terça-feira, setembro 06, 2005

Da deixa

Os dois estavam cansados. Haviam acabado de reencontrar-se depois de estarem muito tempo ausentes. Era o cheiro de um incrustando-se no outro, deixando suas marcas na pele, ampliando aquilo que Nelson Rodrigues chamou, com outras palavras, de nostalgia amorosa.

Aquela história havia começado assim, quase por acaso. Cheios de passado, não arriscavam dar-se totalmente. "Vá lá e a entrega vire uma arma mortal nas mãos desta figura", pensavam às escondidas.

Os cabelos da menina, cacheados, pretos e acariciados, grudavam na pele, como se fosse desleixo. Os olhos de ambos procuravam um tipo de verdade ? sempre faziam isso e nunca a achavam. "É incrível o tamanho do poço de mistérios cavado por uma pessoa sem que ninguém caia nele", lembravam ter lido em uma tabuleta pendurada na mureta de um bar. Costumavam repetir a frase durante conversas com seus amigos.

Era uma despedida. Ficara acordado: cada um procuraria o que fazer longe do outro. A cena era comum, pobre até, mas carregada de simbolismo. Dois corpos próximos pensando na distância.
"Do jeito que os relacionamentos terminam ou se estendem, as visões assumem tons surrealistas", filosofava o rapaz. A sua experiência, pouca mais válida, afirmava que sempre um dos que formam o romance desencanta-se e diz "tudo bem. Seremos bons amigos...". Entre parênteses e após as reticências, vem escrito em letras enormes: "talvez dentro de alguns anos!".

A menina lembrava de sua amiga mais querida. Ela sempre falava que quando há bom humor e um pouco de sordidez, rosas são enviadas aos alérgicos, acompanhadas de um cartão colorido, burlesco, com os seguintes dizeres em letras escandalosas: "lembranças de um passado inglório".
Não era este o caso deles. Casal jovem e bonito, decidiu acabar com o romance de uma maneira mais suave, como se fosse a queda de uma pétala, ato que não resulta em mágoas para a rosa ou para quem a admira. O motivo da deixa foi descoberto logo. Algo faltava entre os dois. Se era vivência, cumplicidade, sentimento, não conseguiram descobrir. Com pouco tempo para conversar sobre o futuro, só haviam achado espaço para debater o final de seu convívio.

Fora do quarto, a chuva caia. Por coincidência, tocava na rádio uma música antiga, dizendo "chove lá fora e aqui faz tanto frio...". Caras sérias, mãos tímidas, palavras pronunciadas suavemente. Parecia uma sessão inquisitorial, onde o juiz determina a morte do herege com total frieza, com a certeza de fazê-lo em nome de Deus e da moral. Se era assim, para que continuar?

Enquanto as lágrimas rolavam pelo rosto de um, o outro pensava como era possível gostar de alguém e não sentir a sua falta. Ele a puxou pelos braços e começou a beijá-la, com o mesmo desejo que um outro cantou: "venha me beijar, meu doce vampiro, à luz do luar...".

Tocaram-se, sentiram novamente o gosto do suor, disseram "até logo. Um dia a gente se cruza e comenta a nossa história, cheia de mentiras verdadeiras e verdades mentirosas".

sexta-feira, setembro 02, 2005

Outra foto






Tepequém, região onde se extraiu muito diamante em méados do século passado. Apesar da degradação, ainda há muita beleza a ser vista. Apareceu um domingo desses no Fantástico, no quadro Me Leva Brasil, ou coisa parecida.

quarta-feira, agosto 31, 2005

Uma foto
















À direita, o Monte Roraima, na fronteira tríplice Brasil, Venezuela e Guiana, lar da Macunaíma, deus dos índios macuxi. À esquerda, o monte Kukenan.




terça-feira, agosto 30, 2005

Detrás dos vidros



A dona da dor
Esquece sua força e
Baixa a guarda.
Seus olhos, protegidos pelo vidro,
Mostram pedaços de fragilidade.
A postura continua a mesma
Por alguns segundos. De repente,
Deita a cabeça e ri. Riso triste,
Parecendo um grito de socorro.
Dona da sua dor, conversa
Sobre o presente.
Lembra do passado, desanimada com o porvir.
Escudos abaixados, coloca
As armas em riste - não esquece
Por completo a sua situação - e sorri.
Maliciosa, molha os lábios com
A ponta da língua e eu,
Que me julgava senhor,
Viro uma criança dominada
Pela dona e sua dor.

Making of:
Feito de um tiro só, numa aula de história da Amazônia no milênio passado, quando cursava Jornalismo, pensando numa conversa tida uns dias ou horas antes com uma menina que muito me atraia. Classificado e interpretado num concurso de poesia, o texto foi parar numa coletânea poética impressa pelo Sesi Roraima. A palavra dor é repetida várias vezes devido ao nome da menina: Maria das Dores.

segunda-feira, agosto 29, 2005

Coisas de Roraima


Domingo, 17h30, tarde tranqüila, vento frio, o verão deu uma recuada. Nas arvores à margem do igarapé Mirandinha, muitos papagaios fazem a sua arruaça vespertina enquanto se alimentam. Na rua sem tráfego, voltando para casa, apenas eu, eles e o vento frio.
Muitas vezes é bom estar aqui.

quinta-feira, agosto 25, 2005

Pensamentos




Ela disse, brincalhonamente manhosa:

- Faz tempo que não te dou prejuízo nem dor de cabeça, né, amor?

Ele respondeu carinhosamente:

- É, querida. Faz tempo que você não me dá prejuízo ou dor de cabeça.

E pensou, triste e ressentido:

- Na verdade, faz tempo que você não me dá nada...

terça-feira, agosto 23, 2005

Slogam


Bate.
Contate.
Corte.
Recorte.
Sugue
A água de meu açude.
Chupe.
Machuque
My dream´n drugs, follow-up.
Lamba meu sexo em close-up

segunda-feira, agosto 22, 2005

Situação

A blusa ficou na sala
Fazendo companhia
Às apostilhas da faculdade
Na varanda, três gatos
Miavam, reclamando da chuva.
No som, apenas um disco
de velhas canções de amor.

quinta-feira, agosto 18, 2005

Atentado

Foi assim: saquei a grana na terça à noite para tocar um pouco do muito que falta do mês. Na quarta, 18h, procurando um número de telefone na carteira, o vazio. Em vez das cédulas, o nada, o agoniante nada, a maior agressão ao corpo humano que se conhece na história.
O golpe certeiro, calculado, foi frio. A carteira estava dentro de uma pochete, que estava dentro de uma mochila. Nada estava fora do lugar.
A única alegria é que não foi no começo do mês, senão o ladrão ia levar muito mais que os R$ 120 da semana.

terça-feira, agosto 16, 2005

Blogueiro

Sala de trabalho em reforma, apenas um ponto com internet, corpo doente, recomeço das aulas da faculdade, leituras de aula, computador pessoal ainda quebrado e muitas coisas a mais para fazer no cotidiano.
É justamente a vida que nenhum blogueiro pediu a Deus.

quarta-feira, agosto 10, 2005

terça-feira, agosto 09, 2005

Métodos

Ele disse:

Às vezes, o passado perturba. Mesmo quando não existiu.

Ela questionou:

E aí, o que você faz nessas horas?

Ele respondeu, pragmático:

Finjo que tenho amnésia...

segunda-feira, agosto 08, 2005

Coisas de Roraima


1- Motoristas fazem protesto na rodovia que liga Boa Vista à Venezuela. Motivo: As autoridades estão reprimindo o contrabando de gasolina, que lá no outro país custa cerca de 10 centavos de real o litro. O combustível é transportado em pampas com tanque duplo ou carros com tanques adulterados e vendido a um real ou a R$ 1, 50 aqui na cidade. Os ?pampeiros?, como são chamados, dizem que a fiscalização atrapalha, que assim não dá.

2- O governo estadual anunciou que vai fechar 171 escolas por falta de alunos. Deve ser o único Estado do Brasil onde todo mundo já passou pelas salas de aula. O número, entretanto, é sugestivo e lembra outra coisa.

3- O governo estadual investe alto na manutenção dos empregos públicos. Depois de aprovar uma reforma administrativa que extinguiu várias secretárias, decidiu continuar pagando o salário dos secretários das pastas defuntas sob alegação que a reforma havia sido muito repentina e que alguns projetos devem ter continuação. Tipo namoro estica-e-puxa: a gente termina mas continua se beijando e passeando de mão dada.

4- Três guianenses, um adulto e dois adolescentes, se envolveram em um acidente de trânsito e foram pegos com 4,647 kg de maconha recém-colhida, o que estragou o final de semana do trio e dos futuros compradores. A República Cooperativista da Guiana é a grande fornecedora da erva para o mercado local. Muitos pais não entenderam o motivo de tanto desânimo.

sexta-feira, agosto 05, 2005

Histórias de índio: sangue e frio

Madrugada do dia 24 de dezembro de 2004. Estou em Puno, cidade peruana que fica às margens do Titicaca, o mais alto lago navegável do mundo. São 3.827 msnm, muito mais que os 90 msnm de Boa Vista, pertinho da Linha do Equador.

Completo 10 dias de viagem pelo Peru. Daqui a pouco vou para La Paz, começando uma jornada que vai demorar quatro dias de muitos quilômetros em ônibus e trens até Florianópolis, onde desfrutarei de sol, praia, ostras e camarão à milanesa.

Puno foi a cidade mais fria que já encontrei nesta viagem. Iquitos, Lima, Cuzco, Arequipa e vários vilarejos não me empurraram às cinco da tarde para o quarto do hotel, fugindo da vento e da chuva.

Acordo com falta de ar. No banheiro, depois de assoar o nariz, vem uma mistura de sangue e muco que suja a pia. Consigo respirar melhor e volto a dormir.

Quando acordo, o nariz está entupido de novo. Mais sangue e muco. O bus me pega no hotel, pegamos a estrada, paramos em Copacabana e no final da tarde, com mais uma mudança de fuso horário, estou na capital da Bolívia, construída num vale e rodeada de favelas.

Mais um bus e amanheço em Cochabamba, numa região bem mais tropical, à qual estou acostumado. No caminho para Santa Cruz de la Sierra, não há mais sinal de nariz entupido. O melhor de tudo é que não tive soroche, o mal de altura causado pela falta de oxigênio.

Update: depois de estranhar que todos estivessem pensando no futuro, percebi que coloquei a data errada nestas Histórias de Índio. Foi em dezembro do ano passado. I'm sorry...:-(

quarta-feira, agosto 03, 2005

Madrugada

Acordou de madrugada sem saber onde estava. Ao seu lado, uma pessoa sem nome. Corpo cansado, levantou e foi ao banheiro. Voltou para a cama e dormiu. Quando abriu novamente os olhos, estava só. No tórax, marcas de uma noite passada com alguém de unhas compridas. Ouviu Sunday Morning no rádio de um carro que passava na rua . Nunca soube o que aconteceu nas horas anteriores, mas a possibilidade de ter sido algo muito bom o atormentou até o último dia de sua vida.

terça-feira, agosto 02, 2005

Frases infantis

Na praça:

Adriana, você é sensacionalisticamente sensacional!

(Duvido alguém falar de primeira sem engasgar.)


Na rua, esperando um táxi para não pegar ônibus:


Mãe, não agüento mais essa tua mania de luxúria.

(Luxo, para maus entendedores.)



Na rua, comentando sobre a casa dos amigos:

A casa do Marcelo fica duas vezes depois do fim dessa rua.

(Sem comentários.)

sexta-feira, julho 29, 2005

O belo...


