quarta-feira, junho 07, 2006

Histórias de índio: da infância à migração

Até a quarta serie sempre fui um dos melhores (e menores) alunos da sala. Na Venezuela, a nota máxima é (ou era, tantas mudanças acontecem e a gente não fica sabendo) 20. Eu, na base de muita pressão maternal, batia sempre 18, 19 e 20. Ai de mim se tirasse algo abaixo disso...


Em Guasipati, nome de meu pueblito¸ só havia rádio AM naquele tempo distante. Todos os dias ouvia a radionovela "Taguari, el rei blanco de la selva" e outras. Também ouvíamos à noite o programa de recados de uma rádio AM de Boa Vista. Numa era pré-internet e sem grana para telefonar periodicamente, "O Mensageiro do Ar" alegrou muito a minha mãe com as notícias da família.

Ali pelos 11, 12 anos comecei a jogar bola com os amigos todos os dias. Perna-de-pau no ataque, era bom na defesa, mas com certeza nunca chegaria a ser profissional. O bom dessa época é que ampliou o meu círculo de conhecidos, já que andava em quase todos os bairros do pueblo jogando, e aproveitei para conhecer outras duas cidades. O ruim era ouvir o maldito comentário: "Nossa, mas como é possível que um brasileiro jogue tão mal?".

Foi mais ou menos nessa época que trabalhei vendendo picolé. Passar o dia na rua me ajudou a ganhar malícia e deixar de ser muito bobo. Ganhava por semana o mesmo que um operário de empresa mineradora. Mesmo assim, ai de mim se saísse para passear na pracinha ou na rua de cima e chegasse depois das 21h. Dona Neide não perdoava atrasos.

Nessa época, ainda continuava um covar...quer dizer, pacifista, evitando as brigas tão comuns entre os moleques de minha idade. O paradoxo é que nas três ou quatro em que me meteram, acabei levando a melhor. Daí, ninguém mais se metia comigo e eu aproveitava para não procurar encrenca com ninguém.

Por ser fominha de bola na escola, repeti o primeiro ano do liceu, equivalente no Brasil à sétima série. Pense na surra e no castigo imposto pela dona Neide... O pior é que havia aprovado em Geografia, mas o professor errou na hora de jogar a nota. Em compensação, no ano seguinte fui um dos melhores da turma.
Ah, como peguei bomba em quatro ou cinco e não fiz o exame de recuperação, passei um ano com aquelas matérias apenas. Sobrava um tempo louco para jogar futsal.

O time da Sétima B, com o complicado nome de "Parepacupa", chegou a ser vice-campeão do torneio do Liceu. Perdemos apenas para os velhotes do terceiro ano, todos da base da seleção municipal de futebol e futsal. Mas perdemos na moedinha, depois do jogo, da prorrogação e dos pênaltis. Maldita moedinha!

Por esses meses, percebi que Guasipati não era o meu lugar. Sem emprego, sem oportunidade de fazer os cursos profissionalizantes que quase todos os meus conhecidos faziam no Ince (o Senai da Venezuela), sem vocação para peão e sem vontade de ser mais um jovem venezuelano que teria na cerveja Polar e nas apostas de sinuca, jogos de azar e corridas hípicas o seu divertimento ? além do risco de casar cedo e ter logo 2 filhos nas costas, o que aconteceu com 98% dos meus amigos do bairro ? decidi que era hora de mudar os ares.

Dona Neide não queria voltar. Apesar da vida dura, já estava acostumada com a Venezuela, recomeços sempre são difíceis, blá blá blá. E eu pensando: "quer ficar, fica. Eu vou". Acabou voltando ao Brasil para acompanhar o filho único em seu surto de loucura.

Chegamos no dia 3 de fevereiro de 1991, carregando roupas, ventilador e centenas de gibis. Estava com 14 anos e oito meses de idade. O resto da história, só em outro post, se houver interesse manifesto.

segunda-feira, junho 05, 2006

Histórias de índio: infância


Nasci apressado, antes dos nove meses de gestação. Para aprender a controlar a ansiedade, passei uns dias na incubadora.

Naquele dia, conta minha avó Maria José, chovia muito. Era junho, quando o inverno amazônico já está com tudo, elevando o nível dos rios e das lagoas.

Conta dona Neide que a minha primeira palavra escrita foi "Deus".

Ainda lembro daquele gibi do Scooby Doo em português que a professora pegou no jardim de infância e nunca mais devolveu.

Na Venezuela, todos me chamavam de "brasilerito". Quando vinha passar as férias no Brasil, me chamavam de "mira, muchacho".

Entre os seis e oito, acredito, tive hepatite e fui considerado caso perdido pelos médicos. Com muito carinho de mãe, ervas medicinais, frutas e uma promessa à Santa Virgen de la Pastora, sobrevivi.

Aos nove anos queria ser dono de uma banca de revistas.

Acho que entre os 10 e 11 anos era apaixonado pela Blanca num mês e pela Rocio no outro.

Quando moleque, lia e entendia bem o português. Pensava que falava bem, mas era uma ilusão.

Fui um moleque quieto demais, chorão demais, protegido demais.

Fui beijado na boca, com língua e tudo, pela primeira vez aos 10 anos. Fiquei de olho aberto para ver que história gostosa era essa. Foi bom...

quarta-feira, maio 31, 2006

Histórias de índio e notícias da fronteira

Metade da vida em pais estrangeiro e um tantinho a mais em solo brasileiro.

Frio roraimense à noite...

O carro sai da oficina hoje.

Final de semana tem pós.

Prenderam 15 quilos de cocaína no final de semana na fronteira com a Venezuela. Desta vez foram pegos um colombiano e um cara da África do Sul.

Hoje tem show do Fagner.

Ando sem inspiração para fazer versos ou escrever prosa.

O pagamento saiu hoje. As contas já estão vorazes esperando por mim lá fora.

Quando chove, chove. Quando o sol abre, a pele arde.

Adília e Rodrigo, amantes amorosos e meus rivais no jogo Perfil 3, decidiram fazer mais do que amar-se e criaram um blog de poesias: Unir-versos.


O que te irrita mais: chegar aqui e ver a mesma postagem ou ler uma postagem meia-boca?

Alguém sabe como conseguir na net todo o texto da peça de Bertolt Brecht chamada "O declínio do egoísta Johann Fatzer"?

Na fronteira com a Venezuela abriram um posto que vende gasolina a um real por litro para brasileiros. Mesmo aumentando o preço em 900%, quando comparado com o valor cobrado aos venezuelanos, ainda é muitíssimo mais compensador que os R$ 2, 99 de Boa Vista. Pena que o posto fique a 220 quilômetros.

quinta-feira, maio 25, 2006

Divagações em uma aula


O novo não é eterno
Modernismo resposta processo
Acordos incorpora desejos
Estética recorte materno
Nostalgia fragmentos acesso
Contrários lamentos lampejos
Memórias pós-modernismo fé
Horários tempo palestinos
Lixeiras seios filosofia
Aves idéias touché
Regras bíblias destinos
Razões contexto maresia.

.........

E outros comentários

Chove, faz sol, esquenta, esfria...

O carro está na oficina. De carona para o trabalho e de bike para a universidade.

Projeto Pixinguinha no domingo. 45 minutos de atraso, as de sempre falhas no som e um espetáculo fantástico de música com Chico Aafa, Luiz Gayotto e o grupo instrumental paulista Qu4tro a Zero.

Editar uma revista para um evento não é fácil. Como será o nível de adrenalina dos editores das semanais?

O retorno à bike me leva a antigas paisagens que não via desde o ano passado. Como a dos carros estacionados dentro do parque Anauá depois das 21h e seus bancos abaixados.

O sol? Como é que anda esse tal de sol? A única prova que tenho de sua existência é uma brecha na cortina da sala.

Aulas de especialização, aulas de graduação. Estudar tanto deve valer a pena.

Minha afilhada aniversaria hoje. Onde está o número de minha comadre?????

Maio e junho, tempo dos geminianos. Aproxima-se mais um aniversário...deve ser por isso que as rugas e os cabelos brancos estão ganhando espaço...

quinta-feira, maio 18, 2006

Dia de feira

Final de semana chegando, todos se preparam para fazer as compras. Vaí uma salada aí?



Estas fotos são da Feira do Garimpeiro, um mercado a céu aberto que se instala na avenida Ataíde Teive, a principal via de Boa Vista, nas manhãs de domingo. Milhares de pessoas passam pelo local.


Creio que cinco ou sete quadras são ocupados pelos comerciantes. Vende-se de tudo, até produto vencido a um real por gente desonesta.

terça-feira, maio 16, 2006

Por falta de tempo e vontade de escrever, a Ed Borges Letras & outras crônicas apresenta sua mais nova série: Imagens da Fronteira.


A alma do negócio

Sem maquiagem, sem artimanhas, sem linguagem subliminar e, com certeza, sem nenhuma sutileza, algumas empresas garantem o seu espaço no mercado.


quinta-feira, maio 11, 2006

terça-feira, maio 09, 2006

Perfis de maio


Em todos os dias de sua vida, desejou ser engraçado. Morreu como um impertinente.

Nunca declarou o seu amor àquela moça. Além da paixão reprimida, a Receita Federal o classificou como sonegador.

Dizia que era fácil de amar, bastava querer...e pagar o preço justo. Afinal, alguém tinha de sustentar os seus gostos.

Pediu perdão a Deus por todos os seus pecados. Na falta de resposta positiva, perguntou se havia possibilidade de pagá-los em suaves parcelas.

Era tão melancólico que achava animadas as músicas de motel.

sexta-feira, maio 05, 2006

Especulando...


Se não houvesse decidido vir morar no Brasil em 1991...
Se não houvesse reprovado um ano e largado outro no ensino médio...
Se tivesse afinidade com números ou tivesse escolhido letras em vez de jornalismo...
Se fosse herdeiro de uma fortuna, sem maior trabalho que descobrir como desfrutar meu dinheiro...
Se não conhecesse a Silvany e ela não me avisasse daquele estágio no jornal...
Se o chefe tivesse detestado o primeiro texto que lhe entreguei...
Se nunca aceitasse o convite para acompanhá-lo na nova função na prefeitura...
Se perdesse meu emprego quando mudou o gestor municipal...
Se houvesse aceitado uma daquelas propostas furadas de emprego que recebi...
Se a maldade lograsse sempre seus objetivos...
Se não houvesse conhecido a Zanny...
Se ela não prestasse serviço numa fundação ligada ao município...
Se ela não virasse minha namorada...
Se não fosse compromissado com o trabalho...
Se este ano não houvesse eleição e uma tal de desincompatibilização...
Se não tivesse sido promovido...
Se não houvesse arraial em junho...
Se a tal da revista do arraial fosse responsabilidade somente de outras pessoas...
Se tivesse desmarcado a reunião com Zanny e Chiquinho para falar da revista...
Se o motorista deles ficasse só um pouco mais depois das seis...
Se o motorista de meu setor avisasse quando vai embora...
Se tivesse deixado eles irem embora de táxi e ficasse até mais tarde como sempre...
Se o outro motorista respeitasse a preferencial e a placa de trânsito...
Se os dois dirigíssemos mais acelerados...
Se o Chiquinho não se fantasiasse de agente funerário, atraindo urucubaca...
Se não fosse o grito de alerta da Zanny...quem sabe...
Talvez não fosse apenas um acidente com danos materiais no meu pobre Gol...



quarta-feira, maio 03, 2006

quinta-feira, abril 27, 2006

Notícias da fronteira


Roraima no vídeo

Domingo, 30 de abril, a TVE apresenta o documentário "Nenê Macaggi - Roraima Entrelinhas", que aborda a vida de Nenê Macaggi, escritora e garimpeira, a cultura regional e as relações entre os pecuaristas, garimpeiros e indígenas.Quem quiser dar uma olhada nas imagens da fronteira, é só ligar o televisor às 23h, horário de Brasília, 22h em Boa Vista.


