sexta-feira, setembro 30, 2005
quinta-feira, setembro 29, 2005
Entendimento
Ela disse:
- Eu não entendo como você pode ser tão canalha.
Ele respondeu, sinceramente preocupado:
- Sabe que eu tenho a mesma dificuldade?
terça-feira, setembro 27, 2005
Destinos
Era um homem triste. Perdera tudo o que a vida havia lhe dado. Ao caminhar pelas ruas de seu bairro, ficava às vezes chorando baixinho, envergonhado de viver. Patético, bebia álcool puro por falta de dinheiro para comprar o uísque antes saboreado na varanda de sua antiga casa. Morreu sozinho, sem parentes que reclamassem seu corpo, encontrado na calçada onde vez ou outra amanhecia dormindo.
segunda-feira, setembro 26, 2005
Resuminho do Overdoze da Mostra Sesc Macuxi de Artes Cênicas
Às 21 horas começou na biblioteca do Sesc a leitura de poesias. Eu, que seria apenas um ouvinte, entrei logo na roda dos falantes. Mas isso só depois de perceber que as três pessoas que havia convidado para ler meus poemas não iam aparecer a tempo (aliás, eles estavam tão ocupados dirigindo, fotografando e lendo contos em outros espaços da mostra que só chegaram de madrugada na biblioteca).
Começamos assim, um pedindo ao outro, outro pedindo ao um. De repente, a timidez saiu da sala e em alguns momentos era preciso pedir mais de uma vez a palavra para garantir a oportunidade. Crianças leram corajosamente e bem baixinho poemas descobertos nos livros da biblioteca, adultos (entre eles a Zanny e este cronista) criaram textos para ler na mesma hora, outros montaram poesias em voz alta, num diálogo com os próximos.
E quando o silêncio queria tomar conta da sala, eu pensava estar em um leilão de palavras e dizia "quem dá mais, quem dá mais?", estimulando uma nova corrida de versos. E se a memória falhava, apelava-se para os escritos de Drummond, Pessoa, Bandeira, Vinicius e outros. Dos escritores locais, apenas George Farias esteve lá.
Essa brincadeira de ler, ouvir, relembrar e poetizar durou três horas seguida. À meia-noite, encerramos o expediente e fomos todos ver as esquetes, os contos eróticos e de terror, os espetáculos de dança, o rock e o som no barzinho com voz e violão.
Era tanta coisa rolando ao mesmo tempo que era um risco ficar aqui ou ali, cantando ou ouvindo atores, vendo a dança ou as exposições fotográficas. Algo seria perdido. E olha que algumas partes da programação não aconteceram.
Eu, por exemplo, perdi o sopão das 3h da manhã por estar na sessão de contos ao pé da cama. Logo depois da 4h da matina, depois de sacar que meu Overdoze não ia rolar, mas sim um simples Overnove, parti, com a imagem de roqueiros em frente a um palco no meio da rua e um coral de alegres amantes da MPB na área do barzinho do Sesc.
Na próxima mostra, vou com vários poemas decorados. E se tudo der certo, ainda levo os exemplares de meu próprio livro.
Às 21 horas começou na biblioteca do Sesc a leitura de poesias. Eu, que seria apenas um ouvinte, entrei logo na roda dos falantes. Mas isso só depois de perceber que as três pessoas que havia convidado para ler meus poemas não iam aparecer a tempo (aliás, eles estavam tão ocupados dirigindo, fotografando e lendo contos em outros espaços da mostra que só chegaram de madrugada na biblioteca).
Começamos assim, um pedindo ao outro, outro pedindo ao um. De repente, a timidez saiu da sala e em alguns momentos era preciso pedir mais de uma vez a palavra para garantir a oportunidade. Crianças leram corajosamente e bem baixinho poemas descobertos nos livros da biblioteca, adultos (entre eles a Zanny e este cronista) criaram textos para ler na mesma hora, outros montaram poesias em voz alta, num diálogo com os próximos.