Quinta-feira, mais uma edição do projeto Pixinguinha, que leva música de qualidade a todo o Brasil. Músicos de primeira no palco, Palácio da Cultura lotado, pessoas em pé, chegando apressadas ao espetáculo.
O show começa. Primeiro, Chico Saraiva, acompanhado de Verônica Ferriani. Um violonista de primeira e uma garota com uma voz maravilhosamente harmônica, cheia de nuances que encantam.
Depois, veio Kátia Freitas, com suas misturas de rock com ritmos do nordeste e outras influências. A noite já estava quente, o público encantado com a sonoridade já cantava ?Coca-colas e iguarias? como se fosse um grande sucesso e o cara do som insistia em atrapalhar a apresentação. Engraçado e irritante ver os músicos todos olhando para os bastidores, praticamente implorando para que tudo saísse bem.
A noite terminou com a energia de Marina Machado, mineirinha cheia de sonoridade, alegria e belas letras. E tudo isso sendo transmitido ao vivo para todo o Estado por duas emissoras de rádio, contribuindo para levar o show à grande parcela da população que não tem acesso a este tipo de evento.


...E o grotesco

Sexta-feira pela manhã, pronto-socorro estadual, visita a um amigo saído de um enfarte. Corredores do pronto-socorro cheios de macas e doentes. O cheiro insuportável do suor misturado com o de remédios. Papéis na parede do corredor dizem ?maca 1, maca 2, maca 2?, evidenciando a que ponto chegou a estrutura do Governo. A unidade semi-intensiva parece uma sala qualquer, suja e descuidada. Enfim, as cenas só reforçam minha aversão à hospitais.

quarta-feira, julho 27, 2005

Poesias venezuelanas

Na falta de tema próprio, poemas da poeta venezuelana Maria Jesús Silva Inserri, 83 anos. Quem não entender alguma palavra, é só perguntar.



Si nuestro amor es eterno
Entonces
¿Por qué tanta prisa?

...................


Te debo todo lo que soy.
No soy nadie

............................

No sé quién soy
Cuando me nombro.
Cuando me llamas me descubro

segunda-feira, julho 25, 2005

quinta-feira, julho 21, 2005

Cartesianos



Ela disse:

- Te dispenso.

Ele respondeu:

- Não concordo. Logo, insisto.

Racionalistas, encontraram seu vértice depois de avaliar suas exatidões.

terça-feira, julho 19, 2005

Reações



Ela disse, sedutora:

- Provoca-me e te devoro...

Ele respondeu, achando que era brincadeira:

- Êêê, vai brincar de jibóia, heim?

Nunca entendeu o porquê dela passar a chamá-lo de boboca depois daquele dia.

sexta-feira, julho 15, 2005

Dom da distância

O poeta fugitivo viaja pela terra
Escondido num carro,
Dentro de um trem cortador
De vales, serras e vales.

Seus amigos o esperam
Dentro de um bar,
Todos alegres com suas conquistas.
Mas nenhum
Consegue definir o conquistador
E o conquistado.

O homem e a sua poesia
Caminham por pontes,
Banham-se em rios, lagos
E banheiros imundos,
Desses colocados ao lado de uma lanchonete
De beira de estrada.
Seu grande amor muda a cara
Todos os dias.
Parece uma difícil canção
Com muitas notas,
Do tipo amada e odiada,
do tipo por todas escutada.

Com sua arte carregada nas costas,
O fugitivo poeta às vezes
Pensa na sua terra,
Nos amigos de infância
No motivo de sua fuga.
Pensa nos seus livros,
Nos seus discos,
Nos seus alguma coisa,
Em tudo.

Suas maiores conquistas
Resumiram-se a elogios.
Seus grandes fracassos
Construíram verdadeiramente
A vidinha levada naquele
Local chamado lar.
A inconformidade o fez sonhar.
Sua covardia o fez esperar
Sentado na cama.

O vivo poeta,
Transbordantemente melancólico,
Rascunha letras enquanto
Espera um ônibus,
Qualquer ônibus, desses
Que o levam a lugares
Mais alegres, mais tristes,
Sem flores ou corvos.

Sua pequena vida cabia
Naquele quarto horrível
Habitado por ele, seus irmãos,
Pais, amigos, amantes,
Inimigos e não sonhadores.
Ele não sente falta de nada.

O poeta prepara-se para fugir
Mais um dia,
Uma noite toda.
Sonha com a sua poesia,
Com o seu grande final.
Sonha, sobretudo, com
A manutenção da sua capacidade
De ser poeta e sonhar.

( Making off: escrito em 1998, foi parar numa coletânea de poesias do Sesi Roraima. Redigido no meu antigo quarto, vendo o pôr-do-sol pela janela, céu vermelho, lembrando de um filme sobre um sujeito que se descobre poeta depois de encarcerado e sonha em ter o seu bar para declamar as poesias. Há quem goste dele.)

quinta-feira, julho 14, 2005

Perfis

Era tão canalha que nem o diabo fazia negócios com ele.

......

Brigavam tanto que quando se encontravam perguntavam um ao outro se estavam de bem ou de mal.


......

Era tão fácil de levar para a cama que acabou como chefe da equipe de testes de uma fábrica de colchões.

.....

Escrevia tão mal que até o bilhete de suicídio ninguém conseguiu compreender.


(P.S.: O post anterior foi parar numa coluna do jornal mais malcriado do sul do Brasil, o megasucesso de vendas Diário do Litoral, no Vale do Itajaí, Santa Catarina. Culpa de Carlotinha Cavalheiro.)

terça-feira, julho 12, 2005

Mala forte

A grana apreendida das malas da Universal do Reino de Deus somente num avião chega aos 10 milhões de reais. O dinheiro é fruto de apenas um culto especial realizado aqui do lado, no Amazonas. Fazendo uns quatro desses por mês, dá para sentir quanto rende por mês a fé e a caridade cristã.

Primeiro era só a mala do publicitário Marcos Valério de Souza abastecendo os partidos aliados do governo. Depois foi o irmão do José Genoíno pego com R$ 200 mil também numa mala e 100 mil dólares numa cueca. Agora foi o pastor/deputado da Universal/PFL. Começo a pensar que depois dos colchões e dos cofres bancários, mala é o melhor lugar para fazer dinheiro render.

Aliás, pelo perfil do dinheiro que voa de um lado ao outro do país em tantas malas, a profissão em alto no momento não é a de pastor de igrejas isentas de impostos, nem a de "agricultor" ligado a parente do presidente nacional do PT e muito menos a de publicitário do governo federal. O negócio é ser fabricante de malas.


FestRock, o final


Se a chuva fez um estrago na sexta e o público não apareceu como esperado na primeira noite do Sesc FestRock, o sábado foi de casa cheia, com o galpão, os corredores e a frente do prédio tomadas por pessoas vestindo roupa preta, muito couro e metal.

Não rolou confronto, apenas um desentendimento rapidamente contornado com a pressão dos próprios músicos sobre os brigões em potencial.

As meninas da banda Pink Rock, vindas de Manaus, deixaram a turma em alta. Pena que a acústica não ajudava muito a entender o que cantavam.
Para quem não agüenta mais ouvir axé, forró e brega, o festival foi uma redenção. Pena que as bandas limitaram-se a fazer cover, tocaram 99% das músicas em inglês e só houve espaço para o rock pesado. Uma ou outra que tocou composições próprias.

Mesmo assim, valeu.

sábado, julho 09, 2005

O rock não é mais como antes...


I Sesc FestRock. 23 bandas de rock tocando no espaço multicultural do Sesc Roraima no sábado e no domingo. É o grande encontro das tribos.

O show ainda não começou. Chove demais na cidade. Zanny e eu ilhados numa lanchonete, esperando o tempo passar e vendo América.

Diz Zanny: vamos embora na chuva mesmo. Estou com frio e ela não vai passar tão cedo.

Digo eu: calma, companheira. Tenha fé. Já vai diminuir.

Meia hora depois, diz Zanny: vai passar quando?

Digo eu: abre teu coração para Jesus, mulher de pouca fé. Já, já, passa.

Uns dez minutos depois saímos correndo debaixo da chuva. A água estava empoçando e cada carro que passava, ondas se formavam, lindas como se estivéssemos à beira do mar... O problema é que havia uma tampa de esgoto pertinho e a Zanny estava querendo vomitar...

No Sesc, a molecada toda de preto, alguns com o rosto pintado, piercings, outros com bandeiras, cantando músicas em inglês com solos de guitarra baterias pulsantes. Tatuadores, roupas de couro e metal. É algo diferente na terra onde tudo termina em forró ou axé sendo cantado por músicos desafinados.

Muito rock. Vocalistas com naipes diferentes, alguns com estilo, outros ainda pegando a manha do palco.

A molecada bebendo suco de laranja e um guitarrista parando a apresentação para dizer que as drogas fazem mal à saúde, que ele usou por 15 anos e quase morre, blá-blá-blá, fazendo do palco um confessionário e sendo muito aplaudido no final.

Definitivamente, o rock não é mais o que era antes. Pelo menos no que trata sobre as drogas entre a juventude. Ainda bem.

P.S.: Terminei de escrever às 13h24, hora local. E ainda chovia na cidade, claro que com menos intensidade. É culpa da pouca fé da Zanny.

quinta-feira, julho 07, 2005

Um ano



Num ritmo cada mais corrido de trabalho, lembrei que há exatamente um ano, em 7 de julho de 2004, a dois dias do aniversário do município de Boa Vista, entrava no mundo dos blogs a primeira postagem do Crônicas do Fronteira.

Muchas gracias, Avery, por ter me ajudado a entrar neste mundo. Como sempre, fico te devendo.

Nesses doze meses, idade aproximada a que tinha quando bati essa fotinha aí, uma pá de coisas aconteceu na vida deste cronista.

Rapidamente, para ilustrar a inspiração para alguns textos aqui publicados, vai aí uma lista rápida de alguns fatos relevantes:

1) Três viagens à Venezuela.
2) Uma ao Peru, com passagem pela Bolívia, com direito a chá de coca.
3) Dois semestres concluídos no curso de Sociologia e mais dois pela frente para sair desse perrengue.
4) Algumas pessoas incomodadas com o conteúdo do Crônicas.
5) Muito calor, muita chuva.
6) Duas bikes roubadas.
7) Algumas amizades criadas e outras quebradas.
8) Um aumento salarial com a correspondente duplicação de responsabilidades.
9) Alguns shows de rock, música latina e outros gêneros.
10) Algumas bocas.
11) Uma namorada que criou coragem para mostrar o que escreve e decidiu tornar-se blogueira.
12) Raivas, risadas e etc. e tal.
13) Um computador pessoal que vive pifado.
14) Pequeno e irritante aumento da massa corporal.
15) Vocês.

Para comemorar, festas, bebidas, gandaia? Nãããooo. Uma prova, a última do semestre, justo das 20h às 22h. Se estudei? Nãããooo.
Vou deixar as comemorações para esta sexta,nesse evento aí, ô, desse cartaz aí embaixo.
A todos os que apareceram por aqui nos últimos 12 meses, valeu.



segunda-feira, julho 04, 2005

Resumos da vida


O que os dois queriam era uma simples noite de sexo, mas alguma coisa deu errado. Casaram, tiveram filhos, pagaram a hipoteca de uma casa e ficaram bravos quando a filha mais velha decidiu largar os estudos para ser cantora numa banda de reggae chamada Os filhos de Maria Joana.

sábado, julho 02, 2005


O tempo sem luz

...E as luzes se apagavam enquanto o som diminuía.
As mulheres chamavam as suas crianças
E os homens largavam suas amantes.
Os padres oravam pelos demônios
Que ao lado dos mortais deliciavam-se
Com garrafões cheios de vinho.
O pecado parecia ser a ante-sala da
Da alegria mundana alojada naquela igreja.
A profanação seria lembrada como a maior de todas e os
Seus protagonistas cultuados como lendas por vários povos
E muitas gerações.