Desintrusão

No município de Pacaraima, norte de Roraima, está rolando confusão. Cerca de 300 agentes da Polícia Federal acompanham técnicos do Incra e Funai no processo de avaliação de benfeitorias nas fazendas e vilas que se encontram na área indígena Raposa-Serra do Sol, que tem cerca de 1,8 milhão de hectares e abriga cerca de 15 mil índios das etnias Macuxi, Taurepang, Wapixana e Ingarikó.
O governo federal quer concluir logo o processo de desintrusão da área, o que signfica retirar todos os não índios da reserva.
Esse processo gera desde a semana passada notícias, acusações, fotos e charges de todos os tipos nos veículos de comunicação locais (Podem ser acessados clicando aí ao lado, na lista "Mídia Roraima"). Os maiores reclamantes da retirada são os arrozeiros, capitaneados por Paulo Quartieiro, prefeito de Pacaraima e inimigo número um dos índios que defenderam a área contínua, e políticos que xingam o presidente Lula de "vendilhão", "entrega pátria", "capacho das potencias internacionais" e outras gentilezas que só se dizem em casa mas não se repetem na rua. Ou, no caso, em Brasília.

Para ter mais informações, clica nesta pesquisa do Google.

Leia aqui a opinião do site Rota Brasil Oeste sobre o processo:


"A homologação da reserva Raposa Serra do Sol coroa um processo de luta de mais de 30 anos que envolve as etinas que vivem na região, sociedade civil, organizações religiosas e muita disputa política. Ao longo dos anos, a grilagem de terras, a exploração da mão de obra e, principalmente, o preconceito ameaçam uma população de 15 mil índios - metade da população indígena de Roraima.
Mesmo com as chamadas ressalvas, esta pode ser considerada uma vitória dos direitos indígenas. Agora, por exemplo, terão que sair da região as fazendas de arroz. Os donos destas terras são acusados de grilagem, de degradar o meio ambiente e de aliciar índios para defenderem sua permanência na regiaõ.
No entanto, permanecem os desafios de assegurar na prática a terra aos índios, de diminuir a violência e estimular a integração e resgate cultural dessas comunidades. Para tanto, seguem como obstáculos as forças políticas do estado que fundaram enclaves como o município de Uiramutã, mantidos pela homologação feita pelo governo. A vila, construída ilegalmente depois que a reserva já estava demarcada, foi apenas uma das manobras de políticos locais para tentar evitar a homologação da reserva. "

....


Pois é, pois é, pois é. A homologação é um ato que gera conseqüências complexas, fáceis de serem analisadas de forma tendenciosa e passional. Por isso, os ânimos aqui estão exaltados e as discussões sobre o tema são comuns em todos os lugares, em todas as classes sociais. Em resumo, é a assunto da semana, muito mais importante que o deputado que pediu ressarcimento de R$ 60 mil da Câmara por gastos com combustível.


Bom, agora vou descansar que segunda é dia do trabalhador...

segunda-feira, abril 24, 2006

Coisas de Boa Vista


Em um dia de trânsito pesado, demoro seis minutos para sair de casa, atravessar quatro bairros e chegar ao trabalho. Quando ia de bicicleta para a universidade, o percurso era de cinco bairros em nove, dez minutos.

Terminou oficialmente o semestre 2005.2 da Universidade Federal de Roraima. O mesmo semestre que começou no ano passado. Ninguém agüentava mais ir à aula. E eu, que pensava estar quase concluindo sociologia, descobri que ainda faltam quatro disciplinas, incluindo a monografia. Achava que eram apenas duas.

Na sexta passada amanheceu chovendo. Sábado e domingo o sol imperou.

Domingo, enquanto espero na orla Taumanan que a missa da igreja matriz termine para levar a minha avó para casa, ouço uma revoada de garças na escuridão que cobre o rio Branco. Longe, fogueiras indicam que ainda há banhistas no banco de areia que chamamos de praia Grande.

segunda-feira, abril 17, 2006

Visite Roraima, dê um pulinho na Venezuela e suba o monte Roraima...



Pessoal, não fundei uma agência de turismo. É preguiça e falta de um bom assunto para escrever mesmo. Por isso, estou colocando estas fotos de uma trilha que fiz em 2002 para subir o Monte Roraima, onde as fronteiras da Venezuela, Brasil e República Cooperativista da Guiana se encontram. Mais dados sobre o acidente geografico no tio Google.

Como não estou conseguindo dar espaço e isto demorou mais do previsto, vão as fotolegendas deste jeito:
foto1: aldeia San Francisco de Yuruany, dos primos Pemóns. Tudo índio, tudo parente.
foto 2: Eu e o monte Roraima, faltando um dia e meio de caminhada.
foto 3: Rio Kukenan em primeiro plano. Montes Kukenan (e) e Roraima (d) ao fundo.
foto 4: Emoções aquáticas na travessia do rio...
foto 5: Faltam somente algumas horas e chegamos ao topo...
foto 6: Troço cansativo chegar aos mais ou menos 2.800 metros de altitude, guri...
foto 7: Marechal Rondom esteve nesse mesmo lugar no começo do século passado e fez a medição do marco tríplice das fronteiras. Aposto que não estava chovendo tanto...











terça-feira, abril 11, 2006

Fotos de Boa Vista



Praça do Centro de Boa Vista, onde ficam o palácio Senador Hélio Campos (residência do governador do Estado), a Estátua do Garimpeiro (monumento erguido na década de 1970 para homenagear estes trabalhadores) e a pracinha do Coreto. Ao fundo, o rio Branco.



Visão oposta à foto anterior. Em primeiro plano, o rio Branco. Dá para ver o leque previsto no projeto de urbanização implantado na cidade na primeira metade do século passado. Depois, tudo cresceu de outro jeito. No meio, a praça do Centro Cívico.

Orla Taumanan, um dos principais pontos turísticos da cidade. Inaugurada em julho de 2004 pela ex-prefeita Teresa Jucá. Fica no mesmo local onde atracavam os barcos para deixar mantimentos na fazenda que deu origem à cidade.

Update

Muitas outras fotos aqui.

quinta-feira, abril 06, 2006

Bendita chuva



Choveu à noite. Quando o sol acordou, Boa Vista ainda sentia alegria com as gotas de água vindas do céu. O calor afastou-se um pouco, chateado por não ser mais o dono absoluto do pedaço.
No que é possível nas savanas amazônicas, a noite foi fria. Fria de um jeito nortista, claro. Nada parecida com uma Florianópolis tomada pelo vento sul, mas agradável.
Lá fora, pela manhã, o dia estava ligeiramente nublado. Adoro acordar em dias assim. Pena que não dá para ficar eternamente na cama.

terça-feira, abril 04, 2006

Universo em expansão


O tempo corre, mudanças aparecem, o universo se expande e a nave parece deslizar sobre ondas de poeira estelar.
Lá, bem longe, alguém passeia, outros riem, alguns apontam o dedo e jogam dardos em alvos imóveis.
A música aparece bem baixinho, sem incomodar ou ser incomodada. Ninguém diz que seria assim, mas também ninguém disse como seria. E o abismo caminha e pára. E as águas do rio Branco, onde à margem direita surgiu Boa Vista, parecem abrir-se apenas para ouvir uma risada de criança.
Aparece no jornal uma notícia para quem acredita na fé como modificadora de vidas e saúde. Aparece um fantasma na janela de casa. Pega uma pedrada na testa para deixar de ser enxerido.
Como já foi dito, é abril e o sol do meio-dia queima as almas e as costas de quem o desafia. Aqui dentro, as letras correm, se escondem e gritam bem alto por liberdade e paz. O universo expandido é infinito, imprevisível e agradável...

quarta-feira, março 29, 2006

Hum...

Sim, eu sei, a casa está criando teias de aranha. Sim, eu sei. Quase não visito ninguém. Claro que sei que postar a cada seis ou sete dias não é legal. Afinal, quem gosta de ver uma e outra vez o mesmo post?
Mas o tempo anda tão curto...
E olha que minha mão (essa aí da foto) pouco tem saído de cima do teclado. Aliás, é tanto tempo sentado que estou ganhando peso de novo. Mas depois que vi como o ator principal da novela Bang-Bang está meio gordinho, posso dizer "Ok, estou sim com uma barriguinha ao estilo ator de novela da Globo" e não vou me sentir ridículo (muito).
Então é isso: o que a boca ventania, o corpo consciente.

segunda-feira, março 27, 2006

Renúncias



De repente, ela parou e disse:

- Tudo bem, já basta! A partir de hoje acabo com minhas atividades e prazeres ilícitos!

Ao seu lado, surpreso com a determinação, ele apenas balbuciou:

- Como assim? Quer dizer que...

No mesmo tom, ela repetiu:

- É isso mesmo! Por mais que seja bom, acabou. No more coisas ilícitas!

Ele apenas conseguiu dizer "mas, mas", enquanto a viu atravessar a rua cheia de certezas, deixando-o dono de dúvidas sobre quais eram essas coisas ilícitas e, principalmente, quem era aquela mulher.

quinta-feira, março 23, 2006

Vidas



Tentou passar incólume pela vida. Mal conseguiu atravessar a porta sem esbarrar no sofá.
......
Esperou a vida toda por um amor fabuloso. Teve de se conformar com o que apareceu.
......
Viveu tentando ser diferente. No fundo, foi igual a todo mundo.
......
Sempre acreditou em um futuro melhor para o país. Na primeira boa oportunidade foi morar no estrangeiro.

sábado, março 18, 2006

Jornal Hoje, sábado,18 de março


Americanos jogam bombas nos rebeldes iraquianos

Estudantes franceses voltam às ruas para protestar contra uma lei que prejudica trabalhadores.

Gripe aviária. Também chamada de gripe do frango.

Conservação ambiental, moradores envolvidos, refúgio para ecoturistas.

Morte do ex-presidente da Iugoslávia. Imagens ao vivo da Sérvia. 50 mil choram o morte do "carniceiro dos Bálcãs".

Receita Federal libera mais um lote.

Como contribuir: simples ou completo?

