segunda-feira, agosto 30, 2004

Juliana, a rainha da folia

Como é feito todos os anos, o prefeito da emergente cidade de Santa Rita dos Aparecidos, reeleito e feliz, planeja um carnaval que traga muitas divisas para o município, levantando as economias dos empresários e alegrando os foliões, que esquecem de todas as dívidas, provações, incompetências, filhos, esposas e maridos durante alguns bons e mundanos dias. A primeira providência é escolher um rei e uma rainha. Afinal, assim reza a tradição: um gordo alegre e uma morena faceira e com samba no pé devem receber a chave da cidade.
Nas escolas de samba, agitação é palavra de ordem. Os presidentes encomendam aos olheiros que caprichem no serviço e lhes tragam a mais bela das sambistas, seja ela escolhida entre as meninas da própria escola, seja entre as freqüentadoras dos clubes de pagode. Na escola Avenida da Central, a procura é frenética, afinal está em jogo não apenas a honra conquistada por uma das suas componentes de reinar na folia, mas o bicampeonato carnavalesco.
Cinco morenas são examinadas ao som da bateria. Juliana, cabelos cacheados, lábios carnudos, pernas torneadas, sorriso fácil e cintura-de-mola é a escolhida. Tem pela frente um desafio, pois as outras escolas não deixaram por menos nas indicações.
No dia da escolha, muito nervosismo. Juliana arrebata o título de rainha sem muitos problemas. Samba com alegria e desperta a paixão de vários espectadores, que oscilam entre os galanteios rudes (gostosa, tu é a mulher que mamãe sonhou para mim), os mais ou menos (nossa, namora comigo e te dou minha vida) e os metidos a poeta (tua beleza me desnorteia, linda mulher que flutua enquanto dança).
Mas Juliana não dá bola a ninguém. Ela já tem o seu homem. Isso até descobrir que ele a estava traindo com a rainha da bateria. Aí, enraivecida, promete vingança no meio da folia. Sorte do irmão do rei Momo, um repórter fotográfico escalado pela organização para acompanhá-lhos em todas as festas. Haviam se conhecido durante a visita que todas as candidatas fizeram ao prefeito. Simpatizaram logo de cara. Na primeira noite de carnaval, fuga dupla para uma praia do rio Piná. Vinho, queijo, beijos... Assim correu o mundo até a quarta-feira de cinzas, quando as obrigações do malvado mundo real separaram os novos amantes e cada um voltou a seus respectivos amores. Do velho carnaval da reeleição, sobraram apenas lembranças, uma fotografia e silêncio sobre o romance. Mas eles, lá no fundo, esperam ansiosos pela micareta, onde velhas paixões costumam esquecer tudo durante mundanas horas.

(Publicado originalmente no carnaval de 2001, no extinto semanário A Tribuna do Estado de Roraima)

quinta-feira, agosto 26, 2004

Investigación de primer mundo

En la plaza Bolívar, de Guasipati. De repente, se para el carro de la policia y se bajan los agentes, pistolas en puño, apuntando a los tres jovenes. 
 
- ¡Manos p´árriba! 
- Que pasó? 
- ¡Manos p´arriba, péguense a la pared! ¡Documentos!
 - Aquí están, pero que pasa, señor policía? 
- De quien es aquel carro? - Que carro? - Aquel que está parao en la esquina. 
- No sabemos.
 - Como no sabem? No es de ustedes? Ustedes no estaban en la esquina? 
- Si, pero ni lo habíamos visto. 
- Dónde tu vives? 
- En la Vuelta Del Diablo... 
- Nunca te vi por aqui. Tu vives aquí mismo?
- Si. - Y tu? Vives aquí también? 
- Si. 
- Bueno, súbanse los tres al carro ahora. 
- Pero por qué? 
- Coño, súbanse. ¡Los estoy mandando! 
- Pero por qué? 
- ¡Que te subas,chico! 

 (Os policiais continuam apontando suas armas enquanto todos entram no camburão. Seis quadras depois, na delegacia, o comandante fala com eles) 

 - O sea, que ninguno de ustedes es el dueño del carro?
 - No, señor, nosotros no tenemos carro.
 - Y que hacían paraos en la esquina de la plaza? 
- Hablando... - Y qué, no trabajan? - Somos estudiantes. 
- Ah, OK, estudiantes. 
- Y por qué nos trajeron? 
- Es que un tipo amenazó de muerte a un señor y estaba vestio como ustedes, con una camisa azul, una gorra como la tuya y un blue jeans. 
- Pero no somos nosotros, señor. 
- Bueno, es que ustedes eran sospechosos. Y además, estaban paraos cerca del carro. 