(Escrito na metade da década de 1990, quando ainda estava no ensino médio)

quinta-feira, junho 30, 2005

TV Câmara, duas da manhã, horário de Brasília

Às vezes, a insônia tem suas gratificações. Conhecer mais um pouco o Legislativo, via TV Câmara, é uma delas. Na sessão da madrugada de quinta-feira, quando os deputados tentavam votar a aprovação de uma medida provisória enviada às 19h pelo Governo para dar um crédito extraordinário de R$ 299 milhões para o Ministério da Defesa e para a rubrica "Encargos Financeiros da União".
Discurso vem, discurso vai, o Severino quase dormindo, me saem os deputados com esta conversa, às 1h58, horário de Brasília, depois que alguém perguntou ao presidente da Câmara quanto tempo ele ia deixar o painel em aberto para votação.

Severino Cavalcanti: Até as 3 horas.

Dep. Alberto Goldman (líder do PSDB): Presidente, nunca vi deixar o painel em aberto por mais de uma hora para votação.

Severino, o rei do baixo clero: Era preciso que o senhor visse. Eu sou a primeiro!

(Plano geral, os deputados falam e o som é captado pelos microfones.)

Roberto Freire (presidente do PPS): Isso é uma falta de respeito com os deputados.

Severino, cabra macho: Eu não preciso de seu respeito. Nunca precisei.

Freire: Nunca teve! Nunca teve desde a época do (fala confusa, não consigo entender. Os dois são pernambucanos e devem ter uma história pregressa.).

Goldman pega o microfone e responde ao Severino, em tom de quem um dia pretende voltar a ser situação: Vou me lembrar disso.

Aí desliguei a TV, frustrado por não ver os meus parlamentares ali, de madrugada, votando matérias importantíssimas para o futuro do País.

segunda-feira, junho 27, 2005

Da série Ouvidos na rua: Roqueiros adolescentes


Na maioria das vezes, a adolescência é uma fase fantástica. Outras vezes é assustadora. Hormônios explodindo, pressão social, acne, o primeiro beijo de língua, o vestibular chegando, a vontade de conquistar o mundo ou simplesmente dormir até tarde sem ninguém perturbar.
A adolescência, na maioria das vezes, é também uma fase de falta de dinheiro. E isso é muito ruim se você quer ver um show de rock, por exemplo, e não tem a grana da entrada, criando cenas como a de sábado, quase às 23h.

- Quanto é?, pergunta o rapazinho, magro, cabeludo, camiseta preta, roqueiro total.
- Cinco reais, responde a mocinha que estava vendendo os ingressos.
- Aceita carteirinha?
- Hum...hum..., tá bom, responde a garotinha, com um sorriso amarelo.
O guri paga, pega o troco e vai saindo quando a mocinha pergunta pelo documento.
- E tem que mostrar?
- Claro!, diz a vendedora, rindo do meu sorriso.
- Ô, táqui, mas não tem foto...
- Hum...vê lá com o rapaz da entrada para ver se tu podes entrar, orienta a mocinha, com expressão de quem não acredita no que está ouvindo.

Se o guri entrou, não sei. Mas na saída do show havia uns 20 do mesmo naipe, só esperando liberarem a entrada.

terça-feira, junho 21, 2005

Mais um post coletivo do gênero ?dê continuidade ao que os outros escreveram?, no qual o desafio é manter uma mínima linha de coerência com o post anterior. As condições são estas:

1) Cada co-escritor terá direito a duas participações, intercaladas com outras três dos demais participantes.
2) Se quiser contribuir, mas não quiser colocar seu nome, tudo bem. Só não vale desqualificar as contribuições anteriores.
3) Para que não fique muito extensa ou muito curta, a história será encerrada no 12° comentário. Só peço que não fiquem esperando o décimo para poder participar.
4) Lembrem-se da curva literária necessária para poder, de fato, encerrar a história no número de comentários definido. Da outra vez (13.04.05), quase virou a história sem fim.
5) Beijos a todos. Semana que vem fazemos outro do tipo faça você mesmo o seu final.




Uma noite de lazer


Júlio é contador, 42 anos. Trabalha sempre mais do que é recomendável e mesmo assim o retorno financeiro é pouco. É um atleta de final de semana, quando se reúne com alguns amigos do bairro para jogar bola no campo de chão batido.

Roberta é a mulher de Júlio, três anos mais jovem. Professora em duas escolas de ensino fundamental. É mãe de Augusto e Francisco. Não bastassem as crianças do colégio, tem que segurar a energia sem limite de seus filhos, que parecem nunca cansar.

Júlio adora futebol. Hoje, 21 de junho, ele vai sair um pouco mais cedo do trabalho, comprar queijo e presunto para fazer uns tira-gostos, umas cervejinhas, mandar as crianças brincar na vizinha e ligar a TV para ver um programa especial sobre a conquista do tri-campeonato de futebol no México.

Roberta conseguiu uma folga da escola. Quer chegar em casa, tomar um belo banho, talvez receber uma massagem de Júlio e dormir depois da novela, que ela sempre gostou de assistir.

O problema é que a novela e o especial de futebol vão passar no mesmo horário. E nenhum deles vai abrir mão de seu prazer.

segunda-feira, junho 20, 2005

Pesquisa do Instituto Crônicas

Alguém quer brincar de post coletivo?

Caso sim, a preferência é por aqueles em que vão complementando a história em até dez participações ou pelo tipo "escreva sua continuação e final de uma só vez sem ligar para os outros?"

sexta-feira, junho 17, 2005

Preocupações


Daniel, empresário rico, poderoso, habituê das colunas sociais da região, morre de medo de que algum que algum pedófilo vagabundo se aproveite de Jéssica, sua linda filhinha de 13 anos.

- Se alguém tocar nela, eu mato!

Agora que Jéssica ganhou corpo e cresceu, Daniel anda tão preocupado com isso que na noite passada broxou com uma garotinha de 12 anos que contratou para fazer sexo oral nele.

quinta-feira, junho 16, 2005

Verborragia

Cuspiu na minha cara, dei-lhe um soco. A polícia chegou junto, levou os dois. Mas ele não fez nada. É tudo culpa da oposição. É uma intriga para desestabilizar o país. Chamem um substantivo qualquer e verão como ele aceita suborno. Mensadão, corrigiu o nobre deputado, já de olho no meu bolso e passando uma caneta Mont Blanc para assinar o cheque. Obrigado, prefiro ver uma partida de futebol.

Yes, habemus soccer, beach e estivas em geral. O que? Não! Sul-americanos sim, mas latinos, não. Isso é coisa de cucaracho, dizem nossos primos dos EUA. E se é bom para eles, é bom para nós. Ou não? Mas ter economias em dólar é melhor que ser bacana em real. Na real.

Gringo, eu? Não. Globalizado, antenado, pós-moderno. Tucano? Petista? Ah, pára com isso, eu sou é brasileiro. Eu sou o melhor de meu país, me ensinou um publicitário. Sou cidadão, sim. Não, esse papo de ecologia, respeito aos direitos das minorias e desenvolvimento sustentável é coisa de reacionário, de quem está vendendo a nação para o estrangeiro. Eu quero é progresso e se for preciso derrubar umas árvores, que mal tem?

Ei, esconde esse jornal e essa revista e não deixa ninguém ver a reportagem mostrando que passei a mão naquela grana. O que diriam de mim, senhor? Perdoa esses pecadores que insistem em xeretar a vida alheia. Aliás, se falar mal de algum amigo vai ter. Vai rolar a festa. Ok, separa um filetinho, muito bem. Vamos, sempre em frente.

quarta-feira, junho 15, 2005

Coisas de Roraima

Sem imaginação para criar ficção, a realidade me diverte.

Ottomar Pinto, governador do Estado pela terceira vez, brigadeiro, pai zeloso de uma deputada estadual que é líder do governo na Assembléia, vai à rádio reclamar que um outro deputado está desrespeitando a sua rebenta na tribuna do Legislativo.

Nos microfones, Ottomar pede respeito e usa de velhas histórias para mostrar o que acontece com quem que não respeita os outros.

"...Esse parlamentar, cujo nome mencionei, estou indignado, porque ele ofendeu moralmente uma filha minha, faltou a ele o mínimo decoro, tem que se respeitar a filha dos outros. Eu não sei se o companheiro dela não vai revidar. Deputado só tem imunidade na tribuna, na rua vale tudo, de maneira que é preciso ele tomar cuidado. Eu tinha um tio que foi deputado logo depois da Revolução de 30, Souza Filho, deputado pelo sertão. Esse meu tio costumava usar peixeira na cintura e era um cara do verbo terrível. Ele ofendeu num discurso lá em Tiradentes, um gaúcho, Simões Lopes. Quando o filho do Simões entrou no plenário, foi atrás dele. Começou uma discussão e meu tio puxou um punhal. O filho do Simões puxou um trabuco e atirou nele. Agora Sousa Filho está lá no túmulo, no cemitério de Petrolina. Então, é preciso entender que não se pode descer ao nível das ofensas pessoais..."

O velho brigadeiro, entretanto, nega na imprensa escrita que suas afirmações sejam ameaças.
Seriam apenas exemplos de fatos acontecidos muito tempo atrás. Uma reação de pai, esclarece.

segunda-feira, junho 13, 2005

Depois do dia dos namorados

Manhã de segunda, mais ou menos 8h40, muito atrasado para o trabalho (ainda bem que não há rigidez excessiva sobre isso e sim sobre o que produzimos), vejo no banco da praça um casal jovem conversando.
Ainda não esquentou (meio-dia o sol estará de um jeito que a pele arde em poucos segundos), o que lhes possibilita conversar tranqüilos.
Estão afastados e não se olham diretamente. Parecem falar sobre algo muito sério, penso enquanto atravesso a rua. Mas que coisa! Ontem foi dia dos namorados e o casal (se é que são um casal) parece estar numas de mau humor!
Será que um dos dois não ganhou presente, beijo, ligação ou sexo de qualidade? Será que um dos dois tem mais de um amor e trocou o cartão?
Será que depois do jantar de ontem, decidiram que o melhor era cada um ir para seu lado, já que ela não agüenta mais comer sanduíche neste dia?
Ou será que estão discutindo um retorno depois de um estratégico afastamento de uma semana, o que os poupou de gastar dinheiro com presentes ou lembranças?
Será que era cobrança do aluguel ou dívidas de jogo?

Se vocês tivessem visto um casal conversando seriamente hoje pela manhã, o que teriam pensado?

sexta-feira, junho 10, 2005

Comerciais da Fronteira

A morena Zanny Adairalba estréia no mundo dos blogs com o Pétalas. O nome é inspirado na letra de uma música que fizemos junto com o violonista Cláudio Moura. Quer dizer, eu ditei, o Cláudio musicou e a Zanny anotou...


O arraial da Prefeitura de Boa Vista termina domingo. Olha como é trabalhar até de madrugada para fazer a cobertura on-line da festa. Como diz a Rah, rapadura é doce, mas não é mole não.

quarta-feira, junho 08, 2005

Convicções

Ele resmungou:

- Estou cansado da vida que levo.

Ela concordou:

- Uhum...

Ele acrescentou:

- E estou mais gordo também.

Ela percebeu o déja vu:

- Ei, tu falou isso, desse mesmo jeito, há uns dois anos.

Ele, olhando para o horizonte, respondeu:

- Viu como não sou volúvel e mantenho minhas posições?

segunda-feira, junho 06, 2005

Mondo TV

Fez o negócio de sua vida: trocou sua alma por um sistema Sky + e viveu até os 95 anos tendo acesso de graça ao paper-view. O que aconteceu depois do enterro ninguém sabe.

(Inspirado no comentário do Patrício no post anterior.)

sexta-feira, junho 03, 2005

Mondo cane

Ele disse:
Bah, guria, para que tanto aperreio. Não é melhor assumir que a idade nos torna cínicos
como as pessoas que detestávamos há alguns anos?