PMDB em guerra interna por conta das prévias para escolher se sai com candidato próprio ao governo ou não.

PT discute o quadro político nacional e a crise com o Palocci, o conservador.

Encontro Nacional de Teatro de Rua em Angra dos Reis. Arte e alegria.

Acabou o jornal. Agora vou carregar as compras lá pra casa.


quinta-feira, março 16, 2006

Notícias rápidas da aldeia

O negócio tá corrido por aqui. Por conta do desmatamento para áreas de pastagens e plantio de soja e arroz, a caça está ficando cada vez mais distante. Daí, já viu, os homens da tribo estão saindo de manhã e retornando à noite, sem tempo para postar mais rotineiramente.

A cidade estava menos quente. Depois de um mês e pouco, choveu um pouquinho dia desses. Mesmo assim, às 8h já está insuportável o calor. É por isso que odeio dias de céu azul.

Minha avó completou ontem 80 anos de idade. A língua continua afiada e o corpo crescendo.

A Associação Cultural Angola Palmares conseguiu trazer de Salvador os mestres de capoeira Nô e Lázaro, manda-chuvas do grupo Palmares no Brasil, para uma semana de oficinas de movimentos, canto e instrumentos. Nô, com 61 anos de idade e 55 de roda, ainda agüenta jogar várias vezes seguidas com alunos dezenas de anos mais novos. É impressionante. Será sábado o VIII batizado e troca de cordas do grupo.

Já disse que está quente? É preço que se paga por morar na parte do hemisfério norte que fica perto da Linha do Equador.

A polícia continua fechando pontos de venda de gasolina venezuelana. Ano passado pegaram cerca de cem mil litros na estrada entre Santa Elena de Uairén e Boa Vista. Há quem ironicamente diga que todo esse trabalho coíbe o livre comércio entre os países e que assim não haverá Mercosul que agüente.

Acho que para postar com mais regularidade, vou assumir um costume antigo de homem branco: comprar a carne no açougue e restante da alimentação nos supermercados.

quinta-feira, março 09, 2006

Elucubrações profissionais

Sou jornalista. Redator. Como não tenho boa dicção e carrego o sotaque da Venezuela, gosto mais das palavras escritas.
Ultimamente reviso mais do que escrevo.
Como revisor, edito diariamente diversos textos de meus colegas, além de outras coisas que chegam. Por isso estou sempre ocupado no MSN. (Sim, você trabalha e fica no MSN? Claro, uso-o com fins profissionais. É possível.)
Nenhum texto é intocável. No jornalismo não existe isso. Às vezes fico assustado com o quanto pode ser mexido numa matéria.
Aquela que há um minuto estava perfeita ou impossível de ser alterada, de repente, por diversos motivos, apresenta um enorme leque de possibilidades.
Tira, altera, acrescenta, ignora. Em caso de necessidade, consegue-se até driblar as leis da física, colocando letras onde não havia espaço.
Nessas horas, bate um orgulho do tipo "cara, foi f#%@ mas consegui!".

terça-feira, março 07, 2006

Causos da Universidade


Corredor, intervalo entre uma aula e outra. O Paulinho, colega de sociologia, conta que roubaram sua bicicleta. Digo que já levaram seis minhas e relato cada situação. Pergunto onde o "dono" pegou a dele.

- Foi na biblioteca.
- Mas estava presa no bicicletário?
- Sim.
- Presa, com cadeado?
- Não.
- Pô, Paulinho! Assim também, né?! Pediu pra ser roubado!
- Mas, cara... A gente tá na universidade!
- Paulinho, ô, Paulinho! Fazer um curso superior não tira o instinto de ladrão de ninguém, cara!
- Hum...é mesmo...

(É duro ser o portador de más notícias.)
...................

No final da aula de Formação Sócio-Política e Econômica da Amazônia, o abaixo-assinado para pressionar o Congresso a aprovar um projeto de lei que criar juizados ou algo parecido para combater exclusivamente a violência contra a mulher.

- Ei, tu já assinou o abaixo-assinado?
- Do que é?
- Olha aqui, ô.
- Hum...Sim, vocês querem isso para que mesmo?
- Pra combater a violência contra a mulher. Pára com isso e assina logo.
- Eu não. Quer dizer que agora, além de não poder bater nos filhos, vão me privar do sagrado direito de relaxar com a minha mulher?
- Ai, eu não acredito que você está falando nisso.
- Tudo bem, eu assino. Mas com uma condição: façam um projeto de lei para o que o governo subsidie a compra de sacos de pancadas para todas as famílias.

(E lá fiquei eu, rindo de minha colega, obviamente irritada com o meu péssimo gosto para piadas politicamente incorretas. Do mesmo jeito que as minhas queridas visitantes devem estar agora.)

quinta-feira, março 02, 2006

Voltando ao normal...

Muito bem, a festa acabou, as colombinas voltaram para seus pierrôs e deve ter muita gente perguntando-se como foi que gastou todo aquele dinheiro na folia.

Em Boa Vista, o carnaval foi o mais tranqüilo dos últimos cinco anos. O policiamento ostensivo, câmeras de segurança e a proibição de vender caipirinha e bebidas em garrafas de vidro ajudaram muito para trazer paz à avenida do samba.

A festa começou na sexta e parou somente na terça-feira, quando desfilou a escola campeã. É, em Boa Vista temos escolas de samba que proporcionam verdadeiros espetáculos, fantásticos shows alegóricos somente comparáveis aos do Rio e Sampa, com tanta beleza que...Ok, exagerei nas tintas. São desfiles pobres, mas limpinhos. Falta organização às agremiações, falta mais iniciativa para deixar de depender dos repasses da prefeitura e do governo (que este ano chegaram a R$ 70 mil), faltam mulheres bonitas na pista, etc. etc.

Aliás, no concurso para escolher a rainha do carnaval, rolou um estresse entre as mães das candidatas. ?Sacumé, mãe de miss do samba também tem seus dias de glória e não vai ser a vagabunda da mãe daquela coisa horrorosa que vai atrapalhar isso?, poderia ter dito qualquer uma delas.

Da minha parte, foi apenas mais um carnaval de trabalho. Desde 1998 não folgo nestas datas. Desta vez, como estaria de plantão apenas no último dia da folia, até poderia ter escapado da cidade, mas a Zanny é da organização da festa e acabei indo todos os dias para tomar conta da morena, que fica eufórica neste período e gosta de cantar até ficar rouca e dançar até os pés incharem. A cada meio-dia, lá estava ela, prometendo, afônica, controlar seu gosto pela dança.

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Ação - Poema


Esconda sua pele embaixo da minha
Beije-me logo depois, fale algo obsceno e sorria.
Seja sincera como só é possível ser na cama
Tatue em minha nuca uma mordida que mostre como você me ama.
Seja minha, seja inteira, seja lua
Mexa-se à minha frente, solta, simplesmente nua...


...........

Para quem vai de festa, boa festa.
Para quem vai trabalhar, bom trabalho.

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Dias de fevereiro

Tanto trabalho que falta ar...E ainda vem o trampo no carnaval...Final de semestre na facul...A busca desesperada por um tema para a monografia...O dinheiro que não aumenta...As necessidades que aumentam... A boneca do livro, que não consigo reencontrar...Reaproximações em andamento de amigos afastados...Estudos extras...

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Recordações




Falando sobre o passado, ela comentou:

- Antigamente, no começo do namoro, o banco de trás do carro era um bom palco para as lutas de amor.

Ele disse, espantado com a revelação:

- É mesmo? Você era disso?

Com um sorriso tímido, ela complementou, :

- É. Já fui meio louca, sabe? Mas hoje, depois de algum tempo de casada e um filho, o banco traseiro é somente um bom depósito de livros, comida e roupa.

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Aula básica sobre economia ilegal de Boa Vista, Roraima


Em Boa Vista, compra-se gasolina contrabandeada da Venezuela a R$ 2,30. Nos postos, o combustível nacional custa entre R$ 2, 85 e R$ 2, 89. Na fronteira, a 230 quilômetros, os venezuelanos pagam o equivalente a 15 centavos de real por litro e os brasileiros, R$ 1, 50.

Em Boa Vista, consome-se muita cerveja Polar e Polar Ice, também trazida irregularmente da Venezuela. Há quem diga que causa dor de cabeça. Em quem bebe e em quem é pego pela polícia trazendo a mercadoria.

Boa Vista também importa produtos naturais. A turma da marijuana só consome erva vinda da Guiana, que no século passado só mandava porcelanas e coisas do lar para a cidade.

Já os que gostam de cocaína beneficiam-se de Roraima ser a porta de entrada no Brasil para parte da pasta que vai para a Europa via São Paulo. O produto é Made in Colômbia.

Outra fuga de divisas são as propinas pagas aos militares da Venezuela (e vez ou outra a policiais brasileiros lotados na fronteira) para passar esses produtos.

Roraima e Amazonas equilibram as importações mandando mulheres para serem prostitutas na Venezuela.

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Atitude



Parados em frente ao terreno baldio, ele fala para sua esposa:

- Bonita área, né? Foi uma compra e tanto.
- É meu amor, agora é só meter uma máquina para tirar esse mato.

Ele, num rompante de auto-afirmação masculina, afirmou:

- Que nada! Eu mesmo limpo isso aí. É rapidinho. Pra que pagar se posso dar conta?

Ela apenas o olhou de relance, sem falar nada, e ouviu imediatamente outra afirmação, dita enquanto ele, envergonhado, colocava a cabeça no seu ombro:

- OK, OK, tudo bem, é verdade! Não vou limpar nada mesmo. É muito mato e vou ter que pagar para isso!

Ela, carinhosa, o confortou:

- Isso, meu amor. A verdade é sempre a melhor coisa a se dizer.

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Gostos



Charmosa, aproximou-se de seu professor de inglês e disse:

- Teacher, sabia que eu acho um charme homem de óculos e que fala outra língua?

O professor parou de ler a sua revista, olhou para a moça e respondeu:

- Me too, baby. Me too.

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

1991: welcome to the aldeia



Hoje completo 15 anos morando em Boa Vista. Cheguei na maior aldeia de Roraima no dia 3 de fevereiro de 1991. Era domingo e na rua de piçarra de minha casa redemoinhos de poeira se formavam.
No outro dia, já estava em sala de aula, cursando a oitava série sem conhecer ninguém e esforçando-me todos os dias para dominar o idioma. Desde então, visitar a Venezuela, só de ano em ano.
Daquele começo de década até este novo milênio muita coisa boa e ruim aconteceu.
O último laço com Guasipati, minha antiga cidade, foi cortado em dezembro de 2004, quando vendi a casa que tínhamos lá.
Fiz alguns amigos, ganhei muitas inimizades, engordei, emagreci, viajei pelo Brasil e parte da América, passei meses sem sair da cidade, virei jornalista e curso sociologia. (Recordando, jornalismo era a última das opções. As primeiras eram filosofia, psicologia e fisioterapia. Como à época não ofertavam esses cursos no Estado, fiquei dividido entre letras e comunicação social, escolhendo a última.)
Trabalhei como office boy, professor de espanhol, datilógrafo de trabalhos escolares e monitor dos projetos culturais do Sesc. Mas fui bom mesmo como desempregado profissional.
Depois de alguns anos economizando, comprei uma casa para meus pais, uma supermegahipermaxi bicicleta aluminum vermelho-linda com amortecedor frontal e um carro vagabundo para fazer o trecho casa-trabalho-faculdade e carregar as compras do supermercado. No balanço, acho que estou bem, levando em conta que nunca fui de planejar muito o futuro. Espero agora que venham outros dias, com muitas alegras e postagens agradáveis.

