sexta-feira, maio 01, 2020

Diário da Covid-19: oferendas, promessas de chuva e mais mortes pelo coronavírus em Roraima

Domingo, 26.04

O passarinho continua na mesma posição há quase uma semana. Só penso na sede e na fome que deve estar passando.

Cheguei aos seis quilômetros e não tropecei com ninguém nas ruas. Agora quero 6,5 km.

Metas são engraçadas. Parei de traçar a sério as metas há anos. As anotava e não cumpria pq outras coisas apareciam e as solapavam. Vamos levando. Não se chega a lugar nenhum, mas também não há dramas por isso.

Metas na quarentena: tirando correr, não tenho, não quero, não sou obrigado. O papo coach de mantenha o foco na produtividade me cansa. Se fosse mantenha o foco na criatividade talvez fosse melhor.

Cedasso li no grupo dos jornalistas que morreu mais pessoa em decorrência da Covid -19. Logo hoje que acordei pensando que talvez fosse bom a gente retomar a vida. Paramos tudo em casa no que se trata de continuar mexendo na eterna reforma. Nas últimas semanas queimaram um ventilador e um chuveiro. Não queremos chamar nem levar para evitar riscos. Estamos cansados mentalmente já. O bom é que não brigamos por isso.


O Rui falou no Facebook sobre o senhor que morreu. Na quarta foi no Palácio do governo trabalhar, no sábado deu entrada no HGR e morreu em poucas horas. Só penso no choque pra família. De uma hora para outra nessa condição.

A Isadora me mandou um lindo texto dela no wpp. Uma crônica de esperança na passagem segura pela pandemia misturada com histórias sobre suas filhas. Eu gosto dos textos dela. O dia que for a Belém vou comprar um livro de sua autoria e pedir o autógrafo enquanto tomamos um açaí.

Segunda, 27.04.

Passamos a tarde ontem no escritório, Zanny desmontando as caixas que o entulhavam desde que voltamos para casa. Eu, fiscalizando para saber onde ia colocar o que tirasse delas. Podia não parecer, mas havia uma ordem no caos. Balu nos acompanhou fielmente. Ou acompanhou o ar condicionado, nunca sabemos.

Hoje não tem corridinha, tem varridinha e passada de pano na casa. É tipo fazer remada. No final, saio esgotado.

Troca de stickers com a Adenice. Me divirto. É ela e a Cláudia para aumentar meu arquivo. E a Mirella.

O passarinho sumiu. Não está no chão, não está nos galhos abaixo. Será que o gavião pegou ou conseguiu voar? Acho que deve ter sido o gavião. Tantos dias parado...de onde ia tirar forças para voar?

Lembramos hoje dos planos que tínhamos para o Edgarzinho no mês passado, logo após os novos exames médicos de alergia: aulas de natação, aulas de inglês, aulas de desenho. Aí veio a pandemia, aí veio o isolamento, aí se foram os planos para segundo plano.

Hoje acordei cansado de ficar em casa novamente. Porque tirando a corrida solitária não vamos a lugar algum (ou nenhum, sei lá). E então, vendo os status da Sâmia, vejo que a imprensa mundial aponta que o Brasil pode ser novo epicentro mundial da covid-19...Dá umas tristezas...

Cansaço. Durmo. Almoço. Trabalho. Tarde quente. No grupo dos jornalistas chega a notícia de que o prefeito de Rorainópolis quer pedir na Justiça Federal que fechem a BR-174, impedindo a passagem de carros pequenos. Parece que os casos na cidade estão sendo importados do Amazonas. Há uma ironia nisso: sempre falaram que as correntes na terra indígena Waimiri Atroari seriam (uma entre muitas, de acordo com o momento) as causas do não desenvolvimento de Roraima. Agora podem ser a salvação.

Venezuelanos estão sendo transferidos para o hospital de campanha que foi montado para reforçar o atendimento na pandemia. O hospital, entretanto, "não possui data para funcionar por falta de equipamentos e profissionais". Que bosta de estado é este que demora tanto para se preparar para as coisas mas sempre é rápido na hora de achar culpados para suas incompetências?


Terça, 28.04

O passarinho voltou! Peguei um susto quando olhei, por força do hábito, para o galho e o vi, mofino como sempre. Contei pra Zanny e ela me disse que o nome dele é Osvaldo (não sei se com V ou W), de acordo com o Edgarzinho.


Osvaldo voltou ao seu galho

Metas de exercícios: aumentar uma flexão por semana. Agora estou em 3 x 16. Estou orgulhoso de meu combate ao sedentarismo Quando acabar o período de distanciamento em quanto estarei?

