ou Jardim Floresta .

O guaraná não chegava e a Zanny estava tirando umas fotos do moleque quando veio a pérola-mor: “isso de ter que tirar as chaves das portas quando a gente as fecha, de ter que trancar porta do quarto com as coisas dentro com medo de roubo é muito ruim. Isso me deixa cansada, estressada”. Ou seja, a dona professora morava em um prédio em Floripa e nunca sentiu medo de roubo, assalto ou furto. Eu, que conheço a Ilha da Magia e leio jornal, fiquei assim, pensando em como meus amigos mentem ao me contar dos problemas da segurança lá.

Estava quase indo falar para ela aquela frase padrão para gente que vem para cá obter a renda com que paga suas contas e reclama de tudo o que não tem na cidade: o aeroporto e a BR são a serventia da casa, funcionam todos os dias e ninguém é obrigado a ficar em Roraima se conseguir emprego em outro canto ou ganhar a sua redistribuição de cargo federal. 

Por sorte nessa hora chegou a jarra de guaraná e pude dedicar meus outros sentidos a algo mais prazeroso do que ouvir, sem querer querendo, a ladainha desta pessoa que não valoriza o que Boa Vista lhe dá.

terça-feira, dezembro 02, 2014

Um vídeo: entrevista para o G1 Roraima em julho de 2014

Vídeo publicado no portal do G1 Roraima em 25 de julho de 2014, por conta da passagem do Dia do Escritor.






Originalmente veiculado em http://globotv.globo.com/rede-amazonica-rr/g1-rr/v/edgar-borges-lembra-trajetoria-como-escritor-em-roraima/3520647/.

No vídeo, fui respondendo a algumas perguntas do repórter sobre quando havia começado a gostar de ler/escrever, minhas motivações e coisas do tipo.

 Foi gravado pela manhã, o que explica as olheiras do entrevistado e cabelo meio bagunçado.