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Viagem pela BR 174



Leiam esta historinha digital da Mônica numa viagem à ilha de Margarita, procurada todos os anos por milhares de brasileiros de Roraima e do Amazonas para desfrutar das delícias do Caribe.
A HQ peca quando mostra cenas da família da dentucinha passeando à vontade na área indígena waimiri-atroari. Neste trecho, os carros não podem sequer estacionar, o que é lembrado a cada centena de metros por placas enormes. Também não é permitido fotografar os animais. Depois das 18h, carros particulares não passam, somente ônibus. O tráfego é liberado de manhã.
De qualquer forma, valeu a intenção.

terça-feira, janeiro 31, 2006

Situações


Estava tão mal no mercado que quando tentou vender a alma, ainda teve que devolver algum ao comprador.
..........

Era um esforçado. A vida lhe deu limões e ele fez limonada para vender, mas não havia açúcar ou adoçante caindo do céu.
.........

Anunciou no jornal: procuro amor e trabalho. Sem experiência comprovada.
.........

Saiu correndo quando viu o rapaz com quem havia marcado um encontro às escuras. Conta que foi espanto a primeira vista.

quinta-feira, janeiro 26, 2006

Dias de janeiro

Ocupado.
Cansado.
Estudando, depois do fim da greve da universidade.
Sem dinheiro (Quando se é assalariado e o pagamento sai antes do prazo, o mês fica mais longo...)
Sem tempo para sonhar, apenas trabalho e leituras de sociologia das organizações, planejamento urbano e formação sócio-econômica da Amazônia.
Fechando mais um informativo de meu local de trabalho.
Vendo a chuva cair em dias inesperados.
Agora no orkut.
Pensando.
Cancelando, por enquanto, os encontros da Confraria Lúpulo com Guaraná, formada pelos Três Mosquiteiros (Nei Costa, Luiz Valério e eu) e Dona Dartanhã (Zanny Adairalba).



A Confraria

terça-feira, janeiro 17, 2006

Roraima blues

Entra sem avisar, muda a estação da rádio, me leva da bossa nova ao blues, do samba ao rock n' roll. Sorri, pareço um tonto, perco os sentidos ao entrar em seus olhos e notar a diferenças da vida.
Conversa comigo em uma língua estranha - não há dicionário para traduzir seu efeito. Morde minha orelha e diz que vinho bom é vinho quando se ama. Toco suas costas e conto cada poro com a boca. É uma conta sem fim.

De seus dedos, tocando-me, parece sair música. Danço o ritmo que ela quer. A angústia de sua chegada é como a angústia da partida.

Rio, choro, grito, maldigo seu efeito em mim. Não sou mais homem. Sou criança pedindo atenção, pássaro sem asas, sonhador rogando por imaginação.

Esfrega-se em mim e penso que Deus é justo, mesmo sem acreditar em divindades. Um riso em meu peito é um roce na pouca paz que ainda me resta. Depois me aperta, ajudando-me a não fugir de minha condenação. Fecho os olhos e acho que enfim sou feliz enquanto rabisca sua poesia para marcar em mim seu território. E a madrugada vira manhã, tarde, noite, infinito.

De repente, alma entregue, corpo submerso, navego, flutuo, deslizo até o vulcão. Queimo, rio, é janeiro e acho que chove lá fora.

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Espirituosa

Ligeiramente cambaleante, depois de ser medicada para normalizar a pressão, que estava em 20 x 10, dona Maria José me diz na saída do hospital, quando a pego pelo braço para irmos até o carro:

- Eu estou bem. Não sei pra que tanta gente me segurando como se eu fosse cair.

- Quer dizer que a senhora está bem? Então vai caminhando até chegar em casa. É só pegar o retão da avenida e pronto.

Língua afiada, mente rápida e corpo cansado, minha avó responde:

- Meu filho, eu iria, mas o médico insistiu que devo repousar...

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Aperfeiçoamento



Ao reler seus antigos textos, ele comentou:

- Nossa, como mudei meu estilo de escrever!

Ela não percebeu o auto-elogio implícito na frase e deixou escapar, enquanto assistia a um vídeo-documentário:

- Para mal ou pior?

Um estranho e emburrado silêncio tomou conta da casa por algumas horas.

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Oníricos


Na mesma cidade, numa noite qualquer, duas pessoas com pouca amizade sonharam uma com a outra. Acharam absurdas as cenas e riram quando amanheceu e o sol os encontrou em suas camas, distantes vários quilômetros.

Dias depois, encontraram-se numa festa. Nunca trocaram mais de três palavras, o tradicional "olá, como vai?", e não foi neste dia que tudo mudou.
Na mente de cada um, a pergunta: o que aconteceria se contasse o seu sonho ao outro?

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Mens sana in corpore sano

Depois de alguns meses, concluí a leitura de Pasajes de la Guerra Revolucionaria, coletânea de artigos escritos por Ernesto Che Guevara sobre o combate contra o regime batistiano em Cuba.
Encaro agora o Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.
E quando dá tempo, pega minha megahipersuperbike de alumínio com amortecedores frontais e vou preparando o corpo para as primeiras trilhas deste ano.
E você, o que está lendo?

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Metas para 2006


Agora que o ano começou, a euforia de um monte de pessoas já diminuiu e os carnês do IPTU, do IPVA e da escola particular de muito fulano já estão sendo impressos, causando pavor no orçamento, agora sim vale a pena estabelecer metas realistas a cumprir nos próximos dozes meses:

1) Concluir o curso de sociologia. Depois, farei como FHC e me tornarei presidente do Brasil, criando uma nova moeda, derrotando o PT em toda eleição e privatizando o que restar de empresa pública.
2) Reatar laços com algumas pessoas que deixei para trás nos últimos dois anos, especialmente, e cuja convivência me fazia bem. Mas se elas não quiserem, que se danem. Até hoje me virei muito bem sozinho sem elas.
3) Conseguir publicar o meu livro de crônicas e poesias. Já tem o patrocínio no esquema (Salve o Sesc Roraima!) e falta só o Nei entregar a boneca impressa para fazer os últimos ajustes.
4) Comprar um imóvel e construir ou alugar, transformando-me em um miniempresário do setor imobiliário.
5) Reduzir ou pelo menos conter o avanço dos quilos a mais. Essa sim é uma briga entre o corpo e a mente.

Cinco é um bom número. Mais do que isso é exagero. Alguém me lembre delas em dezembro, please.

quarta-feira, dezembro 28, 2005

Crescimento



Ela disse:
- Amorzinho, vamos discutir o nosso relacionamento?

Ele respondeu, surpreso:
- Mas de novo? Toda semana é praticamente a mesma coisa!

Ela explicou sua atitude:
- Olha só: é tudo para o crescimento de nossa relação. Só isso.

Ele, olhando para baixo e sentando-se, resmungou:
- Se é para crescer, devias me chamar para jogar basquete ou vôlei...

segunda-feira, dezembro 26, 2005

Cenas de Natal


Para o dia 25, o governo estadual prometeu fazer a distribuição de brinquedos para as crianças de famílias carentes. Anunciou isso nas TVs, rádios, jornais e em carros nas ruas.
Os portões do estádio Flamarion Vasconcelos seriam fechados às 8h30, mas desde as 5h30 haveria ônibus rodando pela cidade, catando aqueles que encarassem a fila.
Às 4h30, retornando de uma madrugada de conversa, vinho, água e churrasco na fazenda urbana de Nei Costa, Zanny e eu vimos que já havia fila para receber os mimos do governo.
O governador Ottomar Pinto, que tem o costume de distribuir pintos, biquínis, peixe, iogurte, material de construção e terrenos, chegou às dez horas para fazer a distribuição.
Ao meio-dia, sob o sol forte de um dia de Roraima (só quem esteve aqui, sabe o que isso significa em termos de temperatura e ardência na pele), centenas de pessoas esperavam em frente ao estádio a chance de pegar um ônibus que as levassem de volta aos seus bairros. Aproveitavam a sombra de pequenas árvores para refugiar-se. Sob suas cabeças, as redes serviam de chapéus.
Quando chegava um ônibus, lá estavam crianças e adultos, carregando brinquedos e redes de dormir, empurrando-se para garantir um lugar e o retorno às suas casas.
Na minha cabeça, algo semelhante às cenas de retirantes e vítimas de guerras.
Às 16h, ainda havia pessoas esperando que os ônibus e vans alugadas pelo populista governo roraimense os levassem de volta aos seus bairros.
Mas é claro que também estavam lá famílias de renda maior que a maioria, com seus carros e roupas mais caras, apenas pela mesquinhez de receber algo supostamente dado de graça.
.......
No mesmo dia 25, a família Borges reuniu-se na maloquinha de minha mãe para um almoço. Se não fosse um comentário solto de meu pai, ninguém teria lembrado que os dois completavam 32 anos de casados. Foi flecha para tudo quanto foi lado.
.......
Hoje, 26, é dia de comemorar os 14 anos de Sângela, minha afilhada. Amanhã é dia de missa de um mês de morte do irmão da garota. No último 18, o guri completaria 17 anos. O tempo anda e, como disse Sângela, de tudo temos que tirar uma lição ou a vida fica só naquela coisa besta de ser.

terça-feira, dezembro 20, 2005

Folga fraudada

Era para não trabalhar esta semana e trampar na próxima. Mas cá estou, fazendo serviços como se não houvesse folga nenhuma.

De qualquer forma, bom natal a todos. Até semana que vem.

sexta-feira, dezembro 16, 2005

Um ano lá, um ano aqui



Há um ano, às 16h45, estava em Lima, capital do Peru, entrando em um táxi para dirigir-me a uma estação de embarque da empresa de ônibus Cruz del Sur e viajar até a cidade de Arequipa, a caminho de Machu Picchu.

Passei uma noite e menos de um dia na capital peruana. Olhei pela primeira vez o oceano Pacífico, entrei em igrejas históricas, vi catacumbas cheias de ossos, caminhei no meio de uma cidade cerimonial da tribo Lima, no meio de um bairro residencial, e comi um prato sem gosto em um restaurante vagabundo.

Isso sem contar o péssimo negócio que fiz ao contratar um taxista como guia turístico. E foi um péssimo negócio em dólares.

E hoje, sexta-feira, exatamente um ano depois, estou aqui, numa pesquisa emocionante sobre a loja em que posso comprar latas de tinta por um preço mais baixo.