Eu não sei que horas acordei de tão cedo que foi, mas foi cedo que olhei o relógio: 4h40. Bom para evitar gente nas ruas. Quando estava na corrida vi que fizeram ofertas de novo na avenida de barro. Exatamente o mesmo da outra vez e no mesmo local: três carteiras de cigarro até o talo de estouradas, três latas de cerveja e duas garrafas de ice vodka. Essa parte eu não entendi. Um dos entes do além não bebe destilado (se forem três entes) ou é um só e não aguenta misturar muito? O que será que a(s) pessoa(s) pede(m)?


Oferendas no Paraviana. Ah, se eu fumasse...
Quis fazer algo do artigo e descobri que perdi as anotações digitais que fiz dia desses. Tive que ler tudo de novo para lembrar o que havia decidido acrescentar.

O governo do estado disse que não vai fornecer dados detalhados diariamente sobre os casos de covid-19 em Roraima. Só o básico. Aí, uma vez por semana vai liberar mais informações.

Passamos da China nos casos oficiais de mortos pela Covid-19. São 5.017 falecimentos agora. Triste recorde. Roraima aparece com seis mortes. E não falemos em subnotificações.

"E daí?".
Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, em 28.04.2020, sobre os 5.017 mortos por covid-19 no Brasil (conforme dados oficiais).



Quarta, 29.04

Vamos cedo para o Atacadão comprar coisas de higiene, principalmente. No caminho até lá, vemos lojas fechadas, mas lembramos que ainda não são oito horas. Vemos muitas abrindo e outras já abertas e lembramos que o comércio está praticamente todo liberado para funcionamento.

Vemos aglomerações de migrantes venezuelanos em uma área comercial na frente da rodoviária. Muita gente. Vemos os trabalhadores da construção ao lado de um igarapé na avenida Brasil em sua labuta e sem máscaras para proteger-se. Vemos na frente do abrigo Rondon ao lado da Polícia Federal aglomeração na porta de entrada....

Chegamos no Atacadão e já tem gente fazendo compras. Não fomos os únicos a pensar em evitar os horários de pico. Tem álcool em gel na entrada, muitos funcionários de máscara, mas alguns sem. Destacam-se por isso.

Vemos quase toda a clientela de máscara. Há exceções, a maioria homens. É cômico isso: casais em que só um se protege. Vemos um sujeito de uns 60 anos, com a cabeça toda branca, fazendo suas compras como se não houvesse nada de anormal nisso. E o pior é que nos tropeçamos em vários corredores.

Tem uma hora em que usar a máscara incomoda. Começa a doer a orelha. Nunca é rápido fazer compras no Atacadão. Enchemos o carrinho, pagamos, os caixas tem uma proteção de acrílico que os isola dos clientes. Bom para eles. Só queremos voltar daqui a dois meses aqui. Na saída, lembramos do tempo em que saíamos e abríamos um chocolate com a mão suja mesmo e comíamos felizes pela sensação de tarefa cumprida. Bons tempos em que só tínhamos medo de bactérias e dor de barriga.

Na volta, vemos a Guarda Municipal conversando com os migrantes no local onde estavam aglomerados na frente da rodoviária. Penso: tomara que ninguém adoeça desse grupo.

Chegamos em casa, limpamos todos os itens da compra, tomamos banho do lado de fora, já deixamos lavada a roupa. Saudades do tempo em que era só chegar e, no máximo, tirar os sapatos antes de entrar em casa.


Osvaldo no galho


Quinta, 30.04


Tem dias que são cópias de outros dias que já copiaram outro dias. Algo do tipo:
Acorda no escuro/acorda no meio claro.
Procura pelo Balu/Balu já está no pé da cama.
Osvaldo está no galho/ Osvaldo finalmente voou
Faz chá/ faz chá e café
Navega nas redes sociais, come e corre/Fica em casa
Mexe no notebook e no celular/ mexe no celular
Come, cochila/Come, entra direto no trabalho remoto
Se irrita com o trabalho/acha bacana ter o que fazer
Faz planos de produzir algum vídeo/não produz/nem pensa nisso
Estuda no app de inglês/faz vídeochamada pra mamãe/lê na rede/lê na cadeira de balanço
Vê um filme ou um episódio de série por inteiro/quase durmo no meio do vídeo
Dorme/acorda cedo/checa se o Osvaldo tá no galho/Pensa em quebrar a rotina/Deixa pra lá tudo e se conforma.

A quinta prometeu chuvas, mas foi só ventania e depois calor novamente

Sexta, 01.05.2020
Osvaldo, o pássaro meditador, alçou voo. Será que amanhã ele aparece de novo no galho?

Hoje é feriado. Nunca antes os feriados foram tão inúteis. Ou talvez sejam bons ainda: não ser obrigado a ficar na frente do computador por conta do trabalho remoto também é relaxante como um feriado em tempos sem pandemia.