 (entram vários policiais com um homem algemado) 

 - Lo cogimos, comandante. Lo encontramos cerca de la plaza. 
- Bueno, muchachos, ahora que probamos que ustedes no amenazaron a nadie, pueden irse. Compórtense bien, OK? Y no se pongan así. Ustedes saben que ese es el trabajo de la policía. Váyanse tranquilos.

terça-feira, agosto 24, 2004

Um coral formado por120 crianças de 6 a 14 anos apresentando-se no parlatório da Universidade Federal de Roraima durante o V Painel Internacional de Regência Coral é algo comum, esperado até, tendo em vista o tipo de evento.
Mas o coral, bem afinado e levemente nervoso na que foi sua primeira apresentação, é especial. Para começar, apresenta suas músicas em dois idiomas. Os ensaios, apenas nos finais de semana, são feitos nas aldeias indígenas Tabalascada, Malacacheta e Canauanim, a mais de 20 quilômetros de asfalto, piçarra e muita lama ou poeira, de acordo com a época do ano, de Boa Vista.
Além disso, o regente do coral e seus alunos têm em comum algo mais do que o gosto pela música. Todos são wapixana, uma das etnias historicamente vítimas do que parte da sociedade roraimense costuma chamar de convivência harmoniosa entre índios e não-índios (Por convivência harmoniosa, entenda-se uma relação de subalternidade na qual a força do branco predomina).
Cristino Pereira dos Santos é o responsável pelo coral, nascido a partir de uma ação autônoma que ele chamou de Projeto Canto Indígena. Há seis meses, todos os sábados ele deixa Boa Vista para ir ao município do Cantá e ensinar música às crianças. O professor conta que a ansiedade de alguns alunos é tanta que vários começam a rondar o salão de aula uma hora antes das lições começarem, às 8h.
Os frutos começam a ser colhidos. Na estréia, o coral apresentou canções próprias e cantos tradicionais na língua materna e em português. Vestidos com saias de palha, com acompanhamento de um violão e de um violino, o coral já tem sua solista, uma chimeba (menina) que se apresentou apenas com a palha de buriti e tinta de urucum cobrindo seu corpo.
A cantoria em língua nativa, além da preservação de sua cultura, representa um trabalho de valorização da auto-estima dos indígenas. Quando algumas famílias migram para as áreas urbanas, os mais novos costumam negligenciar a herança que carregam em troca de uma integração mais rápida com a nova sociedade da qual fazem parte.
Até o final de ano, conta Cristino, o projeto deve ampliar seu alcance, consolidando o coral, um grupo de violonistas e um grupo de composição musical. Tudo isso tendo como única ajuda oficial 20 litros de gasolina mensais doados pela Funai (Fundação Nacional do Índio).
Segundo o professor, seu trabalho é motivado por ter consciência que "a cultura muda a mentalidade das pessoas e que o governo não dá isso porque assim consegue controlar a gente". Uma platéia formada em parte pelos filhos da própria sociedade que ignora as necessidades dos indígenas, em parte por pessoas sensíveis à causa destes povos, além dos pais das crianças e alunos do louvável projeto de licenciatura Insikiram, mantido pela UFRR, aplaudiu a disposição do professor e seus alunos em demonstrar que 500 anos de sofrimento e exclusão é um tempo insuficiente para acabar com o orgulho de ser índio.


sexta-feira, agosto 20, 2004

13 de fevereiro de um ano qualquer da minha juventude.
Depois de seis dias afastado de computadores, celulares e tudo o que é movido a energia elétrica, retorno do Monte Roraima, a casa de Macunaíma, deus-pai dos índios Pemón e Macuxi, marco da tríplice fronteira entre o Brasil, a Venezuela e a Guiana.
Em Pacaraima, enquanto espero um sanduíche de queijo e um guaraná, meus olhos são atraídos por uma janela multicolorida que brilha e tem pessoas dentro dela. Após cinco segundos, processo a informação: a janela é uma televisão. E eu, que reconheço canais pela marca nos cantos da tela, demoro a reconhecer a logo da Band.
A experiência, muito mais que alguns semestres cursando Antropologia e Sociologia, me ajuda a entender a expressão de medo e fascinação de meus primos índios quando chegam às cidades dos brancos.


quarta-feira, agosto 18, 2004

Da série "escritos para mulheres especiais"

Difícil conquista

Foi olho no olho, primeira impressão
Alucinei, te ofereci a galáxia.
Você riu, balançou a cabeça
Me chamou de exagerado,
Pediu que fosse com calma.