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Imagens de Boa Vista

No sábado, na avenida Jaime Brasil, um dos centros comerciais da cidade, uma mulher com excesso de peso, saia branca curtíssima e botas de couro vermelhas chama a atenção às 10 horas da manhã.


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Um coral formado por 140 crianças e adolescentes indígenas, moradores de comunidades de outro município, apresenta canções em wapichana no Palácio da Cultura durante a 1ª Mostra de Música Canta Roraima. São aplaudidos de pé.
Na frente do palco, uma indiazinha morta de sono, está como se diz no norte, "pescando um tambaqui". Entre um bocejo e uma fechada de olhos, a menina quase dorme enquanto canta.


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A mulher sai da igreja, come um salgadinho, lava as mãos e volta para a missa, demonstrando como é limpinha. A água que tira a sua sujeira, por sinal, é a água benta dos fiéis. É ou não vandalismo religioso?

segunda-feira, dezembro 12, 2005

Da Série Ouvidos na Rua: o maior cachê do Brasil


O governo estadual promoveu uma feira agropecuária em um parque de exposições que fica nas redondezas de Boa Vista. Além dos bois e carneiros, umas das atrações mais esperadas era o show de Zezé de Camargo & Luciano. A dupla cantou neste domingo à noite.
A vontade do boa-vistense de assisti-los de graça provocou filas literalmente quilométricas, com as pessoas demorando até duas horas para concluir um trecho feito geralmente em 15 minutos. E isso tanto na ida como no retorno.
Por azar, a instalação elétrica da feira não agüentou a produção do show da dupla.
Hoje pela manhã, ao chegar na lanchonete ao lado do trabalho em busca de um café da manhã rápido, ouço os comentários dos freqüentadores:

- Rapaz, os caras receberam R$ 300 mil para tocar na exposição.
- É mesmo? E só conseguiram tocar três músicas por conta do problema da energia.
- Com certeza, é o maior cachê do Brasil. Cem paus por música.
- Estou admirado. Tanto remédio que dava para comprar com esse dinheiro.
- Tá vendo? Quem manda não saber cantar. Tu não é um dos filhos de Francisco...

terça-feira, dezembro 06, 2005

A vida continua

Aos poucos, a rotina volta. Nunca ao normal, isso é impossível, mas volta.
A vida anda e as certezas tornam-se raras. As que sobram, bem, é preciso duvidar se vamos viver muito tempo ou se tudo acaba amanhã.
Enquanto isso, trabalho, muito trabalho. E processo nas costas do Estado, por colocar incapazes nas ruas para tomar conta da insegurança.
Aos poucos vou retomar as visitas aos amigos blogueiros.
Beijos a todos.




quinta-feira, dezembro 01, 2005

Lições


A morte de alguém próximo, além de dor, traz outras lições. Para mim, as mais importantes estão sendo valorizar cada momento passado com a família e perceber que é preciso passar mais tempo com ela.
Outra lição é mais uma confirmação sobre a fragilidade da vida.
Acima de todas elas, confirmo outra: pelos que ficaram e choram, é preciso continuar vivendo, caminhando em frente, mesmo sem saber o que nos espera na próxima esquina. Afinal, escreveu Fernando Pessoa, "viver não é preciso".

terça-feira, novembro 29, 2005

Imagine a PM matando seus parentes


Imagine acordar às quatro da madrugada ouvindo gritos desesperados na casa ao lado. Imagine perguntar a um rapaz e duas moças com os rostos desfigurados pela dor o que houve e receber como resposta que houve uma desgraça e a Força Tática da Polícia Militar matou Sandro Borges, seu primo de apenas 16 anos.
Imagine levar a sua afilhada, irmã de Sandro, até o 1° DP e depois até o Pronto Socorro dizendo-lhe apenas que o menino levou um tiro e está internado. Imagine seu choro ao ouvir a confirmação da morte pela bala da PM.
Imagine ligar para a mãe do rapaz pedindo para vir ao Pronto Socorro e somente lá, frente a frente, informá-la da morte do filho primogênito.
Imagine a solidão de ser o primeiro da família a ver na "pedra", embrulhado em um saco plástico negro o corpo rígido de seu primo, notar os buracos causados pela bala no braço esquerdo e no tórax, perceber sua palidez, lembrar que o viu na barriga da mãe, das muitas vezes que o carregou no colo, de como falava muito e alto, de sua extroversão, da sua paixão pela informática.
Imagine ter de comunicar a morte aos tios, dividir a responsabilidade de falar com a polícia técnica e ouvir, uma hora e meia depois, o rapaz que o acordou de madrugada dizer que ainda não havia conseguido prestar queixa.
Imagine entrar na casa de seus avós maternos às sete horas da manhã para comunicar-lhes, malditas lágrimas incontidas, que a PM chegou para apartar uma briga sem o devido preparo e atirou para cima, acertando Sandro, que estava escorado no parapeito da pizzaria, bem longe da confusão.
Agora, tente ouvir os gritos desesperados da avó e visualizar o avô caindo no sofá, em estado de choque. Avance um pouco no tempo e tente entender o que dois supostos investigadores da Força Tática tanto insistem em querer conversar com o médico legista, ouvi-los dizer ao pai do rapaz que sabem de sua dor e lamentam o ocorrido.
Abra um parêntese para ouvir e ver o pai do menino lembrando de cada frase dita no seu último encontro, na sexta-feira 25, de como se tratavam, das gírias do filho, de seu tão próprio "valeu, men!", das noites jantando juntos, das confidências, de como quer justiça.
Feche o parêntese, espere seis horas pela liberação do corpo, providencie o velório, tente comer um pouco apenas para não cair de fraqueza, vá até o local da cerimônia e note como o menino era querido pelos colegas de escola e festa. Perceba a estupefação no rosto de dezenas de adolescentes, ouça seu choro, seus questionamentos sobre a ação da polícia, olhe no outro lado da rua, sentado na calçada, ainda desesperado, o rapaz que o levou até o Pronto Socorro e conta ter sido fechado três vezes pelo carro da PM, que não queria que levassem o corpo para ser atendido.
Abra novo parênteses e ouça, na segunda-feira 28, o comandante da PM dizer que há sempre várias versões em todo caso, todas sempre contraditórias, mas a "concreta" é a contada pelos seus subordinados. Tente distinguir aonde vai parar o inquérito da corporação e note as nuances de tendenciosidade.
Enterre seu primo, console seus familiares, ouça as palavras dos amigos antes de fecharem a cova, a voz desesperada do pai. Volte para casa e converse com seu avô, escrivão e delegado de polícia na época do Território Federal de Roraima. Imagine o esforço que ele faz, prostrado na cama, para murmurar que na segunda seguinte iria com o menino checar preços de computadores para presenteá-lo. Acrescente a isso que aquele domingo fatídico era para ser um dia de festa e passeio familiar no sítio de amigos para comemorar o nascimento, no mesmo dia, de mais uma prima de Sandro.
Agora, resuma tudo isso no desconforto trazido pela realidade da morte, na estúpida esperança do retorno da normalidade, de que tudo foi um sonho, na lembrança recorrente de momentos passados juntos com o menino, quando ele falava bobagens ou quando parava ouvir histórias de adultos. Acrescente o medo de que algo assim atinja outros parentes e está o formado o quadro das famílias de Sandro, chamado em casa de Taffarel e na rua de Ômega.
Depois de todo este esforço, lembre que este é o terceiro ou quarto caso de morte envolvendo policiais civis e militares neste ano e pense para onde vai todo o dinheiro investido na capacitação destas pessoas.

sábado, novembro 26, 2005

Tempo, onde estás que não te vejo?

Tempo pouco, muito trabalho. De manhã, tarde e noite. E hoje, sábado.
Boa Vista hoje está quente, mas choveu no começo da semana.
Começou na quinta a Feira do Empreendedor do Sebrae. Empresário de Roraima e Amazonas, estrutura bacana, muita coisa para se ver no parque Anauá.

Na praça do Centro Cívico, trabalhamos desde quinta, eu e Zanny, cada um na sua área, no primeiro arraial Boa Vista Junina Fora de Época.
Na sexta (28), teve de tudo: grupo folclórico venezuelano, quadrilhas juninas, a banda de reggae Guybraz e as de rock Mr. Jungle, Garden e Lepthos. Devem agradecer à Zanny, que insistiu que o nome da festa, "São João dos Ritmos", deveria justificar-se na variedade de estilos musicais. A noite terminou com forró, claro.

Na frente de uma das barracas de alimentação, a pergunta do senhor:
- Amanhã vai ter?
- O que?
- Amanhã vai ter festa?
- Claro, a partir das sete da noite. Amanhã tem boi-bumbá, com o pessoal do Garantido.
- E vai ser de graça?
Penso se ele notou que é uma festa pública, no meio de uma praça.
- Sim, senhor. Aqui não se paga nada
- Vai ter carne de boi de graça?
- Hã?


Jovens descendentes dos índios da região passeiam pela praça. No rosto e na pele, a origem declarada. No pescoço, um colar de sementes amazônicas. Na orelha, um brinco de ouro. Adoro estas imagens.

Na Ilha do Forró, um palco afastado, capoeira com o grupo Angola Palmares, músicas e teatro cristãos com os jovens do Jocum e forró pé-de-serra com a banda Xaxado da Paraíba. De fato, em vários anos cobrindo as festas municipais, nunca vi tanta diversidade.

Agora, tempo de voltar ao trabalho, sem hora extra, mas rezando para adiantar algo ou a segunda vai ser curta de novo.

Visito quando der.

segunda-feira, novembro 21, 2005

Ouvidos na rua: declaração de amor


No saguão do aeroporto de Boa Vista, depois de uma noite na balada, um casal de amigos e eu comemos alguma coisa enquanto o sol nasce. Ele fala de vários assuntos e comenta sobre o amor. Ela retruca algo sobre ele ser muito seco no relacionamento e olha para a rua. Ele, estudante de química da Universidade Federal de Roraima, passional na vida e na ciência, lhe diz:

- O meu amor por ti não é químico e nem físico, é natural.

Ela continua olhando para a rua e eu, fascinado com a frase, lhe pergunto o que achou de tal declaração de amor. Ela me olha e diz:

- Hã? Declaração de amor? Que declaração de amor? Não ouvi nada. Estava olhando para a rua...Dá para repetir?..

quinta-feira, novembro 17, 2005

Retrato íntimo


Gotas de euforia
escorrem pelo corpo dos amantes.
Com olhos semi-abertos,
o que vêem pela frente é tudo,
menos real.
Mãos firmes, temerosas, rápidas, lentas.
Viajam nos sentidos.
O movimento e o quarto trancado
aceleram a respiração.
A pele brilha, rostos se contraem.
Para um deve estar próximo o ápice.
Palavras obscenas são ditas.
Juramentos sem nexo são feitos.
As bocas se abrem, unhas pedem carne.
Os corpos se enroscam e as mãos
estão tomadas pelo suor.
Bendito suor.
O coração bate mais forte,
o ato fica mais intenso.
Em segundos, um deles
conhecerá um pouco do paraíso.