Manhã: pesquiso referências para o artigo, Zanny organiza as compras em caixas, Edgarzinho joga no celular e vê programas de auditório e seus mistérios narrativos que prendem a atenção, dona Alba faz palavra cruzada.

Tarde de muito calor e algumas nuvens de chuva no céu. Desde ontem isso: apenas promessas e nada de água.

Começa a noite e Osvaldo não voltou. Chuvisca um pouco e abafa ainda mais.

O Ministério da Saúde divulga: agora são oito óbitos por Covid-19 em Roraima. No começo da semana eram quatro. No Brasil, são 3.629 falecimentos registrados nos dados oficiais.

Chegam os vídeos: enfermeiros protestavam em Brasília pedindo melhores condições de trabalho e fanáticos bolsonaristas, vestidos com roupas amarelas e bandeiras do Brasil, começaram a xingá-los e empurrá-los. A loucura desse povo é algo surreal.

Na internet, o dia foi de ataques à deputada Joice Hasselmann. O gabinete do ódio não perdoa. Por outro lado, ela sabia no que estava se metendo quando se juntou com essa turma. Queimem juntos.

Mandei o que pude para Leila ver. Conversamos um pouco. Anda como eu: entre o riso desesperado e o cansaço desta situação sanitária-política.


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Este é o sétimo registro dos meus dias de quarentena e distanciamento social durante a pandemia da covid-19. Tem outras postagens aqui.

Se você também está escrevendo sobre isso, deixa o link nos comentários que quero saber dos teus dias.

sábado, abril 25, 2020

Diário da Covid-19: pássaros meditando e já são mais de 40 dias na quarentena

Sábado, 18/4

Ambicioso, corri 5,5 km. Quero chegar aos seis. 

Temeroso, vou mudar minha rota dos quilômetros finais. Para fechar essa distância estou entrando nas ruas com casas e gente caminhando ou pedalando. Vou me jogar na direção do rio. Tem pedras soltas, a volta é toda subindo, mas não tem risco de aspirar o Coronavírus de ninguém. 

Ontem,  pela primeira vez na vida, participei de uma vídeo conferência. Foi para cantar parabéns ao Rodrigo, no RJ. Tinha gente de toda parte na sala. Parecia festa presencial mesmo. 

Edgarzinho acordou chorando, com saudades da irmã, que está em Brasília. Deu uma pena do bichinho... Zanny me contou depois que ontem ficaram de madrugada conversando um tempão. Saudade em tempos de covid-19.

Leitura de contos: 



A Cyneida postou no facebook as escalada dos casos confirmados oficialmente (sempre bom falar "oficialmente" para não achar que é só isso) e eu compartilhei, pedido que a galera ficasse em casa o máximo que pudesse.  Como tinha uma charge de vários coronavírus dando a faixa de melhor funcionário do mês ao Bolsonora, o Marlen não se conteve e veio defender a honra do presidente, dizendo que os midiavírus e os esquerdavírus estavam tentado derrubá-lo blá blá blá. Oh, Marlen... que dó dessa cegueira...

Ainda no facebook: havia recebido semana passada um pedido de amizade de um cara publicitário  que já foi apresentador de programas de TV. Vi em seu perifl que virou cantor gospel, fã de deus, com canal e tal. Aceite. Depois vi que se declara apoiador do Bozo. Desfiz a amizade virtual. Não sou obrigado a lidar com gente que nunca aprendeu a interpretar o Novo Testamento. 

Ainda no Facebook (e já pensando em parar de ver postagens nele): o Nei, meu primeiro editor, se declarou ontem fã do Bozo também e diz que há uma campanha contra ele por cometer muito sincericídio.. Oh, Nei... essas companhias com quem tu anda. Essas leituras tortas...

Final da tarde: cavamos buracos para replantar arvores frutíferas. 

Noite: ameaça chover, chuvisca, venta forte e eu escrevo, gravo, edito e publico um poema no youtube. Depois vou assistir a um documentário no History Channel: O Mundo Sem Ninguém - América Latina. 

Domingo, 19.04

Amanhece bem mais frio que ontem. Faço os comentários no texto do Rodrigo e devolvo seu material. Ouço jazz, a melhor música para escrever. Ócio. Almoço. Cochilo. Replantio de ipê e uma ciriguela no quintal da frente. Tomatinhos e goiabeira no quintal de trás. Tentativa de caminhar. Chuvisco.  Retorno pela metade. A visão: muita gente vindo do rumo do balneário Curupira. 

O povo lá na sala vendo a live do Roberto Carlos. O ano acabou e não notamos.