E quando o silêncio queria tomar conta da sala, eu pensava estar em um leilão de palavras e dizia "quem dá mais, quem dá mais?", estimulando uma nova corrida de versos. E se a memória falhava, apelava-se para os escritos de Drummond, Pessoa, Bandeira, Vinicius e outros. Dos escritores locais, apenas George Farias esteve lá.
Essa brincadeira de ler, ouvir, relembrar e poetizar durou três horas seguida. À meia-noite, encerramos o expediente e fomos todos ver as esquetes, os contos eróticos e de terror, os espetáculos de dança, o rock e o som no barzinho com voz e violão.
Era tanta coisa rolando ao mesmo tempo que era um risco ficar aqui ou ali, cantando ou ouvindo atores, vendo a dança ou as exposições fotográficas. Algo seria perdido. E olha que algumas partes da programação não aconteceram.
Eu, por exemplo, perdi o sopão das 3h da manhã por estar na sessão de contos ao pé da cama. Logo depois da 4h da matina, depois de sacar que meu Overdoze não ia rolar, mas sim um simples Overnove, parti, com a imagem de roqueiros em frente a um palco no meio da rua e um coral de alegres amantes da MPB na área do barzinho do Sesc.
Na próxima mostra, vou com vários poemas decorados. E se tudo der certo, ainda levo os exemplares de meu próprio livro.
sexta-feira, setembro 23, 2005
A melhor coisa da semana
Overdoze
Miscelânea de Espetáculos, performances, esquetes, fragmentos de espetáculos, leitura dramática, música, cinema e artes plásticas. Com início às 20h e se estendendo até às 8h de domingo, em todos os espaços do Sesc, culminando com o encerramento da Mostra no Espaço Multicultural.
Vai rolar um sopão às 3h da madrugada. Algumas poesias de minha autoria serão declamadas. Não por mim, que criei vergonha e sai dos palcos, mas por outros mais corajosos.
Overdoze
Miscelânea de Espetáculos, performances, esquetes, fragmentos de espetáculos, leitura dramática, música, cinema e artes plásticas. Com início às 20h e se estendendo até às 8h de domingo, em todos os espaços do Sesc, culminando com o encerramento da Mostra no Espaço Multicultural.
Vai rolar um sopão às 3h da madrugada. Algumas poesias de minha autoria serão declamadas. Não por mim, que criei vergonha e sai dos palcos, mas por outros mais corajosos.
terça-feira, setembro 20, 2005
sábado, setembro 17, 2005
Homens encapuzados invadem e tocam fogo em Centro Indígena de Formação
Faltando quatro dias para começar a festa da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, cerca de 150 homens encapuzados e armados com revólveres, espingardas, facões e pedaços de pau, invadiram e tocaram fogo, nesta madrugada, no Centro de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol, antiga Missão Surumu, a cerca de 230 quilômetros de Boa Vista.
Segundo informações colhidas por uma equipe do Conselho Indígena de Roraima ? CIR, que esteve no local hoje pela manhã, o vandalismo foi coordenado, supostamente, pelo vice-prefeito de Pacaraima, Anísio Pedrosa, e pelo vereador do município e tuxaua da aldeia Contão, Genilvaldo Macuxi. Os dois são ligados ao prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero, maior produtor de arroz da região.
A antiga Missão Surumu também foi invadida e depredada em janeiro de 2004 pelo mesmo grupo comandado por Quartieiro, que ameaça resistência armada a qualquer tentativa de retirada da área, homologada no dia 15 de abril pelo presidente Lula da Silva. Em 2004, três missionários foram seqüestrados e, mesmo a Polícia Federal tendo indiciado arrozeiros e líderes indígenas, até hoje niguém foi punido.
No ataque desta madrugada, as instalações do Centro foram completamente destruídas: igreja, hospital, dormitórios, refeitório masculino e feminino, banheiros, biblioteca, sala e quartos dos professores. (veja fotos no site www.cir.org.br).Durante a invasão, um professor do curso de Mecânica e cerca de 30 alunos estavam no Centro de Formação.