Making Of: texto velho, das antigas, literalmente do século passado.

segunda-feira, novembro 14, 2005

Histórias de índio: lançamento musical

Agosto de 2001. Há quase um mês em São Paulo, embarco para Florianópolis para passar uns dias na ilha enquanto não sai o resultado da prova anual promovida pelo Estadão para incluir no seu programa de treinamento estudantes de jornalismo no último ano do curso ou recém formados.

De Floripa, saio direto para a Penha, ciceroneado por Rodrigo, irmão de minha amiga Carla Cavalheiro. Gente muitíssimo boa, o guri, que nunca havia me visto na vida, aceitou o encargo de me mostrar um pouco do litoral de Santa Catarina.

Rodrigo é professor de oceanografia e surfista, daqueles que gosta de morar na beira da praia para pegar onda toda manhã. Bom guia turístico, ele sabe que a Penha não é o melhor local para divertir-se à noite. Por isso, atravessa alguns municípios e vamos cair em Balneário Camboriú, acompanhados pelo Gaúcho, seu colega de faculdade.

Em Balneário, olhando os out-doors, ficamos sabendo que rola num bar uma festa com uma banda que Rodrigo conhece de nome. A casa está lotada para ouvir o roquenrol d?Os Chefes. Bom show, gente bonita, o público e os músicos muito animados. De repente, Os Chefes tocam uma canção em inglês e todos acompanham. Olho para os lados e fico admirado com a resposta do pessoal. Será que é um lançamento, uma música que estourou durante a minha viagem? ? penso, sem conseguir identificar a melodia.

De volta a Roraima, meses depois pego emprestado um CD com os grandes sucessos de uma banda e ouço a música de Balneário Camboriú. O que eu pensava ser uma novidade era na verdade Roadhouse Blues, do The Doors, lançada em 1970.

Santo desconhecimento musical, culpa de uma vida cheia de salsa, merengue, calipso, vallenato, rancheras e outros ritmos mais latinos. A parte boa é que no Grammy Latino consigo perceber as bobagens que o pessoal do SBT fala de vez em quando.

sexta-feira, novembro 11, 2005

Da série Redatores da Fronteira: Ontem e hoje

Ygara Cauã é o pseudônimo de um companheiro que diz ainda sentir alguma coisa por um amor de seu passado e ao mesmo tempo quer mantê-lo bem longe. Aliás, tão longe que foi embora para o planalto central. Vá entender esse povo.

ONTEM E HOJE, MAS E DAÍ?

Por Ygara Cauã

Te amar foi algo que sempre desejei, e consegui
Não te amar foi algo que nunca quis, mas sempre temi
Te perder foi algo que não sonhei, mas vivi
Quando te perdi, foi tudo que não quis
Hoje sigo em frente, mesmo me achando feliz

Olho para trás e te vejo, talvez nem mais te ame
Quem sabe apenas só queira te ver, talvez...talvez
Só para sentir o que não existe mais
Sonho com você quase todas noites, e que ninguém me reclame
Amo sem querer, apenas deixo o coração bater mais
E sem dúvida deixo tudo só para te ter mais uma vez

Ainda que de nada possa valer, só quero poder te dizer
Mais uma vez, te amo e sinto que sempre te amarei
Nem sei se isso é o certo, mas dentro de mim parece ser o que espero
Mas nem que queira, e você nem foi demais
Foi eu que esperei e sonhei demais, mas não me arrependo

Sigo com a garganta embargada, a voz camuflada
Sonho tudo que não se sonha mais
Mas o que fazer se nada se faz mais
Bem que ensaio e no fim acabo dando só uma risada

Sem medo devo reconhecer que te amo
E quem sabe devo ser o responsável pelos erros
Tolo, sozinho procurei encontrar
Na fome de amar só quis acertar
Ainda que no fundo só queria estar ao teu lado
Sei que tudo agora é mais que um sonho, um belo pesadelo
Vivido todas as noites

Não choro, não nego, não temo
Aceito, disfarço, e ainda saio de lado
Tenho só um leve sorriso, que te dou de graça
Como meu amor, que hoje não tem graça

Mas você nem gosta de poesia, e nem eu gosto de você
Só te amo, mas não te quero
Só quero uma chance, de acordar ao teu lado
Ter teus cabelos desgrenhados ao meu lado
Te olhar com os olhos enlaçados
Te amar ainda que mal amado
Te amo!

quinta-feira, novembro 10, 2005

Um ano

Hoje completo um ano de namoro com a Zanny
12 meses de convivência quase diária
12 meses de risos e conversas
De momentos tensos e momentos felizes
Um ano de muita luta e algumas conquistas
De mudanças literais e comportamentais
De muita reza contra o mau-olhado
De muita surpresa com os comentários alheios
De vadiação nas madrugadas
De meus sermões e os seus "eu sei"
De piadas feitas para deixá-la sem graça
De mostrar que o mundo pode ser visto de outras formas
De muito salsa, pop e reggae
De teatro e dança,
De poesia e arte para alimentar a alma
De sexo e rock and roll para acalmar o corpo
Afinal, ninguém é santo nesta terra.
12 meses de morenidade
12 meses de olhos castanho-claros que ela jurava serem negros
(Vá entender esse tipo de daltonismo que ela tem)
De rir de seus medos e constrangimentos
De constrangê-la para rir.
De inventar diálogos absurdos
E esquecê-los antes que virem textos humorísticos
Perdendo a chance de ganhar dinheiro com eles (arg!!)
12 meses de pensar que cada dia será um bom dia (ou não).
De muitos e-mails e postagens
E alguns indesejáveis quilinhos a mais.

sexta-feira, novembro 04, 2005

Ressurgindo das cinzas, a quase esquecida série Redatores da Fronteira

A seguir, poemas de amor, alegria e vida de Adilia Quintelas, cantora, compositora e mulher apaixonada que descubriu no seu atual amor que a poesia é como a vida: sempre há algo novo a ser descoberto.


Sorriso entre sorrisos
Transparente e preciso
Preciso esse sorriso
Precisamente o teu!

..........


Luz plena
Manhã serena
Verdes campos onde passeio meus olhos
Nada mais doce para se beijar
Que essa brisa que vem do olhar

........

Porta aberta
Rua deserta
Lua meia.

.....................


Meu coração está em paz
Minha alma está em luz
Meu corpo está em mais...mais...mais...

quinta-feira, novembro 03, 2005

Pensamentos de feriado...


Quarta, dia dos finados: ?Zanny, lembrando do post da Nanda e vendo o homem que vende açaí e buriti na bicicleta, pensei que a luta contra o peso é injusta. Veja bem: são muitos contra dois. É a pessoa e sua vontade de emagrecer contra o sedentarismo, a preguiça, a falta de tempo para malhar, as calorias da comida, a televisão e a idéia de que amanhã é o melhor dia para começar os exercícios. É muito difícil viver assim?.


...Notícias de quinta:

Lasanha causa intoxicação em 70 policiais argentinos


Quem manda querer mordomia? Deviam estar a pão e água para ficarem alertas durante a 4ª Cúpula das Américas.

segunda-feira, outubro 31, 2005

Uma reunião

Trabalho, vendas de comerciais, sites informativos, blogues, postagens, comentários, parcerias, colaborações além-mar via internet.

Risadas, sociedade, comportamento, mulheres, paixões desmentidas, reações de dúvida, cerveja, surrealismo, espanto, profissão, relatos sobre o passado e especulações sobre o futuro.

Conversa fiada, conversa séria, análise de mercado, análise de caráter, lembranças, interrupções e novas histórias. Dentro da piscina, um casal fala de sexo, parece, só que bem baixinho.

Frissons, encontros na metrópole, desencontros na cidadezinha, economia e finanças, primeiro emprego, primeiro calote, primeiro e último dia de batente.

Três pessoas, três estados, três formações, três sotaques, três copos, três idades, três filhos um, dois filhos outro, nenhum o último. Uma moça nada cada vez mais rapidamente. Dadaísmo remember.

Nova vida, novos desafios, nova bebida, garçom. Vamos misturar lúpulo com guaraná e ver no que vai dar. Beatles, Janis, quase 10 horas. Já é tarde. Do céu à casa, mulheres e namorada chegando. Lá vão eles, rindo da ficção e da realidade, provocadores, zueiros, bem na linha de frente.

sexta-feira, outubro 28, 2005

Uma imagem para ilustrar o blog durante o feriado prolongado



A Prefeitura de Boa Vista transferiu o feriado do servidor público para a segunda-feira. A terça é ponto facultativo. A quarta é mais um feriado nacional.
Por isso, deixo aqui meu abraço aos que vão trabalhar neste período.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Firmeza



Ele disse:

- Não sei o motivo de tanta desconfiança nessa minha nova idéia. Tem tudo para ser um sucesso. Você sabe muito bem que o que eu quero, eu consigo.

Ela, delicadamente, sem querer magoá-lo, explicitou suas razões:

- Amor, eu só me preocupo contigo. Se você fizer isso com tanta determinação como a dieta e os exercícios que precisas para perder essa barriga, vai ser o maior desastre da história.

Ele ficou refletindo enquanto tomava uma cerveja e comia mais um pedaço de lasanha.

segunda-feira, outubro 24, 2005

Invasão roqueira

Expulsos pela vizinhança, que chamou a polícia para dar um jeito na zoeira da bateria e das guitarras, bandas e público deixaram na sexta (21) o bar Tribos do Rock, no bairro Liberdade, zona oeste de Boa Vista, e decidiram tomar de assalto o pequeno palco da praça do vizinho bairro Pricumã, a uns dois quilômetros de distância.

Com um som improvisado e muita disposição, as bandas apresentaram-se para um grupo de aproximadamente 80 pessoas, de idades variadas e bastante vontade de ouvir rock na praça, completamente vazia até a chegada dos invasores.

Entre 22 e uma da manhã, tocaram, entre as que me lembro o nome, as bandas Mr. Jungle, Sheep e LN3. Quem passava em frente à praça, logo parava e dizia surpreso "que não estava sabendo do show" e "que estava gostando muito da idéia". Da vizinhança, pouco a pouco apareciam caras novas, surpresas com a movimentação.

As apresentações da Mr. Jungle e da LN3 priorizaram as composições próprias e a turma do gargalo acompanhou as letras mais conhecidas. Na verdade, havia esse pedaço do público, a menos de um metro das bandas, e o que estava a uns 10 metros, bebendo e conversando.














Mr. Jungle: uma das bandas de sábado

O abastecimento de bebidas, doces e salgados para os esfomeados ficou por conta da loja de conveniências do posto de gasolina atrás do palco. Outros já chegaram na festa improvisada com o seu garrafão de vinho, gelo e copos de plástico para manter-se devidamente hidratados.

O bom de o som ser basicamente plugar e cantar, sem muita equalização para fazer, é que os intervalos entre as bandas eram mínimos. Mas a clareza dos vocais não foi essas coisas. Coisas aceitáveis numa invasão de praça para fazer roquenrol e movimentar a cena musical roraimense.