Ela argumentou:
Mas e os sonhos, onde vão ficar?

Ele respondeu:
Vende. Conheço um cara que paga bem por restos de inocência.

quarta-feira, junho 01, 2005

Histórias de índio: estudos


A lembrança mais antiga que tenho da escola é a da professora Sônia pegando o meu gibi (em português) com uma historinha do Scooby Doo. A vaca nunca devolveu.
Quando era criança, toda tarde passava na emissora estatal Venezolana de Television, canal 8, um programa infantil comandado por uma mulher estúpida que sempre cantava algo parecido com ?estudar, estudar, vamos todos estudar?.
Cada vez que a música começava, pulava em direção ao aparelho para desligá-lo ou abaixar o volume. Caso contrário, dona Neide não perdoava: mandava parar tudo e ir estudar. Hoje sei que ela era uma vítima dos mass media, mas à época ainda não tinha noção da carga ideológica dos programas de TV.
Na Venezuela, a nota máxima é 20. Minha obrigação de filho único era bater, no mínimo, 18, e, nestes casos, preparar-me para compensar essa nota lá na frente. Uma vez, na terceira série (ou tercer grado), tirei 12....Alguém já apanhou por nota baixa?
Quando vim morar de vez no Brasil, cansado de ver meus colegas do Liceu encaminhando-se na vida nos cursos técnicos oferecidos em cidades próximas à minha, descobri que meus anos de leitura de Homem-Aranha, Mônica, Pato Donald e outras revistas em português não iam me adiantar muito.
A chegada foi num domingo e na segunda lá estava numa sala da oitava série da escola Vitória Mota Cruz, apanhando da história, da gramática e da literatura. Sabe-se lá como, em poucos meses já estava sendo escolhido como o aluno com a melhor redação da turma. Sinal de que o ensino público é uma droga.
Depois veio o ensino médio, a universidade, o trabalho, novamente a universidade, o trabalho, o blog...
Nessa história, só tenho certeza de duas coisas: mesmo sendo o único daquela turma da Venezuela que se formou, ler Seleções do Reader's Digest não ajuda em nada.
A outra é que não adianta ser rato de livros. Se não houver vivência, nem todo o conhecimento da legendária biblioteca de Alexandria fará diferença na vida.

segunda-feira, maio 30, 2005


Histórias de índio: sobrevivendo.


Meus pais são de Boa Vista. Ele é descendente de uma índia macuxi com um fazendeiro. Ela, de um paraense com uma bisneta de espanhol.

Namoraram desde os 15 anos de idade. Só casaram aos 21 porque meus avós não autorizaram a união deles aos 18.

Antes da maioridade, meu pai, seu Jucá, se embrenhou pelos caminhos de boi que levavam à Venezuela muito antes que fosse aberta a BR 174, que liga Manaus à Pacaraima, e conheceu os garimpos da região.

Depois de servir o Exército na fronteira com a Guiana, foi para Manaus, onde estava quando casou por procuração com dona Neide.

Apressado, nasci antes do tempo e fui parar numa incubadora. Mas antes de mim, houve três tentativas de gravidez frustradas pela natureza.

Na minha vez, rezaram e fizeram promessas para santos que nunca venerei mas que devem ter feito sua parte no processo.

Era tão pequenino que dona Neide me colocava numa almofada para mamar. Não fosse isso, escorregava entre seus braços.

Seu Juca só me viu depois de um mês de haver nascido, quando voltou para casa com uma bala no corpo e o desengano dos médicos. Salvou-se com os bons tratos da família.

Bebê ainda, quase morri queimado numa rede. Nos verões de antigamente sempre faltava combustível para a usina geradora, incêndios aconteciam comumente. Hoje, somos abastecidos pela energia elétrica da Venezuela e a termoelétrica foi desativada.

Aos seis anos, peguei hepatite. Amarelinho, fui também desenganado pelos médicos do hospital mais próximo, em Upata, a 100 quilômetros de casa. Queriam me deixar numa sala, separado de todos, mas dona Neide fez um escândalo, assinou todos os termos de compromisso que colocaram na sua frente e me tirou de lá.

Se é para morrer, vai morrer em casa, depois que eu fizer de tudo para salvá-lo, disse à época, quando me levou para nossa casa na rua Progreso, em Guasipati.

Curandeiros fizeram remédios estranhos, vizinhos fizeram promessas para santas que ficavam em capelas de cidades abandonadas, muita melancia com açúcar foi engolida e meses se passaram até que, por fim, amanheci um dia curado da hepatite.

Quer dizer, sou um sobrevivente.

Sendo assim, não vai ser o trabalho com um texto complicado de Lévi-Strauss que vai me derrubar. Não mesmo. Quem vai dançar será ele.

terça-feira, maio 24, 2005

Comerciais da fronteira

Música pernambucana de graça? Vai no site da banda Mombojo, que colocou, via Creative Commons, todo as canções de seu disco Nada de Novo a disposição do público.

Da música para a escrita. Só mais uma semana e termina o Concurso de micro-contos Mário-Henrique Leiria, lá de Portugal. Vamos correr.


Para finalizar, fotinha do dia 21 no flog de Carlotinha Cavalheiro.

segunda-feira, maio 23, 2005

Mundão velho sem porteira

A guerra contra as drogas financiada pelos americanos mata centenas de pessoas na América do Sul; a reforma agrária do governo Lula é uma piada; a Universidade Federal de Roraima prepara uma semana de exposições científicas e eu não tenho nada para apresentar; a cidade de Boa Vista está aquilo que costumamos chamar de fria aqui no norte; as chuvas incomodam tanto quanto o calor; ainda há quem resmungue por conta da inclusão dos arrozais na Terra Indígena Raposa - Serra do Sol; semana passada os brasileiros cumpriram o pagamento de sua cota anual de impostos; as fitas do governador de Rondônia e seus deputados corruptos mostram que o Brasil nunca foi paraíso dos inocentes; a carga de trabalho aumenta a cada dia no meu setor; a cada semana pegam um carregamento de cocaína na rodoviária e no aeroporto de Boa Vista; o Iraque continua um caos; e a vida na Europa é muito cara para tentar uma migração sem um bom reforço no bolso.

Tudo isso acontecendo, para lembrar da música, e eu aqui, pensando em como seria bom arranjar um tempo para ler HQs.

terça-feira, maio 17, 2005

Cenas reais



Eu te ouço,
Tu me lês.
Eu me perco,
Tu te encontras.
E do céu,
Estranhas figuras caem.
Eu te vejo,
Tu me choras.
Eu te espero,
Tu me adiantas.
E na noite,
Surgem filmes e canções.
Falam de heróis, de amores,
De tristezas e de paixões.
Eu te vejo e tu choras.
Eu rio,
Tu te envergonhas
E mensagens chegam pelo ar,
Falando de medos e lágrimas.

segunda-feira, maio 16, 2005

Promessas


Ela perguntou:
- Mas o que aconteceu conosco? Você não me prometeu ser normal caso um dia tudo terminasse?

Ele respondeu, seco, raivoso:
- Eu não prometi nada! Quem falou nessas bobagens foi você!

Frustrações, rancores e um silencioso afastamento os acompanharam a partir daquele dia.

quinta-feira, maio 12, 2005

Fahrenheit 451, a corrente

Odeio videoquê. Sobretudo se for em festa de aniversário.
Detesto bandas de forró, principalmente as desafinadas.
Tenho urticárias quando me convidam para fazer aqueles "bolões" de dinheiro, dizendo animados que é mais rápido que a poupança.
Mas o que não gosto mesmo é daquelas correntes do bem, do tipo "esta pobre criancinha precisa de sua contribuição ou morrerá em um mês se você depositar grana agora na conta XXXX", do gênero "repasse para sete amigos e me devolva caso você goste mesmo de mim", ou das ameaçadoras: "ou você repassa ou sua sexualidade, sua conta bancária, sua família, seus estudos e seu blog serão seriamente afetados."
Mas, para ficar de bem com a tia Luma, que ameaça processar, devido a uma ameaçadora nota, a Associação dos Índios Blogueiros da Amazônia Legal, Venezuela e Países Adjacentes, da qual sou sócio emérito, e para não desfazer do Alê, dono de um dos primeiros blogs que conheci, vou encarar uma corrente literária que nasceu lá em Portugal, salvo engano.

Mas antes, uma explicação: Fahrenheit 451, segundo demonstrou exaustiva pesquisa no google, é o nome de um filme de François Truffaut no qual rola uma queimação de livros semelhante às épocas mais sombrias da humanidade. O título é uma referência à temperatura em que os livros são queimados. Convertido para Celsius, esta temperatura equivale a 233 graus.


Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Nenhum. Se não pudesse sair, seria queimado como livro,o que, convenhamos, não é o sonho de nenhum livro.

Já alguma vez ficaste perturbado por um personagem de ficção?
Todas as vezes que leio Cem Anos de Solidão, de Gabriel Garcia Márquez, acontece isso. A saga dos Buendía é perturbadora.

O último livro que compraste?
Dois de uma só vez: Saturno nos Trópicos, do Moacyr Scliar, e o Livro do dessassego, de Fernando Pessoa.

Qual o último livro que leste?
O que é positivismo, João Ribeiro Jr., da Coleção Primeiros Passos. (Viva as obrigações acadêmicas!)

Que livro estás a ler?
Pra valer: História das Idéias Sociológicas, de Parson aos Contemporâneos, de Michel Lallement.
Pendurados na estante: uma coletânea de Pablo Neruda, o primeiro livro do poeta amazonense Thiago de Mello, outra coletânea do poeta Carlos Nejar e os de Pessoa e Scliar. Sem contar um do Che Guevara.

Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
Se a estadia fosse curta, os que nunca li: Ulisses; um exemplar com seleção das melhores poesias de Paulo Leminski e outro de Baudelaire; algo de um escritor da geração beatnik; e Macunaíma.

A quem vais passar este testemunho (3 pessoas) e porquê?
Para o e-pistoleiro Avery, que sabe-se lá como arranja tempo para estudar, trabalhar e ler. Para a , que fazia tempo que não passava por aqui e sempre abre seus posts com um texto alheio creditado. O último felizardo será Luiz Valério, que ficou apaixonado pela escritora Ana Miranda e só fala em livros e blogs desde então.

quarta-feira, maio 11, 2005

Comentando os comentários

É surpreendente como a imaginação pode gerar vários finais para um texto. A história de Marisa e João teve de tudo.
Do cheiro nada excitante do alho a uma paixão que atravessou décadas, sentindo o gosto do que (talvez, não se pode afirmar nada) tenha sido a primeira vez do mocinho.
Melhor do que isso é ver como cada redator usa suas referências para traçar o destino do personagem. Para mim, a multiplicidade de versões é o melhor dos posts coletivos.
Mas o comentário off topic do Fabrício me fez perceber que não fui bem claro ao propor esta nova rodada de criação coletiva.
A intenção, não sei se todos entenderam, era criar vários finais para o texto. Ou seja, cada comentário seria uma finalização, diferente da proposta anterior (do mês passado, com Lady Laura e as cantadas do Ismael), que era cada um continuar a história até que o final surgisse naturalmente após dez participações (o naturalmente é ótimo quando pré-determinado, né?)
Bom, está aberto o espaço dos comentários para cada um falar do final do outro e do seu e sugerir uma normatização para posts coletivos do tipo "Faça seu final em um parágrafo" e do gênero "Continue a história por tantos posts".

segunda-feira, maio 09, 2005

Post coletivo II

Continuando as experiências que só a internet pode proporcionar, convido meus amigos a completarem este texto, com mais um parágrafo, escrevendo o final que desejarem.

.........


Me coma, garotinho,disse Marisa a um estupefato João, 15 anos, filho da vizinha, habitual observador de seus banhos vestida apenas com uma camiseta no quintal.