Não te ouvia, fui em frente
Sem desistir, trouxe a Via Láctea.
Você disse "ai, meu Deus,
Lá vens tu de novo" e me
Falou de paz na alma.

Mané paz o quê, juntei num pacote
universo, Via Láctea, a lua, rosas e mil estrelas.
Você fez bico, olhou para o lado,
Explicou: estava ocupada, era quinta-feira
Mandou voltar em ano menos tumultuado.

Na insistência, cabeça-dura, apaixonado
Pedi ajuda ao Papa, ao presidente, ao chefe da polícia.
E você, sem dar atenção aos meus cartazes na rua,
Contando preferir revistas e jornais,
Mandou arrancar a faixa onde escrevi "minha alma é tua."

Cansado, desiludido, mas persistente
Joguei uma última e desesperada carta na mesa
Contratei um carro com alto-falantes
Recitei um poema publicado na seção de variedades.
Preso por desordem, passei dois dias atrás das grades.

Conformado, passei um e-mail
Declarando derrota e retirada total do time de campo,
Reclusão, esquecimento, apesar de toda a dor.
Agora é você quem manda flores, me acossa,
Perturba no trabalho, manda cartas de amor.

E eu aqui, quieto, sem entender nada,
Perguntando se sou louco ou complicado
Se é normal tal situação absurda,
Na qual o apaixonado luta contra sol para conquistá-lo,
Perde a guerra e leva o troféu de primeiro colocado.

segunda-feira, agosto 16, 2004

Cena
Domingo, 12 horas, quarto escuro apesar da janela aberta, a chuva molhando as plantas, vento frio e Come Rain or Come Shine num dueto de B.B. King e Eric Clapton. O que mais pedir?

sexta-feira, agosto 13, 2004

Há dias em que Boa Vista ganha ares de cidade grande. Nessas horas, fica até difícil saber o que fazer. Nesta semana, por exemplo, o Sesc promoveu uma oficina de cinema para professores, adolescentes e crianças. A Universidade Federal de Roraima também fez uma oficina de cinema com exibição de filmes espanhóis.
Na sexta-feira 13, às 19h30, o Sesc promove um Café com Letras com o tema Cinema e Literatura. No mesmo horário, tem exibição e debate sobre o filme Tudo sobre minha mãe, de Pedro Almodóvar, no auditório da UFRR.
Ainda na sexta, rola show no Sesc com o George Farias e Eliakin Rufino, a turma do reggae na floresta. Na Universidade, o DCE realiza a Festa da Calourada, com rock e forró (afinal, estamos no Norte).
Em Boa Vista, a capital mais setentrional, há dias em que tudo acontece ao mesmo tempo. Mas há muitos outros em que a pasmaceira é geral.
Já na Venezuela as coisas não param. Finalmente chegou o 15A, a sigla do 15 de Agosto, data em que as facções governistas (os oficialistas) e a oposição (os esquálidos), ambas alegando defender a democracia, a dignidade e a prosperidade do povo venezuelano, vão se enfrentar (novamente) nas urnas para decidir se Hugo Frias Chávez deixa ou não a presidência.
E eu ouvindo La Oreja de Van Gogh no máximo

terça-feira, agosto 10, 2004

Mais um final de semana

Esvazio mais uma garrafa de cerveja enquanto meus amigos conversam sobre seus filhos e suas amantes. A tarde está quente e a transmissão do rádio diz que o meu time está perdendo novamente. Amanhã será domingo e com certeza amanhecerei de ressaca. Não sei se é pior a resultante da bebida ou a proveniente do convívio com as pessoas que geralmente se misturam nos finais de semana à fumaça do cigarro da casa de bilhar onde me divirto bebendo, fumando e apostando nos cavalos. Gosto de cavalos. Eles pelo menos algumas vezes me trazem lucro. Quando ganho uma aposta, tomo rum. Se a tarde é boa, arrisco um trago de uísque e compro um pouco de carinho. Tudo para esquecer que logo será segunda e o meu maldito trabalho estará lá, a minha espera, como uma onça espreita a presa.

quinta-feira, agosto 05, 2004

Da série "escritos para mulheres especiais"

Um novo quadro

Era um tempo sem estrelas
Havia vento sem perfume
O rio corria baixinho
Que nem criança assustada
A canção não era forte
E a palavra sem sentido
Alegria tinha aos montes
Escondida num carrinho.