O gado foi pra rua hoje pedir golpe militar,  fim da quarentena e Deus acima de todos



Segunda, 20/05

5h10. Levantei empolgado (não confundir com levantei rapidamente). A ideia era fazer bem cedinho minha corridinha. Uns 5,7 km, rumo aos 6km. Tudo escuro. No banheiro, vento frio entra pela janela. Vamos nessa, exercitar para não surtar. Abro a porta da cozinha e bah: está garoando, chão molhado, isso não vai parar tão cedo e não tem meta que valha uma gripe em tempos de coronavírus.

Acabou a tapioca e o queijo, acabou meu café da manhã. Vou ter que sair para o super, ver gente, passar pelo risco da contaminação. Que agonia. Não vou, não.

Não são nem seis horas e já vi no grupo dos jornalistas gente compartilhando vídeos de gente que apoia a volta da ditadura. Na verdade, não abri o vídeo porque me dá preguiça abrir vídeos, mas a Cyneida veio logo abaixo descendo a ripa em estava fazendo isso e dizendo que jornalista compactuar com quem atenta contra a democracia é uma vergonha. Fadinha sensata. O outro lá, um idiota .

7h10 fui tentar correr. O céu abriu e decidi não perder a chance, mas parece que choveu mais do que havia pensado. A avenida de barro já bloqueou a passagem lá encima. Não tem como atravessar essas poças sem meter o pé na água (exatamente o que aconteceu com um homem que tentou atravessar de bicicleta, atolou e, para não cair,  teve que botar o pé no meio da lama).



Voltei, tentei fazer a rota rumo ao rio, mas também já criou poças de lama em todo lugar. Tenho que criar outro trecho em que não haja gente circulando. 

Depois de muitoooos anos organizamos um álbum de fotografias do Edgarzinho. Da barriga da mãe até seus três, quatro anos de idade. No embalo, achei umas fotos que havia mandado imprimir para meus álbuns:

2008, Edgarzinho tinha dois meses de vida

2008, almoçando com os jornalistas Luiz Valério e Tana Halu

Talvez 2009, tendo conversas místicas no Beto Carrero World  
Talvez 2009, mostrando o peitinho sexy em Floripa


Com Jonas Banhos, da Barca das Letras, em Brasília. 2009-2010

20h44. Pedimos e comemos  pizza,  está chovendo muito, um cabo de fibra ótica rompeu e muita gente está sem wi-fi. Vi nas redes o meme do bolsonaro fazendo sexo oral no pau invisível do mercado, li que hoje ele disse que não é coveiro para ficar comentando as mortes pela covid-19. Li no Twitter várias pessoas comentando que teria dito também ser ele a constituição do Brasil. Narcisista genocida. 

Bolsonoristas fizeram memes mais ofensivos e o povo ria que só, apenas para lembrar

Chove e eu não lembro mais quando foi a última vez que peguei o carro para ir a algum lugar que não fosse um supermercado. 

Terça, 21/04

É feriado na quarentena. Dia de novamente ficar em casa de mansinho.

Converso desde ontem um tantão com Marilena sobre jornalismo, jornalistas, orientações políticas e posicionamentos ideológicos. Converso um tanto também com a Vanessa, mas sobre literatura e abordagens do personagem. Igualmente falando sobre livros, Rodrigo me confirma ter recebido o e-mail com minhas notas sobre seu romance. 

Arrumei o álbum de fotos de uma viagem que fiz a Floripa há uns 10 anos. Não toquei no computador para nada, até porque nada havia de internet para tocar de manhã. 

Terminei de ler os contos do livro Faca e fui ler um encadernado do Conan. Cérebro trabalhando (ou fugindo).



Pensei em correr de noite, mas...naaaa. Não tenho força mental para isso ainda. 

Mais um dia de chamada de vídeo para falar com a minha mãe. Parece que vivemos em outro país. 

Só assim que a gente se vê agora


Quarta,  22.04.

Acordo antes dos pássaros, faço uma rota nova de corrida, passo pano na casa, troco mensagens e emails de trabalho muito antes do meu horário normal, muito antes do horário normal dos outros. Penso nas pessoas que vi chegarem às 7h nas obras aqui do bairro, os riscos que estão  passando se não usarem EPIs, penso em como estou privilegiado por poder teletrabalhar em casa. 

Meu sentimento de culpa judaica-cristã por esse pseudoprivilégio esmorece quando o Greick joga no grupo do trampo que há planos de não pagarem os nossos reajustes devidos nos próximos dois anos. Que venha a inflação comendo tudo. Que paguemos nós, o elo mais fraco do executivo, a conta do governo.  Que os bancos e todo o sistema financeiro sejam poupados, amém. 

Descobri que a Raphaela também tá fazendo um diário de quarentena. O dela se chama Diário de uma Ansiosa e esta semana estava já segundo capítulo.

Manaus está um caos e já começaram a fazer valas comuns por lá para acelerar o enterro do pessoal. 