Anda, Joãozinho, vem aqui, repetiu a mulher, cerca de 30 anos, mãe de um garoto de sete que costumava brincar com o videogame de João.

Vem ou não, perguntou Marisa, levantando o vestido curto e mostrando que estava sem nada por baixo para o pequeno João, que ela havia visto de relance várias vezes observando-a pelos buracos do muro velho e rachado.

Hã, como,não entendi, gaguejou João, sentindo que algo crescia nele e não era nada parecido com coragem ou o medo de ser pego naquele momento por sua mãe, a esperá-lo na casa ao lado.

Você não me queria? Estou aqui, vem, disse a exuberante Marisa, pernas grossas, bunda modelada com muito exercício e um cabelo negro que terminava na cintura.

João, hipnotizado pela visão das nádegas de Marisa, que estava de costas para ele, mãos apoiadas na mesa e o vestido levantado, quase sem ar decidiu encarar o destino com firmeza. Depois daquela tarde, nunca mais seria o mesmo.

quinta-feira, maio 05, 2005

Dicas de bem viver

Para pensar positivo:

O seu dia está ruim? Imagine se você morasse no Iraque...

Para ser empreendedor:

Se a vida só te dá limões, vá vender caipirinha na praia.

terça-feira, maio 03, 2005

Madrugando

Foi assim, ele saiu de manhã.
Nas costas, o cansaço da despedida.
Na boca, o gosto da madrugada.
Antes de fechar a porta,
um olhar para o palco da batalha
E a vontade de contrariar o relógio.
Na saída, a lembrança de jogos,
Suores, olhares, sorrisos,
Promessas e comentários
Não repetíveis em público.
Ficaram para trás a penumbra.
Foi-se com ele a promessa
De mais uma noite para
Entender o destino que
Se escreve prosa pelas
Linhas da poesia.

sábado, abril 30, 2005

Sabadaço na XVI Feira de Livros do Sesc RR



A apresentação de sexta na XVI Feira de Livros do Sesc foi recheada de emoções. Velozes fugitivos de nossos empregos, Nei e eu chegamos cedo ao palácio Latife Salomão, onde rola a movimentação, para montar toda a parafernália necessária. Ainda bem.

Depois do Sesc trocar a CPU, que não tinha placa de fax-modem, disponibilizada para o estande da biblioteca, deu um tilt na conexão telefônica. Mexe aqui, mexe ali, reconfigura parte do computador, concluímos que o melhor seria resumir a apresentação. Nada de internet. Nada de visualizar blogs então. Corremos para o pagefront, fizemos uma página na hora com os tópicos e mandamos ver.

Dividimos as falas e apresentamos. Companheiro da correria, Luiz Valério deu pinta na feira e mandou bem na parte que lhe coube.

Falamos de interatividade, alcance, links, comunidades blogueiras, liberdade de expressão, potencialidades do blog, blá, blá, blá.

Hoje, lamentavelmente o Nei não poderá participar. Seu filhinho inventou de aniversariar justo durante a Feira. E como ele quer muito bem à sua pele e não deseja confusão com sua esposa, passou o dia inteiro carregando cadeiras e mesas para a festança que vai rolar na mansão dos Costa. E o pior é que o coisa não me passou o endereço certo...

quinta-feira, abril 28, 2005



Em 2002, encarei o os 2.875 metros do Monte Roraima. Facinho, facinho para um indiozinho. Neste final de semana, em companhia do Nei, vou encarar a XVI Feira de Livros do Sesc. Vamos escalar, ops..., falar sobre literatura virtual, blogs e coisas do tipo. No bolo, propaganda de graça de um monte de blogueiros. Por isso, caros, publiquem coisas legais para não nos fazer passar vergonha...

Ah, lá na Feira estaremos criando um blog para o Sesc. O endereço, valendo a partir das 20h de sexta (29 de abril) será www.pocoesdepoesia.blogspot.com . lá.

quarta-feira, abril 27, 2005

Da série Apropriações Indébitas

Tem que saber curtir.
O problema é a ressaca.

By Danilo, o Cara, sobre excessos aos finais de semana.

terça-feira, abril 26, 2005

Da Série Ouvidos na Rua

Na loja de sapatos, as duas vendedoras:

- Então, tu fez o que no final de semana?
- Ai, foi tão bom!
- Conta como foi.
- No sábado, depois do expediente, fui em casa tomar um banho e fui pra casa da minha irmã. Tava tendo um aniversário lá. Passei a tarde toda e um pedaço da noite da turma dela, jogando baralho e dançando. Menina, bebi e comi o tempo todo.
- Caraca, tava bom demais então!
- Meia-noite sumi com um gato que tava na festa. Precisava ver. Lindo. Branquinho, olhos azuis....Ai (suspiro), acordei tarde no domingo...


(E ainda tem gente que reclama da vida. Não sabe aproveitar como a moça, já viu.)

segunda-feira, abril 25, 2005

"Jazz é masturbação musical."

Jimmy Rabbitte, empresário da banda The Commitments, aquela do filme ?Loucos pela fama.? Quem nunca assistiu, corra. Está passando desde a semana passada no canal MGM.

"Mustag Sally
Guess you better slow your Mustang down

Mustang Sally, baby?"

quarta-feira, abril 20, 2005

Manifestação no Centro Cívico por conta da demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol

Alugaram ônibus para transportar pessoas de graça; fecharam as portas de parte do comércio central; falaram (e como falaram) bobagens nas rádios; acusaram o governo Lula de vende-pátria; clamaram por justiça; alertaram sobre conflitos na reserva; disseram (sem me consultar) que o desejo de todos os roraimenses não era a reserva em área única; aproveitaram a deixa para sair do PT; escreveram sobre cidadania, direitos iguais entre desiguais, falta de compromisso da União com os esquecidos do Norte; teorizaram sobre o troco nas urnas; usaram fitas negras para simbolizar o luto do Estado; publicaram anúncios de página inteira expressando sua revolta; pintaram um futuro negro para Roraima; e como se estivéssemos em outro mundo, avisaram que a economia voltaria a depender do pagamento do funcionalismo público.

Mas ninguém explicou como é que viramos território federal em 1962, passamos a Estado em 1988 e nunca conseguimos superar o discurso de "agora sim, vamos progredir."

terça-feira, abril 19, 2005

Dia do índio em Roraima

Aqui, onde missionários e outros conquistadores fizeram a feira com aldeamentos e escravizações dos indígenas;
onde a história oficial nega que alguma vez houve conflitos durante o processo de ocupação das terras;
onde meninas índias eram (e ainda são) trazidas para as cidades para estudar e viravam domésticas e brinquedinhos sexuais dos patrões;
onde predomina o preconceito contra quem vive nas aldeias;
onde há morte e violência constante no campo;
onde fazendeiros plantam em terras demarcadas mesmo sabendo da ilegalidade do ato e são considerados vítimas;
onde os interesses da maioria chocam-se com os da minoria;
onde a minoria não se entende na hora de definir quais são seus interesses;
onde a elite diz que ser culpada por alguma coisa é estratégia de entreguistas da nação para beneficiar índios que não querem ser isolados;
onde o governador decreta luto oficial de sete dias por conta da demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol;
onde a mídia simplesmente ignora quem apóia a demarcação e concede espaços privilegiados a quem a combate;
onde dizem que direitos históricos se confundem com interesses obscuros;
onde todos perguntam para que tanta terra para tão pouco índio;
onde até o vendedor de picolés diz ser contra a demarcação mesmo nunca tendo tido um pedaço de terra na região;
onde o discurso dos direitos da minoria já encheu a paciência;
onde discuti-los é pior do que falar sobre religião e política;
e onde o Estado cancelou todas as programações referentes à data em protesto contra a demarcação;
bem, aqui, eu, como neto de uma macuxi que foi casada com um fazendeiro, vou exigir o meu pedaço de terra, trabalhar com agricultura e ecoturismo e ficar rico. Afinal, eu também tenho direitos!!! Fui!!!!!!!

sexta-feira, abril 15, 2005

Taí o resultado do post coletivo. Agora, é cada um ler e fazer suas avaliações do conjunto. De preferência, compartilhando.
Posso dizer que nunca havia feito nada parecido. Escrever sempre foi uma ação solitária justamente para não entrar em conflito de idéias. O que imaginava para a história não tem nada a ver com o que resultou. Mas gostei da experiência.
Valeu, caros Ismael, Rah, Luma, Avery, Patrício, Luis Ene, Nanda, Nora e Nei.
Depois fazemos de novo.


.....................


O dia havia sido agitado. Correria no trabalho, correria no almoço. De repente, no final do expediente, a ligação, relembrada no balcão da lanchonete:
- Olha, vou falar contigo na marra. Não gosto de você. Mas mesmo. Aliás, te odeio.
Ao que ele respondeu, calmo e sorridente:
- Você me odeia? Então, pega tua ficha e entra na fila para não atrapalhar os outros.

Seus colegas riram. Boa história para o começo de uma noite de sexta-feira.

Bateu o telefone e ficou esperando nova chamada. Quando atendeu foi logo gritando:- Você não tem nada melhor pra fazer além de incomodar quem está trabalhando? Minha vida era bem melhor antes de você. Quer saber? Vá lamber sabão, junte-se aos Médicos Sem-fronteira ou raspe a cabeça e vire Hare Krishna. Cansei, veja se... mamãe?!

- Não mãe, era brincadeira minha com o pessoal aqui, é claro que estou lembrado de pegar a sua amiga no aeroporto. Inventou qualquer desculpa e desligou rápido antes de se transformar em piada permanente do escritório como o filho da careca hare krishna. Já passava das 19h e era uma boa distância até o aeroporto que ficava fora da cidade. Não sabia por que deixava sua mãe convencê-lo de fazer estes favores desconfortáveis para estranhos. E agora esta maluca telefonando do nada, não havia hora mais inoportuna.

Preparava-se para arrancar para o aeroporto quando o celular tocou. "Te odeio. Mas mesmo. Você nem imagina quanto." Era ela de novo. Ficou a olhar para o ecrã que dava indicação que a chamada terminara. Nem conseguira dizer coisa alguma. Mas agora tinha o seu número...

No caminho do aeroporto torcia para que a amiga de sua mãe fosse ao menos uma loba enxutinha, charmosa. Gostava de mulheres mais velhas, e vez por outra fantasiava um sexozinho com a Malú, amiga de adolescência da mãe. Esperou o telefone tocar novamente, mas nada aconteceu...

O Trânsito devia estar horrível...seria uma boa desculpa para se atrasar na ida para o aeroporto. Mentir é uma habilidade social? Sim. Neste caso. Com a certeza absoluta que ela ainda o amava, senão, não iria se preocupar em dizer tantos "eu te odeio" e ela estaria ali por perto...

Por perto, talvez não seja esta a definição.Ele está dentro dela, preenchia-a as entranhas com amor e carinho e depois exigiu que ela terminasse com esse sentimento.Ela lutava contra ele e contra si.Tentava transformar aquele ódio em amor. E estava conseguindo.

Como não as alternativas não eram muitas, resolveu que aproveitaria ao máximo essa tarefa. subiu no carro e pegou seu cd do 'frank jorge', presente de lady laura, uma ex-amante gaúcha dona de grande cultura musical e grande habilidade no sexo oral. enquanto enfrentava o congestionamento, relembrava do dia que a conheceu em porto alegre, numa festa na casa de um amigo em comum.

Talvez esse fosse o motivo. Tudo dele era imediato e cômodo. E uma mentirinha de vez em quando não ia mudar sua vida. É, quando ela é aceita e impressa pode virar um romance e se é passada na tv, vira novela. Mas como se chamava na vida real? Ele começou com a certeza e acabou na dúvida. Ah, se ela se contentasse com a dúvida, acabaria tudo certo.