Fez-se o sol, nasceu a chuva
O sorriso apareceu
Jogador guardou as cartas
Foi na rua para passear

É um tempo com estrelas
A brisa corre perfumada
E as águas brincam gritando
Que nem criança desbocada.

quarta-feira, agosto 04, 2004

O governador de Roraima daou no mandato, mas continua despachando. Há quem esteja aparentemente preocupado em como ficará a governabilidade do Estado. Há quem diga que já estava na hora do homem sair. Há quem apenas noticie. E há quem pense em começar a gastar por conta, esperando um suposto retorno de Ottomar Pinto e sua família ao poder.

terça-feira, agosto 03, 2004

Notícia policial

Após pedir um prato de sopa de carne com legumes, o contador Januário Pereira, 32, morreu atropelado ontem, enquanto falava ao celular na calçada do restaurante que freqüentava todos os dias.
Segundo amigos, tinha mania de caminhar e esquecer do seu entorno durante as ligações. Deixa mulher, um casal de filhos, uma coleção de 520 times de futebol de botão, romance extraconjugal sem nome ou endereço para correspondência e uma conta de cinco cervejas no boteco da esquina.

sexta-feira, julho 30, 2004

Resumos de uma viagem

Taxistas que se queixam da traição da mulher amada; mulheres obesas no ônibus que falam horas sobre cachorros, maridos e loterias; uma Pacaraima esburacada, sem calçadas e sem iluminação pública; uma Santa Elena de Uairén suja e feia; índios que sonham em ser não-índios e não-índios que exploram cada vez mais os índios; aldeias indígenas na Gran Sabana com um cheiro próprio; corridas de cavalos transmitidas pela rádio; cerveja Polar Ice; chicha; velhos conhecidos que regrediram, progrediram ou estagnaram.

segunda-feira, julho 26, 2004

Voltar para a Venezuela nao é um dos meus passatempos favoritos (sobretudo pelo fato de na língua espanhola inexistir o til, o que justifica o problema de acentuacao na palavra lida há pouco).
Na terra governada por presidente Hugo Chávez, o clima político é de incerteza. No próximo 15 de agosto a populacao vai às urnas para votar num plesbícito se deve ou nao revogacao do  mandato presidencial. Nos jornais impressos, a oposicao, representada pela Coordinadora Democratica, que associa políticos e empresários, nas palavras governistas, estreitamente ligados ao governo estadunidense, publica anúncios incentivando as pessoas a votarem "Sí". Os oficialistas pregam o "No". Palavras com sílabas "sí" e "no" sao usadas na guerra da propaganda para ganhar a simpatia do povo.
Minha cidade, Guasipati, continua igual na essência. Nao há nada de interessante nos domingos à tarde além de beber e apostar nas corridas de cavalos.
E todos continuam com o mesmo repertório de perguntas para os visitantes: quando chegastes? Como vai a tua mae? Quantos filhos tens? Quando vais embora?
É por isso que quem vai embora sente alergia de voltar. E eu volto logo, logo para Boa Vista. E sem votar na República Bolivariana da Venezuela

sexta-feira, julho 23, 2004

Pensamentos de rodoviária
 
Sete da manhã. O ônibus ainda não chegou na rodoviária. Melhor, com o atraso ganho tempo para comer alguma coisa antes de começar a viagem. O bilhete que comprei me leva até o último povoado da rota. Será um longo caminho até esquecer esta cidade.
Acho que meu tempo aqui se esgotou. Conquistei algumas coisas, algumas pessoas, mas peguei tanto não, fui tantas vezes passado para trás que já estava na hora de partir. E vou fazê-lo sem ter saudades de ninguém, sem o carinho de um abraço de despedida, é certo, mas também sem a obrigação de mentir, prometendo escrever.
O bom deste tipo de retirada é ir embora sem ter de prestar reverências a poetas pioneiros, familiares chorosos ou músicos desafinados; sem ter de carregar lembranças ou acompanhantes; esquecendo de vez as dívidas na mercearia de seu João e a namoradinha daquele meu colega de trabalho. 
Do alto das paredes vem o aviso da partida. Embarco feliz em deixar esta terra e seus vícios.
Só duas coisas me chateiam: ontem não apareceu um só condenado para pagar a cervejada do adeus e tampouco consegui reaver meu CD do Pink Floyd que emprestei para o supervisor da loja.