Sobre a hora exata do fim da farra, os que ficaram até o final e foram consultados na outra noite, no show de Tributo a Pink Floyd, não souberam definir com certeza. Mas parece que passou fácil das 2h30 da madrugada.

Para a próxima sexta, segundo foi dito, o encontro está marcado para cedo no Tribos do Rock, lá pelas 17h. Assim haverá tempo para ouvir muita música até que bata o toque de silêncio das dez da noite. E já houve quem falasse também em ocupar novamente a praça do Pricumã.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Pedidos



Foi assim, depois de algumas horas de conversas e risos, de falar sobre super-heróis e direitos humanos. Foi ao acaso, numa vontade crescente e reprimida para evitar pedidos ou gestos impensados. A festa já havia acabado, a madrugada era senhora.

- Posso te beijar?
- Pensei que nunca fosses pedir.

Foi assim, uma vontade de pular no desconhecido, um mergulho em águas profundas. Riam, enquanto pensavam no que o outro devia estar pensando. Àquela hora, somente os ladrões e os boêmios ainda perambulavam pelas ruas do velho bairro. Entraram na casa e brincaram de escrever poemas na pele do outro, com tintas de desejo e versos de descoberta.

- Estamos indo longe demais. Você não acha?
- Não. Vamos até onde você quiser.

Quando o sol decidiu voltar a reinar, mágoas, alegrias, surpresas e desconcertos estavam muito longe do ponto de partida, dos velhos limites do que se era horas atrás. E para todos os fins, para todos os outros e até para eles, o tempo tornou-se senhor de verdades que nunca foram ditas ou admitidas até mesmo entre amigos íntimos.

terça-feira, outubro 18, 2005

Numa tarde de muito trabalho (por incrível que pareça):

- Sinônimo de produto?
- Mercadoria.
- Hum...para melancia?
- Melão!

......

- Como é que eu coloco que tal categoria recebeu um aumento de R$ 500?
- Aumento, ora.
- Não, é sobre um abono.
- Então é um bônus mensal.
- Ou então um abônus mensal.

.......

- O termo "vilão" era aplicado aos pagãos que vinham das vilas antigamente.
- Então lá na Vila Olímpica tem um monte de vilãos também?

segunda-feira, outubro 17, 2005

Depois do amor



Romântica, ela disse, aninhada no colo de seu amado:

- Meu dengo, depois que a gente faz amor, fico um tempão rememorando, lembrando de cada beijo que te dei e ganhei de ti. E tu, ficas pensando em que?

Rápido e estupidamente sincero, ele respondeu:

- Ah, num monte de coisas. Agora mesmo tava pensando que vou ter de acordar bem cedinho para não pegar fila no lava-jato.

Enquanto ela se vestia furiosamente para ir embora, ele tentava entender se havia dito alguma bobagem falando a verdade.

quinta-feira, outubro 13, 2005

Visitas



Um jogo de cartas, um filme na TV. Uma cabeça no ombro, um cheiro na nuca, uma mão sob um vestido, bocas com cheiro de fruta. Roupas jogadas no chão, medos ao alto. E dois corpos se encontram, uma e outra vez.

As horas passam, a descoberta continua. E antigas amizades passam a amores recentes, escondidos de outros, longe das ruas. Surgem beijos em lugares indecentes. E falam de si, dos outros, de nada, perdidos no meio da escuridão da cama. E as palavras são intercaladas com grunhidos e interjeições.

Amanheceu, hora de partir, de voltar à realidade. Mas, bah, já que estão nessa, que tal mais uma vez, antes da visita para o próximo filme?

segunda-feira, outubro 10, 2005

Denominações



Ele disse:

- Você não pode me chamar dessas coisas...

Ela, furiosa, o atacou:

- Posso sim! Tu não passas de um canalha aproveitador sem nenhum caráter!

Ele, indignado, retrucou:

- Alto lá! Vamos esclarecer: até nós, os canalhas, temos caráter. Discutir, tudo bem, mas sem levantar falso testemunho.

sexta-feira, outubro 07, 2005

Acusações - poema


B.O. número duzentos e cinco barra zero zero zero um:
O elemento foi preso enquanto tentava desesperadamente livrar-se do flagrante. Detido para mais investigações, foi encaminhado à delegacia para ser interrogado.

Não, não, eu não fiz nada do que possa ser acusado
Eu juro que estava só olhando para a casa ao lado.
E que culpa eu tenho se lá mora a Felícia
Que ao me ver fez escândalo e chamou a polícia?

Ok, ok, eu sei que já fomos namorados
E ela me deixou por um dentista bonitão
Na real, eu só parei por conta de um pneu furado
E não porque enciumado quis tirar satisfação

Tudo bem, tudo bem, admito,
Aproveitei para pedir minhas coisas de volta
Roupas, presentes, CD?s, livros e meu periquito
O coitadinho quando me viu quase berra ?me solta!?

Mas nego que foi meu o primeiro grito
Não tenho sangue de barata para ouvir desaforo
Eu não deixo que abusem de meu coração aflito
E só por isso vou ser preso por falta de decoro?

Sem roupa, sem mulher e sem emprego
Vou tentando afastar o desespero.
Não fui eu que errei, seu doutor
Entenda: é essa droga de coração
Que insiste em se dar por inteiro.

Ah, e sobre as provas que possam ter
Desminto todas, digo que foram plantadas
E qualquer filmagem que possa aparecer
Só pode ser feita de imagens encenadas

Neste caso, seu doutor, eu sou inocente
Como diz a lei, até aprovarem o contrário
E posso lhe arranjar culpado mais conveniente
Que não sou eu nem quem me deixou por um otário

Acho que posso ser bem convincente
talvez para todos seja até mais bacana
Que a verdade apareça feliz e reluzente
Como quem acabou de sair da cama.

Na real, seu doutor, o senhor pode acreditar
Nas retas da vida, às vezes tudo é uma zona
E nesta noite que não parece terminar
A culpa de tudo é da maldita da azeitona

terça-feira, outubro 04, 2005

Quem é você?



Quem você pensa que é
Para fazer da vida bagunça
Jogar na rua lembranças velhas
Mudar de posição a minha lua?

Acaso te deram licença
Para cantar boleros na rua
Pintar emoções nas praças
Comer de tudo o que queres?

Não adianta falar de leis
Invocar direitos fundamentais.
A única coisa infundada aqui
É teu jeito de ser desbocada.

Aponta logo o nome do culpado
Diz aí quem perdeu a porta da cela
Soltou as rédeas do hospício
E te fez baixar no meu colo.

Achas fácil chegar e virar
Minha alma pelo avesso, ser
Fim, meio, começo, infinita
Fonte de dor e prazer?

Baixa a cabeça. Não é assim
Se abancar e mudar velhas regras
Tumultuar um processo normal.

Só por que teu beijo me tonteia
Só por que teu cheiro me droga
Só por que teu gosto me doma
Pensas ser fácil tomar conta do lugar?

Vai, soletra bem devagar
Quem você pensa que é
Trazendo transtornos, ditando mudanças,
Fazendo um novo filme de cada dia?

Contando vantagens, chegas de mansinho
Me das nova vida, me enches de vinho.
Eu tiro minha roupa, me dou a você
E quando amanhece...nada a dizer.

Ainda te pego, desconto minha raiva
Te faço refém, te enterro na praia
Te jogo no lago, te perco num bar
Ainda te pego, ainda te escrevo.

Quem você pensa que sou
Para comigo mexer assim
Virar meu copo, teu gosto de tequila
Na lista da minha espera, furar a fila.

Vou colocar no out-door
Em letras interrogativas
Pintado de vermelho-espanto
Quem, afinal, eu penso que é você?


Making of:

No segundo semestre de 2003, numa dessas noites chatas investidas estudando, comecei a rabiscar uns versos. De repente, lá estava, quase pronta, esta poesia. Assim, feita para ninguém, sem motivo. Mas quando a mostrava para outros, a reação era: nossa, quem é essa que te perturbou tanto?
Lógico que ninguém acreditou na versão do "não a fiz para ninguém" e continuavam perguntando.
Bem, alguns meses depois a mostrei, sem segundas intenções, para Zanny, que parece ter gostado muito, a ponto de escrever, também sem segundas intenções uma poesia-resposta. Quem quiser conferir o contra-ataque, vá aqui e leia. É muito legal.
Ah, depois disso, acabei dedicando o poema para minha amiga Carla Cavalheiro, à época meio zuretada de paixão pelo seu ainda firme namorado Rubinho.
Ficou assim a dedicatória: Para Carla e sua capacidade invejável de se apaixonar.

segunda-feira, outubro 03, 2005

Da gloriosa série Ouvidos na Rua: Agradecimentos


No trabalho, o rapaz, ao agradecer a ajuda mais do que providencial da colega:

- Valeu!
- Valeu, nada. Vou te cobrar isso depois.
- Posso te pagar com beijos?
- Pelo amor de Deus, claro que não! Vou querer algo que me dê prazer!

sexta-feira, setembro 30, 2005

quinta-feira, setembro 29, 2005

Entendimento



Ela disse:

- Eu não entendo como você pode ser tão canalha.

Ele respondeu, sinceramente preocupado:

- Sabe que eu tenho a mesma dificuldade?

terça-feira, setembro 27, 2005

Destinos



Era um homem triste. Perdera tudo o que a vida havia lhe dado. Ao caminhar pelas ruas de seu bairro, ficava às vezes chorando baixinho, envergonhado de viver. Patético, bebia álcool puro por falta de dinheiro para comprar o uísque antes saboreado na varanda de sua antiga casa. Morreu sozinho, sem parentes que reclamassem seu corpo, encontrado na calçada onde vez ou outra amanhecia dormindo.

segunda-feira, setembro 26, 2005

Resuminho do Overdoze da Mostra Sesc Macuxi de Artes Cênicas


Às 21 horas começou na biblioteca do Sesc a leitura de poesias. Eu, que seria apenas um ouvinte, entrei logo na roda dos falantes. Mas isso só depois de perceber que as três pessoas que havia convidado para ler meus poemas não iam aparecer a tempo (aliás, eles estavam tão ocupados dirigindo, fotografando e lendo contos em outros espaços da mostra que só chegaram de madrugada na biblioteca).

Começamos assim, um pedindo ao outro, outro pedindo ao um. De repente, a timidez saiu da sala e em alguns momentos era preciso pedir mais de uma vez a palavra para garantir a oportunidade. Crianças leram corajosamente e bem baixinho poemas descobertos nos livros da biblioteca, adultos (entre eles a Zanny e este cronista) criaram textos para ler na mesma hora, outros montaram poesias em voz alta, num diálogo com os próximos.

E quando o silêncio queria tomar conta da sala, eu pensava estar em um leilão de palavras e dizia "quem dá mais, quem dá mais?", estimulando uma nova corrida de versos. E se a memória falhava, apelava-se para os escritos de Drummond, Pessoa, Bandeira, Vinicius e outros. Dos escritores locais, apenas George Farias esteve lá.