Mas não. Ela e suas certezas. Ela e suas grandes aspirações, seus filmes complicados, suas neuroses allenianas. Talvez fosse melhor fingir suicídio e voltar para o único lugar que ela jamais lhe procuraria: aquela aldeia tutsi onde se conheceram. Ali sim, talvez encontrasse a paz. Ou um grupo de hutus enfurecidos.

Quase perdeu a entrada do aeroporto enquanto fingia não estar esperando mais uma vez o telefone tocar. No desembarque não havia muitas pessoas e assim teve certeza que estava muito atrasado, mas favores nem sempre são perfeitos e certamente a tal amiga saberia apreciar sua boa vontade. Em segundos ficou boquiaberto ao perceber sua passageira diante do carro. Não era uma loba, era uma pantera na casa dos trinta.

De sopetão ele se apaixonou. Os olhares se cruzaram e ele sentiu um pulsar forte no peito e o suor frio escorrer por seu rosto ainda rubro. Já não esperava mais um telefonema e nem se lembrava de um passado tão próximo.

- Qual é o número da ficha, que não tenho tempo a perder com filas, baby!

Pensou: "Parece que ela é realmente apressadinha como eu" e estacionando o carro, saiu correndo para se apresentar. Entraram no carro e o telefone tocou. Desligou e disse: "A bateria está fraca". Deu-lhe um sorriso enviesado e ela idem. Pensou: "e aquela tonta a ligar...ah, os homens mentiriam menos se as mulheres fizessem menos perguntas". Preso nesses pensamentos, sentiu a necessidade de dizer algo: "Não sabia que minha mãe tinha uma amiga tão bonita. Vai ficar muito tempo?"

Ela olhou-lhe bem no fundo do fundo dos olhos e disse-lhe lentamente: "Não gosto de você. Mas mesmo. Aliás, te odeio." Ele sorriu, ia ser um excelente relacionamento.

Sorrindo meio provocador, com mais astúcia do que habilidade, arriscou: - Mas por que você me odeia tanto se ainda nem nos conhecemos direito? - Talvez pela cantada juvenil: "Não sabia que minha mãe tinha uma amiga tão bonita?!" Faça-me o favor, menino! Eu não sabia que minha amiga tinha um filho tão sem criatividade! Uma decepção! Um rapaz tão bonito!Mas o tiro saíra pela culatra. Se estava decepcionada era porque esperava outra coisa...

Ele se calou, mas ficou observando os gestos dela pelos cantos dos olhos. Notou o momento em que ela pegou o telefone e num movimento suspeito deixou-o cair sobre as suas coxas. Ele ainda tentou pegá-lo, mas não teve tempo.

O telefone havia sido engolido pela abertura das pernas da mulher. Ela o olhou e sorriu maliciosa, perguntando: se tocar, como te achei bonito, apesar de bobinho, deixo você pegá-lo. Ele sorriu, pensando em como seria bom que uma ligação de alguém declarando ódio eterno se repetisse logo, logo.Dirigiu impacientemente, esperando que sua mão ficasse boba quando fosse atender o xingamento.

quarta-feira, abril 13, 2005

A proposta é seguinte, meus amigos: continuem vocês a história a seguir.
As condições, para não virar uma bagunça, como a vida nas cidades fronteiriças geralmente é, são estas:
1) A cada comentário, o co-escritor terá direito a seis frases, incluindo aqui possíveis falas dos personagens que acrescentar.
2) Se quiser contribuir, mas não quiser colocar seu nome, tudo bem. Só não vale desqualificar as contribuições anteriores.
3) Para que não fique muito extensa ou muito curta, a história será encerrada no décimo comentário. Só peço que não fiquem esperando o décimo para poder participar.
4) Cada co-escritor poderá contribuir duas vezes no máximo. (Eu sei, parece ditatorial, mas só assim podemos controlar os mais afoitos.)
5) Conto com vocês para esta experiência. Beijos a todos.

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O dia havia sido agitado. Correria no trabalho, correria no almoço. De repente, no final do expediente, a ligação, relembrada no balcão da lanchonete:
- Olha, vou falar contigo na marra. Não gosto de você. Mas mesmo. Aliás, te odeio.
Ao que ele respondeu, calmo e sorridente:
- Você me odeia? Então, pega tua ficha e entra na fila para não atrapalhar os outros.

Seus colegas riram. Boa história para o começo de uma noite de sexta-feira.

(Continua nos comentários...)

segunda-feira, abril 11, 2005

História de uma concursada

Nesta segunda, às 17h, dona Gracineide e outras 1.059 pessoas serão empossadas como funcionários estaduais no ginásio estadual Hélio Campos.
O cargo de dona Gracineide quase lhe escapa. Se não fosse uma cunhada ligar avisando que havia sido convocada, não teria tomado ciência da chamada feita pelo governo.
Dona Neide, como é mais conhecida, está empolgada com a novidade.
Há alguns anos é somente dona-de-casa, esposa de seu Juca, assessora para assuntos médicos de seu pai, gerenciadora das obras de reforma de sua casa e do apertamento do filho, responsável pelo compra de material de uso permanente e administrativo dos dois lares, além de alfabetizadora de pelo menos quatro sobrinhos e criadora de alguns cães bravos que só.
Para relaxar, vai à Venezuela de vez em quando, assiste às novelas da noite e vende produtos dessas empresas que fazem distribuição pelos Correios. Nos intervalos, estudou em casa para o concurso público.
Dona Neide, aos 53 anos, é a viva prova de que o tempo é o senhor esquecido dos recados atrasados.
Depois de muitos anos sem trabalho registrado, ao precisar do número do Pis-pasep, necessário para a lista enorme de documentos e exames médicos exigidos pelo Governo, dona Neide descobriu um recado grampeado na carteira de trabalho pela antiga patroa, Nilze Fligioli, quando deixou Manaus, lá na década de 1970.
A patroa, ao enviar sua carteira de trabalho para Boa Vista, escreveu um bilhete desejando muita sorte no parto e pedindo para procurá-la quando saísse da licença-maternidade. "O seu posto na empresa está aqui em Manaus, esperando por você."
28 anos depois, graças à necessidade criada pela exigência do governo, dona Neide finalmente leu o recado.
E depois ela reclama quando o filho esquece do nome das pessoas.

sexta-feira, abril 08, 2005

Depois de uma semana de trabalho, vejam só o que Zanny Adairalba, dona de lugar fixo na série Redatores da Fronteira, ainda é capaz de escrever. (Eu, quando chega a sexta, só atino a pensar que a coisa pode ficar pior.):


Liberdade!! Liberdade!!
Gritei logo ao acordar por meu peito doer
Mal pude vestir-me e corri às ruas
Bati nas portas
Percorri as calçadas
Gritei
Gritei
Ajoelhei-me no paralelepípedo e esperei resposta
A chuva caia
Era forte
A rua deserta
O riso era esperança
A fome
Era de vida
Os sonhos... confusos
Ninguém respondeu
Um poste
...uma lâmpada ainda ligada
o dia acabara de despertar
um lenço à mão
...vermelho
deitei-me ali mesmo
em frente a qualquer coisa
no meio de qualquer lugar
entre a rua e a calçada
os pingos da chuva eram conforto
um silêncio incomum abraçava o cenário
percebi que era o meu dia
meu dia de gritar
de chorar
de construir... assim mesmo...
no meio do nada...
uma resposta para minhas dúvidas
me fiz criança
feto envolvido no útero materno
molhado
medo
mas não um medo covarde
a busca da paz
do equilíbrio
da razão...
um momento como poucos
uma sensação de afogamento
e de emancipação conjugada
a rua de paralelepípedos parece cantiga
de algum compositor buarquiano brasileiro
as lágrimas se misturam com a água vinda do céu
agora menos dolorosas
- liberdade!
... o sussurro de um riso meio louco
- paz!!
... é tudo o que queremos.
A chuva passa de repente...
As pessoas abrem suas portas...
Suas janelas...
Saem de suas casas e ...
Como se fosse música
Dançam felicidade.
Os raios de sol
Iluminam a velha ladeira da rua 19
Parece sonho
Brinquedo de menino
Desenho de graffiti
Uma mão estira a liberdade
Se ergue a verdade
Me levanto diante dela
A essência é companheira do saber
Me encontro e me transbordo de mim mesma
Cálice de vinho raro
Chegada de plenitude
O dia é partícula de eternidade
A vida... criação e criatura
Fruto de um ventre celestial
Livro escrito por anjos carnais
Liberdade.

terça-feira, abril 05, 2005

Os blogs na XVI Feira de Livros do Sesc



Nei Costa e este cronista participam nos dias 22, 23 e 24 de abril da XVI Feira de Livros do Sesc, um evento que reúne milhares de crianças, adolescentes e adultos todos os anos e que, pelas inovações de cada edição, é considerado modelo para o Sesc nacional.

Nossa tarefa será apresentar ao distinto público roraimense o conceito de literatura virtual. Durante três dias, teremos um estande, computador e projetor à disposição para exibir blogs e sites que estimulem a leitura e a interatividade.

Serão intervenções rápidas, de 40, 50 minutos, abordando os seguintes temas: o que é literatura virtual? blogs e sites na imprensa; interatividade; montagem de um blog; exemplos de blogs e sites voltados para a literatura infanto-juvenil e adulta; direitos autorais na internet; o perigo da facilidade dos resumos da net; e o texto na net.

Sendo assim, convido todos os queridos navegantes a contribuírem com o nosso trabalho, enviando links interessantes sobre algum dos temas.

Podem ser deixados na caixa dos comentários ou enviados para os nossos endereços. Correspondência para Edgar aqui. Para o Nei, aqui.

Ah, também vamos divulgar os nossos amigos, no mais puro estilo demagógico: para meus conhecidos tudo, para quem não conheço e não gosto, nada. É, nós somos bons, mas também sabemos ser maus.

segunda-feira, abril 04, 2005

Vivendo a história

Parece título dos programas do History Chanel, né? Mas é somente uma confirmação de que estamos contemplando momentos históricos, daqueles que daqui a 20 anos serão estudados ou relembrados por pesquisadores ou reportagens sobre o início do século XXI.
Quer ver como a história está passando diante de nossos olhos?
Onde você estava na sexta-feira passada, 1° de abril, quando foi anunciada a morte do Papa João Paulo II?
Onde você estava quando Lula ganhou a eleição presidencial, levando o PT a comandar o mesmo país que o recusou durante várias campanhas?
E na manhã do ataque às Torres Gêmeas, o 11 de setembro?
E quando começaram os bombardeios ao Afeganistão e ao Iraque, você estava fazendo o que mesmo?
E na eleição do Severino, o rei boquirroto do baixo clero parlamentar, você estava onde, alheio à desgraça que estava acontecendo?
Alguém lembra onde viu pela primeira vez a notícia dos gafanhotos de Roraima, do afastamento do governador roraimense Flamarion Portela por acusações de corrupção, da morte dos garimpeiros na reserva indígena Roosevelt, em Rondônia? Da reeleição de George W. Bush? Do lançamento dos mega-sucessos O Senhor dos Anéis e Matrix?
E no último grande show de rock de sua cidade?
É a história, passando bem em frente aos nossos olhos despreocupados.