No trabalho teve novidade, com a turma agora tendo que gravar matérias para a rádio. Então, pela primeira vez na vida, mexi com isso. Foi até legal. Só gostaria de ter sido avisado que íamos começar a atuar nessa área. 

Tô pegando bomba no meu curso de inglês. Errei ontem e hoje muitas vezes o lance de colocar o S nos verbos e fiquei sem vidas. Mas agora acho que entendi. Amanhã não me pegam, espero.

Quinta, 23.04.

6h. Tem quatro pássaros de três espécies no abacateiro. Um deles está desde terça no mesmo lugar, todo mofino. E não tem como a gente chegar lá.

A gente bate palma e grita e ele se mexe de leve. Não está mumificado pelo sol ainda, mas até quando resistirá?

Tem dias em que me sinto vazio.

11h23. O passarinho está vivo e não mumificado, como achávamos. Mas não se move. 

20h22. O passarinho ainda está lá, vivo e imóvel. 

O coronavírus segue sua jornada assassina no Brasil e as autoridades liberando um monte de coisa para o povo se aglomere mais. 



Em Brasília, Moro ia deixar o ministério, mas acabou ficando. 

No grupo da família compartilharam um meme desses do gabinete do ódio dizendo que foi só o ministro novo assumir e os casos já quase negativado. Tive que printar os dados do próprio ministério e reforçar o óbvio:

Não se confiem dessas imagens que o povo do bolsonaro manda fazer. Tenham cuidado. Não tem caso caindo,  não é invenção da mídia e não vai ter respirador para todos. Em uma pesquisa rápida dá para saberem quantas enganações os caras inventam e compartilham em memes como este.

Sexta, 24.05

Sextou em Brasília. Sérgio Moro pediu demissão do Ministério da Justiça de manhã e falou um monte do Bolsonaro. De tarde foi o Bolsonaro que falou um monte dele. Da fala do Bozo, fiz uma "cobertura" comentada no twitter, acompanhei outras, vi uma cacetada de memes durante todo o dia, ri dos seguidores do bolsonazi dizendo traídos e findei a tarde pensando: briguem, moder focas, briguem. 

Agora, algo mais próximo: o passarinho continua no mesmo galho há dias. Não se mexe para nada, mas continua vivo. Achamos que pode ser um tipo de pássaro Gandhi ou pássaro Buda em estado de meditação plena. 

O dólar bateu na casa dos R$ 6,91 nas casas de câmbio de São Paulo. 

Eu, nos stories lembrando que o Bozo taí em boa parte graças aos isentões e aos que disseram que estavam votando pela recuperação da economia

O coronavírus continuou na ativa, mas ficou ofuscado hoje pela briga de casal Moro-Bolso.

O Moro não foge ao seu hábito e liberou material para o Jornal Nacional mostrando que o Bolsonaro queria mesmo um novo chefe para a Polícia Federal para poder controlar as investigações. E também mostrou um print de sua afilhada de casamento pedindo-lhe paciência até o final do ano, quando viraria ministro do STF. Briguem, moder focas, briguem.

Teve muto meme hoje. Acho digno deixar alguns aqui para rir nos anos vindouros (tão bonito escrever "vindouros"): 

Este eu compartilhei no FB

Essa frase é minha




Meu conselho, vendo a coragem do povo em demostrar sua burrice e vendo alguns fanáticos emputecidos com os supostos movidos da saída do Moro 




Sou pessimista. Nada vai melhorar. Preparem os bolsos e corações 

Hoje fui atrás de saber há quanto tempo estamos em quarentena. Na primeira edição deste diário da Covid-19 vi que no dia 16.03 o Edgarzinho foi liberado das aulas e que dia 20.03 foi quando comecei no teletrabalho. Ou seja, faz quase 40 dias que meu filho não sai para canto nenhum e que eu não vejo a minha mãe pessoalmente. 

No grupo dos jornalistas aparecem os passadores de pano do bozo, justificando a troca do delegado geral e do ministro e ignorando as alegações de interferência. Pior raça, essa a dos passadores de pano da extrema direita. 

Sábado, 25.05.

Acho que fui dormir antes das 22h ontem. No começo do filme novo do ator que faz o Thor já estava perdendo cenas inteiras entre um piscar e outro. Resultado: cochilei e meia-noite acordei disposto que só, mas consegui dormir de novo. Aí às 4h estava tentando dormir na rede da varanda. Não consegui e lá pelas 5h decidi fazer o café da manhã. O gás acabou. Agora tenho que esperar até sete para fazer o pedido e estou morrendo de vontade de tomar alguma bebida quente. 

O passarinho continua no galho.

O gás chegou. São quase 8h. Finalmente posso fazer café ou chá e só porque não tem nada na geladeira e as compras que fizemos ontem pelo celular só chegam mais tarde.