quinta-feira, julho 22, 2004

Claudio Moura e uma Noite Latina no Espaço Multicultural do Sesc Roraima.  Sexta, 23 de julho, às 21h30.
No repertório: Galería Caribe; playas; botellas de ron; Cuba; sol y luna; México; orgullo latino; América española; Maná; pasado, presente  y futuro; mariposas traicioneras; recuerdos;  tercer mundo; metáforas perfectas; Chávez; Plano Colombia; los Llanos; caballo viejo; Simón Diaz; amores eternos; Ricardo Arjona; nuevos tiempos, nuevas alegrías; ciudades pequeñas; añoranza; citas con Díos; Venezuela; milagros y santerías; café; Pablo Milanes; vida; rumba e sabor.

segunda-feira, julho 19, 2004

Eleições limpas, sindicato limpo
 
Como entender que no último dia para pagar as três últimas mensalidades do Sinjoper (Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de Roraima), um grupo com 3 mil reais nas mãos, conforme admitido por um dos integrantes da turma em outro blog,  tenha bancado as contas de uma pá de coleguinhas,  habilitando-os a participar da próxima eleição da entidade?
Como explicar que várias das pessoas que tiveram as contas pagas sequer sabiam da quitação? Como explicar que tudo isso tenha sido feito em nome da necessidade de trocar a atual diretoria do sindicato por uma diretoria forte e independente?
A próxima eleição para o Sinjoper parece refletir velhos hábitos da política partidária brasileira. Hábitos, vale lembrar, rotineiramente combatidos na teoria, mas parece que agora aceitos como válidos na prática sindical.
Arrecadar dinheiro sabe-se lá onde para bancar as mensalidades atrasadas de filiados ao sindicato e habilitá-los a participar do processo eleitoral é o mesmo que trocar voto por dinheiro, no mais puro estilo coronelista, um dos costumes mais arcaicos do país.
Não é assim que se muda o perfil do sindicato de uma categoria que gosta de se apresentar como a porta-voz dos anseios da sociedade. Não é assim que se fortalece uma categoria. Não é assim que se conquista dignidade e justiça no mercado de trabalho.
Nesta terça-feira, às 20 horas, na videoteca do Palácio da Cultura, realiza-se uma assembléia do Sinjoper.  É um bom momento para discutir, mesmo que fora da pauta oficial, o que significa ética, compromisso e defesa dos direitos dos jornalistas.
Iniciamos a Série Contradições Impressas
 
DÍVIDA MILIONÁRIA-  União cobra R$ 4 bilhões de aposentado (Folha de Boa Vista 14.07.04)

O aposentado Antonio Evangelista de Oliveira, 78, virou notícia nacional ao ser acusado de estar devendo R$ 4 bilhões aos cofres da União. Ele disse não entender o porquê do valor exorbitante cobrado atualmente por uma dívida contraída em 1988, ocasião em que a moeda circulante ainda era o Cruzado. (...)
 
 
 
Receita Federal - Aposentado de Roraima deve mais de R$ 3 milhões (BrasilNorte 14.07.04)

A dívida, que passa hoje de R$ 3 milhões, foi contraída por causa de um empréstimo de dois salários mínimos.

Como poderia um aposentado de 71 anos, ganhando um salário mínimo por mês, acumular uma dívida na Receita Federal de R$ 3.390.000,00, já inscrita na Dívida Ativa da União? Esta é a história inusitada de Antônia Evangelista de Oliveira, que mora em Boa Vista? (...)
 
 
 
COBRANÇA DE R$ 4 BILHÕES -  Procuradoria reconhece valor exorbitante da dívida e suspende cobrança de agricultor (Folha de Boa Vista 15.07.04)

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional decidiu que a cobrança do gigantesco débito de R$ 4 bilhões do aposentado Antonio Evangelista de Oliveira, 71, com os cofres públicos está suspensa até que o processo de verificação da origem e dos cálculos do valor seja concluído. (...)
 
Delegado diz que dívida de aposentado não é com a Receita Federal (BrasilNorte 15.07.04)

O delegado substituto da Receita Federal, Roberto Paulo da Silva Santos, disse ontem que a dívida do aposentado Antonio Evangelista de Oliveira, 71 anos, o ?Marreco? como é conhecido, não é com a Receita. Os R$  mais de 3 bilhões são devidos pelo aposentado à Procuradoria da Fazenda Nacional. (...)
 
mudando de assunto....
A próxima eleição para o Sindicato dos Jornalistas de Roraima já ganhou seu primeiro capítulo negro, com um suposto pagamento de mensalidades atrasadas de uma pá de coleguinhas por um grupo aparentemente disposto a tudo para ganhar. Mais detalhes aqui.

sexta-feira, julho 16, 2004

Salsa e ciúmes


 
Uma da manhã. A pista está cheia na boate mais animada da cidade. É sempre assim na quinta-feira, quando é noite de salsa, merengue e caribe. Suor escorre da maioria dos rostos. Homens e mulheres, mulheres e homens, todos exibem-se para todos.