sexta-feira, abril 01, 2005

O clima e a cultura - uma teoria feita ao som de reggae

Desde os tempos áureos da civilização grega, passando por todos impérios da humanidade, teorizou-se sobre a influência da clima e da geografia no desenvolvimento das sociedades. Com esse discurso, que favorecia geralmente os seus autores, legitimaram-se a escravidão, a conquista e o colonialismo de grupos menos complexos.
Posteriores mudanças paradigmáticas nas ciências sociais apontaram para outros fatores para explicar as diferenças entre os povos. Falou-se muito em evolucionismo, (alguém se lembra aí da conversa das raças?) difusionismo cultural e um monte de outras teorias. Hoje, sabe-se que não o clima não determina a cultura. Quem diz isso são os grandes estudiosos das ciências sociais.
Mas...
Deixa estar que na quinta-feira, antes do show do Cidade Negra aqui em BV (que fica em Roraima e não em Rondônia, como o Toni Garrido gritou no começo da apresentação, para corrigir-se lá pelo final), surgiu uma nova teoria aplicável somente a este pedacinho de Brasil.
Aqui, as movimentações artísticas incomuns influenciam o clima.
Vamos às explicações:
Do nada, depois de um dia absurdamente quente, desabou uma chuvarada espantadora. Assim, de repente, como se estivéssemos na época do inverno amazônico. A sexta-feira, ainda bem, amanheceu nublada.
Fato isolado? Não.
Em janeiro, mês de vacas ainda mais magríssimas no que se refere a teatro, shows e coisas do tipo em Boa Vista, grupos de Manaus e do Rio de Janeiro vieram à cidade trazendo teatro, dança e música erudita durante dois finais de semana. Trouxeram junto chuvas e queda na temperatura habitualmente alta nesta época do ano (e no restante também, para que ninguém se engane).
Se houvesse somente o show do Cidade Negra de atração nesta semana, talvez o clima continuasse igual.
Mas nesta sexta-feira tem um show da Banda Impacto Latino no Sesc Roraima, apresentando covers de bandas e cantores latinos. No sábado e no domingo, é a vez da banda Mr. Jungle, da qual fiz parte como assessor de imprensa, apresentar-se no teatro Carlos Gomes. Ou seja, é muita coisa boa em poucos dias. Tenho medo que neve ou aconteça uma catástrofe durante este período. Qualquer coisa, minha coleção de gibis deve ser entregue ao meu priminho Lucas quando ele estiver consciente de tudo o que gastei comprando e preservando as HQs.

quarta-feira, março 30, 2005

Hábitos



Ela perguntou:
Se te encontro e te descubro, onde estará então o encanto da surpresa?

Ele calou, como ela havia previsto.

terça-feira, março 29, 2005

Meia história de uma noite completa



Foi lá pelas duas da manhã, contou-me. Havíamos bebido cada um três copos de tequila, duas margueritas, três cervejas e dançado como loucos na festa de aniversário de uma moça amiga dos dois. A nossa adrenalina estava lá em cima.

Trabalhávamos no mesmo prédio. Eu no térreo, ela no primeiro andar. Na verdade, nunca pensei que isso fosse acontecer, confessou. Mas bateu uma coragem daquelas quando vi como o seu vestido preto balançava durante as danças, que pensei: é hoje ou nunca, completou.

Pena que foi só uma vez, disse, melancólico. O nome? Não, não posso dizer. Só quero compartilhar de leve uma história, não fofocar, reclamou, indignado com minha curiosidade.

Depois daquela noite, fingimos que nada havia acontecido e continuamos trabalhando normalmente, cada um em seu setor, continuou.

Quer dizer...(expressão de dúvida) agora que penso no caso, depois de misturar tequila, margueritas e cervejas, será que aconteceu mesmo ou imaginei tudo aquilo?

segunda-feira, março 28, 2005

Citações deterministas


Disse o traficante cristão ao consumidor em tratamento:

Do pó viestes e ao pó voltarás.

quarta-feira, março 23, 2005

Da série Redatores da Fronteira, produção antiga de Zanny Adairalba para ilustrar uma semana estranha de chuvas em Boa Vista. Aos frequentadores, boa semana santa.


Texto para alguém numa tarde chuvosa



Encosto na vidraça, olho pela janela de minha sala... aqui de cima o mundo parece pequeno. O enorme vidro, molhado, me traz a sensação dos banhos de chuva da infância. Não eram prédios sofisticados, como os que vejo agora, que decoravam meus dias ... casas humildes, por trás das calçadas quebradas... ruas razoavelmente grandes e alguns paralelepípedos incompletos. As ladeiras eram nossas belas corredeiras... e brincávamos como se o mundo nos pertencesse.
Barcos corajosos, feitos de papéis, enfrentavam a fúria das águas que quase sempre os levavam para um pequeno bueiro. Quando não, eram seqüestrados por gigantes malfeitores que, mais cedo ou mais tarde, se arrependiam do ato e os devolviam aos seus destinos. A chuva continua a cair... volto a encontrar meu presente. Os prédios... tudo parece tão pequenino! Não vejo nenhuma criança a brincar. (suspiro suave) - O Rio de Janeiro não era de todo tão mau!

Obs..: Acho que a sala é aquela (enorme) do primeiro texto que te mandei.
Obs.1: Acho que hoje, não estarei no bar onde os poetas se encontram. Devo iniciar algum livro... ou ligar pra ti e ficar falando horas a fio.

segunda-feira, março 21, 2005

Relatos de um final de semana de março

Sábado foi dia de São José para os católicos. 
Foi o fim do verão também. 
E das primeiras aulas de final de semana do semestre 2005.1 da universidade. Diz a tradição que no dia de São José sempre chove. 
No meu bairro caíram somente algumas gotinhas. Mas o dia foi nublado, para compensar. 
Aliás, desde sexta-feira à tarde, deliciosas nuvens cinzas cobriam Boa Vista. Voltando à tradição, antigamente os agricultores esperavam a chuva de São José para plantar o milho que colheriam para fazer as comidas das festas juninas. Coisas de um estado que já foi mais rural e preso a superstições religiosas. 
Depois da aula de sábado, entrei numa livraria procurando um livro de teorias sociológicas. 
Checa se tem, quando chega mesmo, valeu, vou esperar a ligação que o preço pela internet é quase o mesmo, fiquei olhando o acervo. 
Daí vem a seguinte cena: A vendedora: 
- Oi, posso perguntar uma coisa? O senhor já trabalhou no Sesc alguma vez? 
Eu: - Já, faz muito tempo. 
A vendedora: - Ah, então é de lá que lhe conheço. 
Eu: - Mas faz muito tempo mesmo, coisa de anos. Como prestador de serviços em eventos. 
A vendedora: - Isso! Eu era criança e me lembro de você numa dessas mostras que o Sesc faz sobre trânsito. 
Eu, achando-me o sujeito mais velho do mundo, forçando a memória e resgatando: - Acho que era "Sinal verde para a vida". Fizemos no Objetivo e numa outra escola. 
A vendedora: - Não. Foi na minha escola. Eu estava quieta e você me olhou sorrindo e disse: "ei, estás muito séria. Sorri para mim,vai." 
Eu, lembrando de quando a verba ganha nas mostras do Sesc me ajudava a bancar as apostilhas da universidade: - Isso foi em 1997! Mas não me lembro de ter sido feita em outra escola. 
A vendedora: - É isso mesmo. Eu lembro de você. 
Eu, pensando no que fazer: - ... 
A vendedora: - Poxa, bom lhe ver.
 Eu, pensando nos eventos Brincando nas Férias e Feira de Livros, quando atendíamos mais de 300 crianças por dia: - ... 
Quis, mas não perguntei o seu nome, o que havia feito de sua vida, se dirigia bem, se estava estudando, se a livraria pagava bem. 0Só fiquei pensando em como um sorriso e uma frase haviam ficado gravados na memória daquela jovem por sete anos. 
Deu até vontade de ser gentil com todas as pessoas e dizer bom dia todos os dias, como me recomendou uma amiga certa vez. 
Ainda bem que passou logo.

quinta-feira, março 17, 2005

Discussão

Ele disse:
Quer saber? F*&@-$#!!!!

Ela respondeu:
Como é?

Ele repetiu, furioso:
F*&@-$#!!!!

Calmamente, ela retrucou:
Olha, se você vai me xingar, seja pelo menos homem de fazê-lo sem usar essas escritas de histórias em quadrinhos. Tá bem?

quarta-feira, março 16, 2005

Coisas pessoais de março de 2005

Foi a manchete de um dos jornais locais hoje:
"Ex-presidiário é executado com um tiro fatal na cabeça"
Aí, alguém me diz: se foi executado, o tiro foi fatal, né, não?
Eu, tonto de tanto trabalho e cheio de coisas para fazer, balanço a cabeça e digo: "acho que sim. Assim como é natural que alguém morra depois de apanhar muito no pelourinho e seja deixado sem assistência médica."

No dia anterior....

Segundo dia de aula na Universidade Federal. Droga de curso de sociologia que nunca termina. Comparando, pelo tempo que investi, já estava formado da outra vez.
Em três anos também já havia decorado o nome de meus colegas de sala. Agora, pouco a pouco, aprendo o nome dos atuais. Tem o.... e a...., a....., ih, acho que ainda não aprendi todos.
Mas o nome dos professores do curso já estou quase decorando.
Contudo, isso não me preocupa mais. Posso colocar a culpa no histórico familiar. Dona Maria, minha avô, contou-meu que em 1988 lecionou corte e costura durante dois meses para uma moça cujo nome nunca conseguiu decorar. Quer dizer, a coisa pode estar nos genes. Certo?
Ou pode ser culpa do calor. Afinal, dois terços do ano torramos sob um sol inclemente, bom para as plantações de soja e arroz (alta produtividade por hectare, dupla ou tripla safra, muitas toneladas exportadas e coisas do tipo), mas insuportável para os humanos. Há dias em que a pele arde.
Andar nos quentes corredores da universidade, suado, depois de um dia de trampo e de pedalar algo como dois ou três quilômetros a partir de meu local de trabalho, não ajuda muito a ter preocupação por aprender o nome dos meus companheiros de estudo.
Mas também é só aqui que o reitor da universidade te dá uma mata-leão e pergunta como você está e como foi tua viagem para o Peru.
Ou pelas bandas de vocês também se faz isso?

segunda-feira, março 14, 2005

Cronista temporariamente sem histórias reais

ou ficcionais para contar some na maior

Da redação

Os leitores do site www.edgarb.blogspot.com estavam assim, meio de banda, com a falta de novas histórias no Crônicas da Fronteira. As reclamações iam da falta de atualização à péssima vontade de Edgar em responder os comentários ou visitar outros blogs, como mandam os bons costumes do cyberuniverso.


"É um folgado. Mô segunda-feira e nada de atualizar o blog. Deve estar de ressaca. E olha que não foi na minha cantina. É isso que me deixa mais irritado", declarou Nei Costa, chefe da Cosa Nostra em Boa Vista.

Blogueira de longa data, assídua visitante do Crônicas e mineirinha comedora de queijo com breja, Luma pisa no calo e quebra tudo: "na real, o Edgar nunca me enganou. Já havia reparado que só atualizava no máximo três vezes por semana. Mesmo assim, estou preocupada com o seu sumiço."

Nossa equipe de reportagem entrou em contato com o Avery, mas ele mandou avisar que estava desfrutando da brisa que bate em sua varanda e por isso não iria comentar o sumiço. "Só sei que fui um dos principais incentivadores do rapaz. Agora, o que ele faz com o domínio não é problema meu. Mas vou mandar uma epístola para ela", afirmou o pesquisador e cybernavegante inveterado.

A equipe de reportagem gastou dinheiro pra caraca afim de tentar achar o folgado do Edgar. Ligou até para os produtores do filme Inimigo de Estado pedindo emprestado aquele sistema loucão de fiscalização espacial, mas os caras pediram muitas garantias.

"Tão loucos. Imagina que vou hipotecar meu carro pra achá-lo. Aliás, quem foi mesmo que pautou meus repórteres pra fazer isso", interrogou Luiz Valério, editor do Linha de Frente, antes de quebrar a cabeça de seu chefe de redação.

A solução foi pagar uma extra para uns policiais de folga do serviço. Em dois tempos, os eficientes funcionários estavam com a localização do cronista. ?A casa é até bonitinha, mas se fosse eu mandava pintar de outra cor?, comentou um dos investigadores.