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Este é o sexto registro dos meus dias de quarentena e distanciamento social durante a pandemia da covid-19. Tem outras postagens aqui.

Se você também está escrevendo sobre isso, deixa o link nos comentários que quero saber dos teus dias.

quarta-feira, abril 22, 2020

Noite de inverno - um vídeo poema

No sábado passado ventou forte e chuviscou. Avisos do inverno, pensei. Sentado na varanda de trás, escrevi, gravei, editei e carreguei o poema no youtube enquanto via as plantinhas balançarem.

Assiste e se gostar, curte o vídeo e se inscreve no canal para me estimular a continuar produzindo webliteratura em Roraima.

sexta-feira, abril 17, 2020

Diário da covid-19: em que dia estamos e até quando estaremos?

Sábado, 11/4

Irritado de tanto ver jornalistas entrando na onda do conspiracionismo em relação à covid-9, ontem à noite postei um texto no facebook. Estava meio de cabeça quente e acabei por chamar o povo de burro, mas foi sem querer querendo. Aí, o Marlen começou a falar de que não podia xingar o bolsoniro e acabamos dando uma volta ao mundo e fugindo do tema. Nisso ficamos um tempão. 

Uma das primeiras coisas que li hoje foi este texto do Leonardo Sakamoto sobre o discurso negacionista e como os caras fazem com que se torne um vírus: adaptável a qualquer situação. Tudo para dificultar o combate ao coronavírus e garantir a narrativa do bozo.

O que mais me chamou a atenção, entretanto, foi a parte em que ele fala sobre as expectativas de muita gente que acredita ser esta pandemia o momento de uma melhoria como humanidade. Muitos conhecidos apostam nisso. Eu estou com os dois pés atrás.

A manhã está lenta, não há muito o que fazer e fico nas redes sociais navegando. O lance de ficar passeando muito no Facebook é que a gente vê como algumas pessoas ficaram tapadas com o passar do tempo. Uma coisa que sempre aparece é a criminalização do que se poderia chamar de ideologia. A primeira vez que vi isso foi antes da eleição, quando o Márcio, antigo colega de escola que depois virou militar do Exército e seguidor fervoroso de alguma igreja evangélica qualquer, veio dizer que as ideologias faziam mal ao país e que o Bolsonaro estava acima delas, blá, blá,blá. Na época, achei apenas que fosse idiotice de quem nunca parou para pesquisar sobre o conceito, mas o lance é forte. Os caras trabalham uma narrativa afirmando que ideologia é ruim, que eles não são ideólogos e por isso atuam pelo bem do país, que defender algo que discorde do pensamento necropolítico deles é ideologia... Ou seja, são ideólogos, pero no mucho pois não se assumem mesmo sendo. Quem ganha uma discussão racional com gente tapada assim? Povo burro do caraio. Nunca leram nada além das correntes de whastapp e ficam pagando de sábios. 

Estou irritado. Vou aproveitar e passar pano na casa para ficar cansado e não pensar nas idiotices que escrevem. 

Tarde: as horas se arrastam.

Domingo, 12/4

7h25. Acabo de desistir de ir correr. Céu tá lindo, nublado, tá ventando gostosin e friozin. Na minha justificativa mental digo que esta semana fui umas cinco vezes correr e que mesmo tendo atingido só parte da quilometragem-meta em várias ocasiões, tá valendo. Balu me olha como se pensasse "E aí, vai correr ou dormir?". Zanny fez uma poda violenta nele ontem. Eu tô pensando em meu cabelo crescendo nas laterais e o risco que é ir num cabelereiro. 
(Cabelereiro é uma palavra engraçada de escrever. Só acerto com o corretor)


O olhar da cobrança


8h40. Terminei de capinar a frente da casa. Ou seja, hoje o exercício foi pros membros superiores. 
Dia de grandes descobertas sobre pequeninos heróis 

Zanny disse que ontem tava tendo festa no vizinho de trás, com direito a luz especial rebatendo nos muros e gente falando a toda hora no microfone. Eu tava desconfiando desde cedo, mas achei que fosse uma live sertaneja plugada na caixa de som ou um disco ao vivo, não aglomeração. Vivemos num dos bairros que está com a maior quantidade de casos da covid-19 em Boa Vista. Fazer festinha porque o mundo não pode parar é muita irresponsabilidade.

Noite: avanço cada vez mais no meu curso de inglês no Duolingo. O Freddy é professor de inglês na vida real e disse que tá valendo depois de ter-lhe contado que aprendi algumas coisas que não sabia. Quando tudo voltar ao normal quero inscrever o Edgarzinho na escola dele. Aliás, saudades do tempo em que fazíamos planos para sair de casa e levar o moleque nas atividades. 