No balcão do bar, Ricardo e Drica discutem. Ele está cansado e ela quer mais. Ele quer ir embora para dormir, acordar cedo e ir trabalhar. Para ela, que também trabalha daqui a pouco, o final de semana o momento ideal para descansar. "A noite não espera para acabar e o trabalho sempre estará lá quando o procures", afirma a jovem.

Do outro lado da pista, Alberto mexe-se desajeitadamente ao som do mais novo sucesso de  Gilberto Santa Rosa. Alberto não dança uma vírgula, mas gosta de freqüentar a boate para ver as apresentações dos bailarinos profissionais à meia-noite. Depois, sempre fica mais um pouco para tentar descobrir alguma mulher sem par, coisa das mais difíceis na boate, e sem esperança de encontrar alguém melhor que Alberto para dançar.

Mas hoje a noite parece ser muito ruim. Nem sequer Ana Rita, sua amiga e eterna salvação na dança apareceu. Deve ser por conta do namorado novo, pensa o aprendiz de dançarino enquanto se dirige ao bar para comprar uma bebida e ir embora.

Lá, surpreende-se ao encontrar Ricardo e Drica, seus monitores na escola de dança que começou a freqüentar na terça-feira passada. "Olá, como vão, gostei do espetáculo. Um dia chego lá", brinca. Percebe que o clima não é dos melhores, pede sua bebida e quando vai dizer adeus, estendendo a mão para o casal, Drica aproveita a deixa e o puxa para dançar. A bebida Drica põe na mão do atônito Ricardo enquanto o olha desafiadora.

Na pista cheia de bons dançarinos, Alberto usa tudo o que aprendeu na única aula de salsa e merengue que teve na vida. Drica diverte-se com o esforço e ri, linda, divinamente, enquanto seus cabelos lisos e negros grudam na pele morena e seus olhos parecem refletir toda a luz da boate. 

Mas uma noite assim não pode terminar bem. Ricardo, o sonolento bailarino que durante o dia é bancário, também acumula conhecimentos de boxe para ocasiões como esta. Na sua opinião, Alberto merece uma lição não de salsa e sim de ringue. Começa a atravessar a pista para iniciar a aula enquanto, alheio ao risco que corre, o futuro aprendiz de luta empolga­-se com o bailado de Drica e começa a apertá-no ritmo certo, puxando para um lado e para outro, do jeitinho que ela ensinou. 

A três passos do casal, o celular de Ricardo, o violento, toca. É a mãe de sua namorada, perguntando a que horas vão chegar. Afinal, ela tem de ir trabalhar cedo. "É tua mãe", diz, cavernoso. "Oi, mãe. Meu celular? Acho que ficou dentro do carro. Está bem, sei que é tarde. Vou agora. Beijos. Bem, Alberto, valeu pela dança. A gente se vê na próxima aula. E continua praticando. Você esteve ótimo", fala a moça para o rapaz, antes de beijar-lhe a face, pegar a mão do namorado e caminhar para a porta da boate.

Na pista, Alberto, só e ligeiramente menos desajeitado, continua balançando-se, desta vez ao  som de um antigo sucesso de Tito Rojas. "A noite não fui tão ruim assim", acredita, "e ainda bem que o professor não levou a mal nem ficou com ciúme. Ele é gente boa". 
 
 

terça-feira, julho 13, 2004

O cronista

Jornalista metido a cronista, com aspirações de ser poeta. Radicado em Boa Vista - Roraima (RR) Especialista em Comunicação Social e Novas Tecnologias. Sociólogo. Professor universitário. Pai. Autor do livro digital Roraima Blues e colaborador da revista de micronarrativas Minguante. Integrante do Coletivo Arteliteratura Caimbé. Se quiser trocar idéias fora dos comentários, escreve para edgarjfborges@gmail.com.

quinta-feira, julho 08, 2004

Solidão é um estado de espírito?,pergunta o discípulo ao mestre tibetano.
O ancião responde: solidão é estar sem nada para fazer no sábado à noite e receber duas ligações perguntando o número de telefone de outras pessoas que ainda não chegaram à festa.