Essa brincadeira de ler, ouvir, relembrar e poetizar durou três horas seguida. À meia-noite, encerramos o expediente e fomos todos ver as esquetes, os contos eróticos e de terror, os espetáculos de dança, o rock e o som no barzinho com voz e violão.

Era tanta coisa rolando ao mesmo tempo que era um risco ficar aqui ou ali, cantando ou ouvindo atores, vendo a dança ou as exposições fotográficas. Algo seria perdido. E olha que algumas partes da programação não aconteceram.

Eu, por exemplo, perdi o sopão das 3h da manhã por estar na sessão de contos ao pé da cama. Logo depois da 4h da matina, depois de sacar que meu Overdoze não ia rolar, mas sim um simples Overnove, parti, com a imagem de roqueiros em frente a um palco no meio da rua e um coral de alegres amantes da MPB na área do barzinho do Sesc.

Na próxima mostra, vou com vários poemas decorados. E se tudo der certo, ainda levo os exemplares de meu próprio livro.

sexta-feira, setembro 23, 2005

A melhor coisa da semana


Overdoze

Miscelânea de Espetáculos, performances, esquetes, fragmentos de espetáculos, leitura dramática, música, cinema e artes plásticas. Com início às 20h e se estendendo até às 8h de domingo, em todos os espaços do Sesc, culminando com o encerramento da Mostra no Espaço Multicultural.
Vai rolar um sopão às 3h da madrugada. Algumas poesias de minha autoria serão declamadas. Não por mim, que criei vergonha e sai dos palcos, mas por outros mais corajosos.

terça-feira, setembro 20, 2005

Zombaria



Ele disse:

- Como é possível que você zombe de meu querer?

Ela o olhou e riu.

Ele disse, quase gritando:

- Você é muito cínica. Como você pode ser assim?

Ela, com extrema naturalidade, respondeu:

- Você não sabe? Bem que me avisaram da tua falta de imaginação...

sábado, setembro 17, 2005

Homens encapuzados invadem e tocam fogo em Centro Indígena de Formação

Faltando quatro dias para começar a festa da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, cerca de 150 homens encapuzados e armados com revólveres, espingardas, facões e pedaços de pau, invadiram e tocaram fogo, nesta madrugada, no Centro de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol, antiga Missão Surumu, a cerca de 230 quilômetros de Boa Vista.

Segundo informações colhidas por uma equipe do Conselho Indígena de Roraima ? CIR, que esteve no local hoje pela manhã, o vandalismo foi coordenado, supostamente, pelo vice-prefeito de Pacaraima, Anísio Pedrosa, e pelo vereador do município e tuxaua da aldeia Contão, Genilvaldo Macuxi. Os dois são ligados ao prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero, maior produtor de arroz da região.

A antiga Missão Surumu também foi invadida e depredada em janeiro de 2004 pelo mesmo grupo comandado por Quartieiro, que ameaça resistência armada a qualquer tentativa de retirada da área, homologada no dia 15 de abril pelo presidente Lula da Silva. Em 2004, três missionários foram seqüestrados e, mesmo a Polícia Federal tendo indiciado arrozeiros e líderes indígenas, até hoje niguém foi punido.

No ataque desta madrugada, as instalações do Centro foram completamente destruídas: igreja, hospital, dormitórios, refeitório masculino e feminino, banheiros, biblioteca, sala e quartos dos professores. (veja fotos no site www.cir.org.br).Durante a invasão, um professor do curso de Mecânica e cerca de 30 alunos estavam no Centro de Formação.

O professor Júlio que trabalha para o Senai, entidade parceira do Centro, foi agredido fisicamente, mas não corre perigo de morte.Um veículo Toyota do Convênio do CIR com a Funasa para Atenção Básica à Saúde no Distrito Sanitário Leste de Roraima, que fazia remoção de um paciente para Boa Vista, também foi interceptado pelo grupo. Os motoristas tiveram armas apontadas para suas cabeças, sofreram humilhações, agressões verbais e o carro foi depredado e o paciente indígena agredido fisicamente.

Após a agressão, uma aeronave foi fretada para remover a vítima. A Polícia Federal foi comunicada dos acontecimentos e nas primeiras horas da manhã de hoje enviou uma equipe para o local. Por volta do meio dia, os agentes chegaram em Boa Vista trazendo alunos, professor e lideranças indígenas para prestarem depoimentos.

O Conselho Indígena de Roraima repudia mais essa atitude covarde dos setores contrários aos direitos indígenas, manipulados por grupos políticos e econômicos, que historicamente usam a violência e valem-se da impunidade para conquistar os seus objetivos.

Conselho Indígena de Roraima

sexta-feira, setembro 16, 2005

quarta-feira, setembro 14, 2005

Comprei uma casa...


Olhando nos classificados, um
anúncio me chamou a atenção:

Vende-se casa no Tepequém.
Excelente localização, sem vizinhos chatos,
gramado amplo. Toda de madeira.
Preço de ocasião num dos pontos turísticos
mais legais de Roraima.



Não tive dúvidas e pensei: taí minha
casa de campo. Comprei sem ver.
Deu nisso aí do lado.








Pior do que isso é a entrada do terreno, erodida até dizer basta pela ação de garimpeiros atrás de diamantes.
Não tem como convidar nenhum amigo
que sofra de labirintite ou esteja fora de forma.





Mas o que interessa é que estou em casa
e posso dormir tranquilo (quando conseguir fazer a picape pegar):


segunda-feira, setembro 12, 2005

Mudança

(Escrito em parceria com Zanny Adairalba)



Vou mudar
Vou mudar desde ontem
Vou colocar numa ata
Minhas dores e maldições
Vou esquecer do futuro
Vou construir meu presente
Ser mais presente que choro
Menos ausente nas lágrimas
Navegar meus lagos
Cantar mais alto no escuro
Deixar de pedir aprovação de outros
Impor minhas vontades
Rasgar um beijo no meio da sala
Colocar para passear meus pensamentos nus

Vou mudar
Vou afirmar minhas dúvidas
Minhas idas, minhas cantigas
Ser diversa, colorida, ser viagem sem fim
Ser começo, clichê e reprise.
Gotas de chocolate e canela numa taça de café
Música alta na madrugada
Concerto de música clássica
Bach, Vivaldi e tenores
Santidade ouvindo Scorpions
Velocidade furiosa, certeira calma
Calma...

Vou mudar
Vou mudar para o meu mundo
Pés descalços, vagabundos
Esperanças na mochila
Descobridora dos Andes,
Deusa das neves eternas
Vulcão em erupção
Vida, sobrevivência, majestade.
Pergunta amorosa no meio da estrada.
Sofás na calçada, bêbados sem nome
Segredos no ar, filme noir
Serei Alfredo, Josefa, Severina e Monalisa
Dançando solta na brisa
Aos quatro cantos do mundo vou gritar
Que é bem preciso ser louco
Para no meio do jogo
Dar xeque-mate e mudar.

quinta-feira, setembro 08, 2005

Da série Ouvidos na Rua: bola de marca


Na avenida Jaime Brasil, centro de Boa Vista, a dupla:

- Que bola de basquete legal! Esse material é diferente, né?
- É, essa aqui é igualzinha à dos caras que apareceram final de semana na televisão, no campeonato de basquete de rua.
- Mas o preço era igual àquela outra da primeira loja?
- Mesma coisa. E a outra era podrona. Essa aqui é da Nike.

Alguns metros e na esquina aparece uma moça com uma comissão de frente de responsa:

- Nossa, o que é aquilo?
- Caraca, será que são de verdade ou não?
- Eu acho que são da Nike...

terça-feira, setembro 06, 2005

Da deixa

Os dois estavam cansados. Haviam acabado de reencontrar-se depois de estarem muito tempo ausentes. Era o cheiro de um incrustando-se no outro, deixando suas marcas na pele, ampliando aquilo que Nelson Rodrigues chamou, com outras palavras, de nostalgia amorosa.

Aquela história havia começado assim, quase por acaso. Cheios de passado, não arriscavam dar-se totalmente. "Vá lá e a entrega vire uma arma mortal nas mãos desta figura", pensavam às escondidas.

Os cabelos da menina, cacheados, pretos e acariciados, grudavam na pele, como se fosse desleixo. Os olhos de ambos procuravam um tipo de verdade ? sempre faziam isso e nunca a achavam. "É incrível o tamanho do poço de mistérios cavado por uma pessoa sem que ninguém caia nele", lembravam ter lido em uma tabuleta pendurada na mureta de um bar. Costumavam repetir a frase durante conversas com seus amigos.

Era uma despedida. Ficara acordado: cada um procuraria o que fazer longe do outro. A cena era comum, pobre até, mas carregada de simbolismo. Dois corpos próximos pensando na distância.
"Do jeito que os relacionamentos terminam ou se estendem, as visões assumem tons surrealistas", filosofava o rapaz. A sua experiência, pouca mais válida, afirmava que sempre um dos que formam o romance desencanta-se e diz "tudo bem. Seremos bons amigos...". Entre parênteses e após as reticências, vem escrito em letras enormes: "talvez dentro de alguns anos!".

A menina lembrava de sua amiga mais querida. Ela sempre falava que quando há bom humor e um pouco de sordidez, rosas são enviadas aos alérgicos, acompanhadas de um cartão colorido, burlesco, com os seguintes dizeres em letras escandalosas: "lembranças de um passado inglório".
Não era este o caso deles. Casal jovem e bonito, decidiu acabar com o romance de uma maneira mais suave, como se fosse a queda de uma pétala, ato que não resulta em mágoas para a rosa ou para quem a admira. O motivo da deixa foi descoberto logo. Algo faltava entre os dois. Se era vivência, cumplicidade, sentimento, não conseguiram descobrir. Com pouco tempo para conversar sobre o futuro, só haviam achado espaço para debater o final de seu convívio.

Fora do quarto, a chuva caia. Por coincidência, tocava na rádio uma música antiga, dizendo "chove lá fora e aqui faz tanto frio...". Caras sérias, mãos tímidas, palavras pronunciadas suavemente. Parecia uma sessão inquisitorial, onde o juiz determina a morte do herege com total frieza, com a certeza de fazê-lo em nome de Deus e da moral. Se era assim, para que continuar?

Enquanto as lágrimas rolavam pelo rosto de um, o outro pensava como era possível gostar de alguém e não sentir a sua falta. Ele a puxou pelos braços e começou a beijá-la, com o mesmo desejo que um outro cantou: "venha me beijar, meu doce vampiro, à luz do luar...".

Tocaram-se, sentiram novamente o gosto do suor, disseram "até logo. Um dia a gente se cruza e comenta a nossa história, cheia de mentiras verdadeiras e verdades mentirosas".

sexta-feira, setembro 02, 2005

Outra foto






Tepequém, região onde se extraiu muito diamante em méados do século passado. Apesar da degradação, ainda há muita beleza a ser vista. Apareceu um domingo desses no Fantástico, no quadro Me Leva Brasil, ou coisa parecida.