Segunda, 13/04

Corro e chego aos 4,8 km. O tempo não é o abaixo de 30 minutos que sonho, mas deixo pra lá. Agora me empolguei com a quilometragem e quero fechar 5 km. Conto pra Zanny que havia muitos anos não corria tanto na rua, tipo umas três décadas. Na esteira sim. Na esteira eu voava em...que ano era aquilo mesmo? 2000, 2001? Namorava a Lidiane ainda. Tava recém-formado, tinha pulado de 64 kg para 73, 74 kg em quatro ou cinco anos anos e parecia uma bolachinha com o joelho doendo de tanto carregar peso extra. Entrei na academia, dominei a esteira e puxava ferro de leve. Cheguei a 68 kg com índice de gordura bem baixo, padrão atleta. 

Talvez tenha sido minha melhor forma física de todos os tempos. Talvez não. Bom é agora: estava com 80 ano passado, agora estou com 72 e pouquinho e me achando magrão. Meu Eu de 2001 diria: vamos baixar daí que não quero usar calça número 40. O meu Eu de 2020 diz: poha, olha aí, baixou de 42 para 40. Tá bonito, heim?  Ou seja, até o peso absoluto é relativo.

Há quanto tempo começou o distanciamento social obrigatório?


Uma homenagem justa


Quente, tarde quente. Eu no trabalho remoto, Zanny e Edgarzinho na aula remota. 

113 casos confirmados em Roraima  e aumentando. Estudo aponta que nacionalmente  apenas 8% dos casos estão sendo registrados. Ainda tem gente berrando que é tudo mentira e uma grande armação. Agora tem mais gente pedindo para ficarem em casa e gente respondendo que "fica você,  privilegiad@". Meu deus...que agonia. Que vontade de chorar que bateu agora à noite. Que agonia...Eu só queria que todos os que amo (e até os que não) entendessem e ficassem mais quietos. Festas podem esperar. Aniversários se comemoram todo ano. Fica em casa, poha!




Terça, 14/4

Fui dormir antes das 23h, acordei não sei que horas. Sei que bem antes das 5h peguei no celular para ver as horas e às 5h17 levantei. Fiz a comida, corri, inicialmente sem vontade, vontade mesmo era de ficar sentado fazendo nada, mas fazer nada no meio de horas e horas em que nada se pode fazer dá agonia. Corri bonito, meio tarde, já mais 7h15 quando saí, sol quente. Fiz 5,1 km. A meta de distância foi atingida. Amanhã, se correr, quero aumentar. Quero 5,5 km, depois 6 km. Por um momento surto e penso "que tal 10 km?". 

Falei pelo direct com o Luciano Abreu. Ele tá com covid-19, a Helen perdeu o pai e os dois estão isolados em Manaus, terra onde não param de surgir casos de coronavírus. Roraima está com medo do Amazonas. A cada dia surgem rumores de ônibus de gente de lá vindo para cá se recuperar. Verdade ou mentira, o povo já tá assustado. 


Terminei de ler o livro de contos do Scliar. 
Avancei pela manhã no artigo prometido à Leila. Isso me deixa feliz. Também fiz um ou dois poemas ontem. 

Antes de avançar no artigo, fiz a bobagem de ver um vídeo no perfil dos Jornalistas Livres no IG e no final chorei como se tivesse sido uma história real comigo, como se tivesse sido minha avó. Bateu um pavor da velhinha morrer por conta da covid-19.. Agora mesmo, enquanto escrevo, meus olhos voltaram a marejar. Baixei o vídeo e mandei no grupo da família (que quase não tem ninguém, mas ainda assim tem esse nome). Reforcei o dito há semanas: não deixem o povo baladeiro dos rolezinhos e saídas desnecessárias chegar perto da dona Maria José. Fiz isso e continuei chorando, como se tivessem me respondendo que ela havia contraído a doença e falecido. 

Quem sobreviver ao coronavírus vai ter anos de problemas mentais. 

Quarta, 15/04

Não fui correr. Queria dormir, mas o Balu me acordou. 

O compositor Aldir Blanc, autor de músicas como o Bêbado e o equilibrista e a fodástica que não canso de ouvir Catavento e girassol foi diagnosticado  no Rio com suspeita de covid-19. Ontem à noite não tinham feito esse exame e a família estava desesperada pedindo doação na internet para conseguir interná-lo num hospital particular. Nos públicos não tinha vaga nas UTIs, mas com a confirmação abriram vaga nos leitos destinados a estes casos , pelo que entendi.

Detalhe 1: primeiro exemplo de artista que vejo sendo atingido pela superlotação das unidades de saúde.

 Detalhe 2: compositor, apontou alguém na web, é o elo mais pobre na indústria da música. 