Edgar foi encontrado deitado numa rede, na casa de um parente. Questionado pelos repórteres sobre os motivos do sumiço, olhou para os profissionais, fez cara de sono e disse que o estavam desconcentrando. "Hoje tô muito cansado. Passei o dia inteiro vendo esse caracol andar na varanda. Agora quero descansar, meu rei, que estressei e o dia foi muito quente", bocejou, antes de avisar que ia tirar um cochilo no quarto. "Lá tem ar, sabe? É mais gostoso."

Com seu estilo mordaz, Ismael diz que ficou sabendo tarde da procura. Não fosse isso, teria colocado em seus comentários ácidos de toda segunda-feira. "Já vi blogueiros fazendo coisa pior. Deve ser o clima. Mas até abril deve voltar a chover", disse o dono de O Malfazejo.

A internautas que pretendam processar Edgar pelo consumo vão de impulsos eletrônicos, Rah, sua advogada, avisa das praias do Nordeste: "não se metam com o bichinho, não. Vão caçar encrenca com outra advogada, por favor. Se largar o meu coco, vocês vão ver."

Flogueira das mais gatonas da rede e correspondente de O Diarinho, jornal mais malcriado do mundo, Carlotinha Cavalheiro diz ser da mesma gangue da Rah. "Não se metam com meu indiozinho. Quem tocar no filho único de dona Neide e tio postiço do Bê, vai levar uns muque nos chifres."

quinta-feira, março 10, 2005

As aventuras de Chicão

A cantada


Chicão - Tenho algo para te dizer. Quando você está perto, não consigo deixar de notar a tua presença. Há algo em ti que te faz diferente, que chama a atenção e te destaca no meio de qualquer grupo de pessoas. Enfim, é impossível não te perceber.
Maria - Nossa! (suspiro) E o que é, Chiquinho?
Chicão - Teu mau hálito...

quarta-feira, março 09, 2005

Sob o sol

Pulsa intermitente, no peito do homem,
Legítima fúria de animal acuado.
Sob o sol das quatro da tarde
Chora no corpo da amante.
Dúvidas passam na cabeça do homem.
É fantasia maligna ou crueldade real?
Desvario da idade, garrafas a mais,
Efeito das marés ou do orgulho do possuir?
O medo cresce
Tomando membros e tronco do homem ajoelhado
Na poça de lama tingida de vermelho.
O vento traz mensagens
De espíritos vingativos e traiçoeiros.
O homem não as entende
É só tristeza o que forma as suas lágrimas.
Agora, a justiça deve ser concluída,
Murmuram fantasmas.
Esqueça felicidades passadas,
Risos, beijos, promessas.
Esqueça tudo o que disseram sobre amor,
Seja o divino, o próprio ou o dedicado aos outros.
Esqueça a beleza do amanhecer depois de uma noite de paixão,
Sussurram no seu ouvido zombeteiros deuses.
O vazio toma conta dos pensamentos do homem
E as palavras perdem o sentido original.
Agora tudo está fora de alcance
E pode ser visto apenas de relance.
Então, com apenas um movimento,
Rápido, brusco, surpreendente,
O homem consegue sua paz.
Pulsa, sufocando o ambiente,
Permanente e estranha paz sob o sol das quatro.

(publicado originalmente há muito tempo no Zhuada)

terça-feira, março 08, 2005

No Dia Internacional da Mulher, com todas as suas motivações históricas, sócio-econômicas e culturais, com todas as pessoas escrevendo belos poemas e loas, só me resta escrever isto:

Desejo do fundo de meu coração que todas as mulheres que são casadas, namoradas, amantes ou caçadoras tenham uma boa sessão de amor neste dia.
Desejo que nenhum chefe brigue com elas;
Desejo que tenham aumento de salário;
Desejo que possam comer o quanto quiserem de seu adorado chocolate sem medo de engordar;
Desejo que o biquíni as deixe mais bonitas;
Desejo que a autoconfiança as leve até onde quiserem chegar;
Desejo que se quebre o pulso de todos os homens que batem em mulheres;
E que a coragem de denunciar agressores tome conta das mulheres agredidas.

sábado, março 05, 2005

Da série Ouvidos na rua


Declarações a respeito de confiança e amizade, por duas adolescentes pedalando em uma só bicicleta.

- Ô, sua traíra, tu trairou comigo.
- Não, não. Nada a vê essa parada.
- Trairou sim. Mô trairagem que tu fez.

(E viva a flexibilidade da linguagem oral.)

sexta-feira, março 04, 2005

Latinidade

Uma amiga disse-me certa vez que todas as canções latinas eram de dor-de-cotovelo. Exageros descontados, é certo que por conta disso, separei alguns trechos de músicas de vários estilos para ver se a teoria bate.
Da Colômbia, Juan Pablo Valencia, compositor de vallenato, gravado por Carlos Vives, teorizando sobre confiança e amizades:

Como Dios en la tierra no tiene amigos
como uno no tiene amigos anda en el aire

O guatemalteco Ricardo Arjona, apesar de ser um romântico full time, também faz outros tipos de letra, questionando o que alguns chamam de imperialismo e outros de integração:

Las barras y las estrellas se adueñan de mi bandera
y nuestra libertad no es otra cosa que una ramera
y si la deuda externa nos robó la primavera
al diablo la geografía se acabaron las fronteras.

Outra aqui, para aqueles que gostam de ajudar e ser ajudados:

no es bueno el que te ayuda
sino el que no te molesta


Abrindo passagem para o romantismo de Shakira Mebarak:

cuántas veces he intentado
enterrarte en mi memoria
y aunque diga ya no más
es otra vez la misma historia
porque este amor siempre sabeh
acerme respirar profundo
ya me trae por la izquierda
y de pelea con el mundo


E para suas pragas jogadas contra aquele que a trocou por outra:

cuando las arrugas le corten la piel
y la celulitis invada sus piernas
volverás desde tu infierno
con el rabo entre los cuernos
implorando una vez más


E agora, um canto do panamenho Rubén Blades contra a opressão:


¿Adónde van los desaparecidos?
Busca en el agua y en los matorrales.
¿Y por qué es que se desaparecen?
Porque no todos somos iguales.
¿Y cuándo vuelve el desaparecido?
Cada vez que los trae el pensamiento.
¿Cómo se le habla al desaparecido?
Con la emoción apretando por dentro.

(Essa aqui é cantada pela banda Maná no Acústico MTV)

quarta-feira, março 02, 2005

Ando mais prosa que verso.
Correndo contra o tempo e perdendo sempre.
Ando mais verão que chuva.
Ou menos face que pensamento.
Menos letra que imaginação.
Se não ando, me arrasto.
E caio, e me lambuzo.
Enlameio.
Afogo.
E ressuscito.
Para nada.
Então...
Ando, apenas.

segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Almoço zen



Na seção de poesias, a moça do balcão pergunta se o senhor vai querer comprar alguma produção. Desiludido, responde que está a fim de um pedaço de sonetos. Bota também umas gramas do haicai mais barato que houver, completa.

Ah, este mundo cão, onde a imagem não vale mais o que custava antes do reajuste governamental. Agora o preço subiu. Imagem real, tanto; real, porém manipulada, tanto a mais.

Nem o sexo é como antigamente. O bom senhor, cuja única religião foi sempre um corpo de mulher, apela agora para uma simpática boneca inflável e umas pílulas que lhe perturbam o coração, na avaliação insistente do médico da família.

Com a poesia na sacola de plástico, pensa na filha, fugitiva de amor, cruzando o estado às pressas para entocar-se nos braços de um escritor liberal e dândi, autor de crônicas imorais, verdadeiros atentados à família, aos bons costumes e à gramática. Melhor, sobra espaço na casa.

Será que não teria sido melhor comprar um pouco de concretismo e versos alexandrinos?

Talvez hoje saia para fumar um cigarro com os outros bons senhores da vizinhança. Nada muito exposto, que não convém. Depois, um cineminha, pipoca, refrigerante e gritos para que ninguém assista ao filme em paz.

Vai fazer um belo almoço. No cardápio, tem poética, metafísica e religiosidade. Para temperar, pitadas de infantil crueldade cotidiana. Pensa até em escrever à editora do cunhado e mandá-lo para o inferno. Mas hoje não. Hoje não tem sobremesa, só um drinque de muito cinismo e descaramento.

Parece que vai ser bom.

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

Às vezes

Às vezes, é melhor não fazer nada, esperando apenas que o tempo traga a sua resposta definitiva aos questionamentos. Só a idade, para exemplificar, mostra como muitos adolescentes comportam-se como idiotas enquanto pensam agir como senhores do mundo. Também te lembra que aquele cabelo estranho invejado por todos, hoje não passa de uma feia foto que se esconde na última gaveta.
Às vezes é melhor pensar mais antes de agir e reagir. É bom lembrar que o eu de hoje é diferente do eu de ontem e de anteontem. Por isso, não adianta mais falar ?se fosse em outro dia, você veria?.
Às vezes, é melhor ficar indiferente e não acreditar muito na humanidade, que alguma coisa ela fez para chegar aonde está. Esquecer que aquele a te afundar já recebeu tua ajuda para nadar. Ficar apenas lembrando do entardecer da cidade pequena, tão longe da fumaça de outras terras.
Às vezes, o bom mesmo é rir das palhaçadas do teu vizinho, do guarda que não sabe multar, da buzina estridente do carro daquele velho senhor. Sentir a vida valendo a pena mesmo quando a chuva prejudica o teu encontro com aquela pessoa especial.
Às vezes, as melhores conversas são as tidas sob a chuva, sem segundas intenções, sem cobranças de decoro ou excesso de intimidade, apenas no equilíbrio de um bom papo.
Às vezes, o melhor é terminar aquele caso de amor e deixar o coração correr livre, à procura de um novo porto, ouvir música clássica e beber vinho, permitindo-se a extravagância de colocar gelo na taça sem pensar na cara de horror dos amantes da bebida.
Às vezes, é melhor engolir o orgulho e pensar em como é bom pedir desculpas por aquela bobagem (no seu entender) que os outros consideraram grave ofensa.
Às vezes, bom mesmo é bater, é verdade, desprezando a teoria do amor ao próximo.
Todas as vezes, escrever um bilhete elogiando a ação do próximo é melhor do que telefonar para gritar pelos erros cometidos.
Às vezes, mas só às vezes, rir não é o melhor remédio e cantar não espanta os males.

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

Da série Ouvidos na Rua

Florianópolis, janeiro de 2005, verão. Na loja da Americanas no centro da cidade, procuro discos em promoção. Atrás de mim:

- Ei, mulher tu tá sumida!
- Oi, meu amor! Tudo bem contigo?
- Nossa, como tás queimada, bronzeada.
- Pois é, querida. Vou todo dia à praia. Desempregada, mas em alto estilo.

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

Classificados

Na seção de vendas do jornal, o anúncio de uma cama tubular branca sem nenhum arranhão, um colchão de boa espuma e travesseiros que adoçam o sono.
Na perspectiva de vender, João, que deseja livrar-se das recordações de seu último caso de amor. A cama, o colchão e os travesseiros ele adquiriu para ter conforto nas muitas horas que passariam juntos, mas não deu certo. Ele descobriu que toda a estrutura atendia não somente a ele, mas a terceiros, a quartos...
Bem, pensa João ao beber um copo de cerveja na mesa do bar, talvez não valha a pena desfazer-se de tudo. Afinal, a morena que está piscando para ele não vai querer conhecer seus beijos deitada no chão ou na rede da varanda.

quinta-feira, fevereiro 17, 2005

Figuras


É tão irritadiça que xinga o vento quando este desarruma seus cabelos na rua.


É tão calmo que só percebeu seu enfarte depois de três dias e uma briga com o vizinho.


É tão bonita que a maioria dos homens broxa quando vê o seu corpo nu.


Era tão rico que acendia seus charutos com notas de cem dólares.