segunda-feira, junho 12, 2006

Histórias de índio: uma década e meia no Brasil (Ou: vamos acabar com a lenga-lenga para começar a falar da copa e do arraial Boa Vista Junina)


Cheguei no domingo 3 de fevereiro de 1991. Na segunda à tarde, lá estava eu, cursando a oitava série, em uma nova escola, novo país, nova língua e nova gramática, tanto de texto como de comportamento.

Larguei no meio o primeiro ano do ensino médio. As notas em física não dariam para aprovação nem que fosse para recuperação, pensei à época. É claro que a conta estava errada, mas já era tarde...

Se bem me lembro, durante todo o ensino médio, não houve ano em que não ficasse na berlinda em alguma matéria. Aliás, o resultado do vestibular saiu justamente na manhã do último dia de recuperação. Apesar da fama de bagunceiro e pouco afeito a prestar atenção nas aulas, fui um poucos (entre 5 e 10) alunos de minha escola que conseguiram entrar na universidade naquele ano.

A vontade era de cursar filosofia, psicologia ou fisioterapia. Mas em 1995 apenas a Universidade Federal de Roraima ofertava cursos superiores no Estado e nenhum desses estava na lista. Pelo gosto com a leitura, fiquei entre letras e jornalismo. Optei pelo segundo quando vi na ementa do curso uma disciplina chamada "Comunicação Comunitária". Acho que fiz uma boa escolha.

Em terras brasileiras aprendi a jogar (pessimamente) vôlei e andar de bicicleta e mobilete. Desleixado, somente tentei dirigir carro há quatro anos e passei quase 24 meses entre fazer o exame de habilitação e me lembrar de pegar a CNH no Detran.

Cabelo comprido, bermuda, camiseta e uma mochila nas costas. Esse é o meu visual preferido até hoje, apesar de tudo.

Aos 18 anos, tive a minha primeira desilusão amorosa, com um fora daqueles. Mas acho que a grande perturbação foi ter sido justamente no auge das músicas melosas do pagode romântico. Daí, não tinha como superar rápido.

Entre 1991 e 1998, quando comecei no extinto jornal O Diário como repórter, trabalhei como office-boy, datilografei trabalhos para colegas, alfabetizei adultos, vendi fotos para capoeiristas e fui monitor de várias oficinas do Sesc. Grana pouca, economia muita.

Estive na Guiana, Peru e Bolívia, passei um mês em São Paulo esperando o resultado do concurso de estágio para novos repórteres do Estado de S.Paulo, aplaudi Fidel Castro e vaiei Zé Dirceu no Ginásio Mineirinho durante um congresso da Une, desfrutei das praias e do frio de Florianópolis, superei os 2.875 metros de altitude do Monte Roraima e andei por garimpos de ouro do outro lado da fronteira venezuelana.

Já escrevi para revistas regionais, fui professor substituto da UFRR, ativei o blog Crônicas da Fronteira em 7 de julho de 2004 e estou no mesmo local de trabalho desde 1999, atualmente no maior posto hierárquico do setor.

Algumas pessoas gostam muito de mim, muitas me detestam profundamente. Graças ao cargo que ocupo no momento, meus amigos dizem que a carga de veneno e inveja que despejam sobre o meu nome aumentou 100%. Mas como a vida é assim mesmo, vamos vivê-la, sem medo de urucubaca.

Taí, 15 anos de vida em pouco mais de três mil toques. É a vida de um índio em terras estrangeiras.

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