Tive fome o dia todo e não tinha nada além de porcarias para beliscar


Fiz e mandei a versão 003 do artigo para a Leila. Quando ouço jazz consigo me concentrar melhor na ciência, lembrei esta semana. Foi ouvindo jazz que escrevi quase toda a dissertação. Apliquei para o artigo também. 

Li um artigo jornalístico muito bom sobre a rotina nos hospitais lotados de Nova Iorque durante a pandemia. Assustador o que o descaso das autoridades pode fazer em casos como o da covid-19. 

Chega a notícia de tarde: morreu o escritor Rubem Fonseca aos 94 anos, fruto de parada cardíaca. Eu tenho uns três livros dele e não sabia que era tão velhinho. 

Abril tá fogo com as artes: anteontem  morreu o Moraes Moreira. Fiz a minha forma de homenagem particular: fiquei horas ouvindo suas músicas (esse espécie de tributo comecei a fazer quando trabalhava na UERR ainda com o Timóteo. Acho que o primeiro tributo foi ao Emílio Santiago). 


Quintal, 16/4

Acordei 6h16, corri 5,25 km, li o começo dos originais de um livro do Rodrigo ambientado em Paris, fiz suco, descasquei batata, comi, cochilei, trabalhei pra caramba editando material da UFRR, falei com o Timóteo pelo hangout, escrevi o release do concurso literário que estou ajudando a organizar também na UFRR, pesquisei sobre como comprar comida sem sair de casa, vi que o presidente demitiu o ministro da saúde, comi cuscuz, li uns contos, fiz meu curso de inglês, liguei pra minha mãe e vi TV. 


Antes de correr, a cara da derrota. Depois superei


A vida se repete quase sem variações todos os dias. 

A vida se repete...

Pelo menos há vida para repetir. 


Sexta, 17/4 

Noite de insônia, noite de dor no joelho. Acordo, como, desisto de ir correr e Zanny vem dizendo que seria bom ir bem cedo no supermercado comprar as verduras, legumes e frutas que estão faltando já. A geladeira está só água e gelo. Vamos no Goiana Expresso, vejo que continuam com as portas fechadas e peço para falar com o gerente, que não chegou ainda, mas o fiscal sim. O menino não responde ao meu bom dia, o que já me irrita. Enquanto digo que tenho uma sugestão, que é a segunda vez que passo no local e vejo as portas laterais fechadas e bom seria abrir para entrar corrente de ar, o rapaz fica olhando para outro lugar. Alguns segundos após ter terminado minha fala, ele responde, laconicamente: "Ok, vou informar o gerente" e volta a jogar o seu olhar no vazio. Bicho...até entendo que o povo acorda cedo, que tá puto de estar ali correndo risco, mas pelo menos, sei lá, finge que tá ouvindo direito o freguês. Desde que comecei a trabalhar sempre fiz isso. Mesmo quando sabia que estava perdendo meu tempo. 

Enfim... Fomos e voltamos para casa e ainda não eram 8h da manhã, mas como havia movimento entre a Aparecida e nossa casa. Parece que é só no meu trecho de corrida que as pessoas dormem e não circulam. No restante, só agitação. 

Chegamos. Aquele estresse de lavar tudo, passar álcool em tudo, tomar cuidado com os lugares onde encostamos, lavar toda a roupa, as compras...

Termino de ler o projeto de livro do Rodrigo e lhe mando uma mensagem de feliz aniversário. Gosto desse carioca. 

Izaura, minha antiga colega de colegiado de Literatura, Livro e Leitura no Ministério da Cultura, me liga lá de Goiás. Quer fazer um sarau digital. Conversamos, pré-combinamos e vamos ver o que dá. 


Máscara digital que ganhei hoje. Me representa


Tarde quente que só. 

Teletrabalho em ação. 

Leio que o governo estadual cancelou a volta ao trabalho na próxima quarta. 

Leio que uma carrada de militares da Operação Acolhida está com coronavírus. 

Leio que foram registrados casos de crianças com a Covid-19 nos abrigos.  

Leio no facebook as postagens de um cara do rock que acredita mesmo que os médicos e cientistas (logo quem mais está penando neste momento para acabar com a pandemia) fizeram experimentos para matar pessoas em Manaus e assim argumentar que a cloroquina não é eficiente para tratar da doença. E que teriam publicado isso. Assim de simples. Masoquista, vou ler os comentários e vejo a turminha de sempre mugindo. 

Depois disso, vejo como fechou a semana: 




"Ah, mas isso aí mata menos que...ah, mas a cloroquina deu certo em..". Teu toba, seu adorador de mortes e integrante de manada. 



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Este é o quinto registro dos meus dias de quarentena e distanciamento social durante a pandemia da covid-19. Tem outras postagens aqui.

Se você também está escrevendo sobre isso, deixa o link nos comentários que quero saber dos teus dias.