O professor Júlio que trabalha para o Senai, entidade parceira do Centro, foi agredido fisicamente, mas não corre perigo de morte.Um veículo Toyota do Convênio do CIR com a Funasa para Atenção Básica à Saúde no Distrito Sanitário Leste de Roraima, que fazia remoção de um paciente para Boa Vista, também foi interceptado pelo grupo. Os motoristas tiveram armas apontadas para suas cabeças, sofreram humilhações, agressões verbais e o carro foi depredado e o paciente indígena agredido fisicamente.
Após a agressão, uma aeronave foi fretada para remover a vítima. A Polícia Federal foi comunicada dos acontecimentos e nas primeiras horas da manhã de hoje enviou uma equipe para o local. Por volta do meio dia, os agentes chegaram em Boa Vista trazendo alunos, professor e lideranças indígenas para prestarem depoimentos.
O Conselho Indígena de Roraima repudia mais essa atitude covarde dos setores contrários aos direitos indígenas, manipulados por grupos políticos e econômicos, que historicamente usam a violência e valem-se da impunidade para conquistar os seus objetivos.
Conselho Indígena de Roraima
Faltando quatro dias para começar a festa da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, cerca de 150 homens encapuzados e armados com revólveres, espingardas, facões e pedaços de pau, invadiram e tocaram fogo, nesta madrugada, no Centro de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol, antiga Missão Surumu, a cerca de 230 quilômetros de Boa Vista.
Segundo informações colhidas por uma equipe do Conselho Indígena de Roraima ? CIR, que esteve no local hoje pela manhã, o vandalismo foi coordenado, supostamente, pelo vice-prefeito de Pacaraima, Anísio Pedrosa, e pelo vereador do município e tuxaua da aldeia Contão, Genilvaldo Macuxi. Os dois são ligados ao prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero, maior produtor de arroz da região.
A antiga Missão Surumu também foi invadida e depredada em janeiro de 2004 pelo mesmo grupo comandado por Quartieiro, que ameaça resistência armada a qualquer tentativa de retirada da área, homologada no dia 15 de abril pelo presidente Lula da Silva. Em 2004, três missionários foram seqüestrados e, mesmo a Polícia Federal tendo indiciado arrozeiros e líderes indígenas, até hoje niguém foi punido.
No ataque desta madrugada, as instalações do Centro foram completamente destruídas: igreja, hospital, dormitórios, refeitório masculino e feminino, banheiros, biblioteca, sala e quartos dos professores. (veja fotos no site www.cir.org.br).Durante a invasão, um professor do curso de Mecânica e cerca de 30 alunos estavam no Centro de Formação.
O professor Júlio que trabalha para o Senai, entidade parceira do Centro, foi agredido fisicamente, mas não corre perigo de morte.Um veículo Toyota do Convênio do CIR com a Funasa para Atenção Básica à Saúde no Distrito Sanitário Leste de Roraima, que fazia remoção de um paciente para Boa Vista, também foi interceptado pelo grupo. Os motoristas tiveram armas apontadas para suas cabeças, sofreram humilhações, agressões verbais e o carro foi depredado e o paciente indígena agredido fisicamente.
Após a agressão, uma aeronave foi fretada para remover a vítima. A Polícia Federal foi comunicada dos acontecimentos e nas primeiras horas da manhã de hoje enviou uma equipe para o local. Por volta do meio dia, os agentes chegaram em Boa Vista trazendo alunos, professor e lideranças indígenas para prestarem depoimentos.
O Conselho Indígena de Roraima repudia mais essa atitude covarde dos setores contrários aos direitos indígenas, manipulados por grupos políticos e econômicos, que historicamente usam a violência e valem-se da impunidade para conquistar os seus objetivos.
Conselho Indígena de Roraima
quarta-feira, setembro 14, 2005
Comprei uma casa...
Olhando nos classificados, um
anúncio me chamou a atenção:
Vende-se casa no Tepequém.
Excelente localização, sem vizinhos chatos,
gramado amplo. Toda de madeira.
Preço de ocasião num dos pontos turísticos
mais legais de Roraima.
Não tive dúvidas e pensei: taí minha
casa de campo. Comprei sem ver.
Deu nisso aí do lado.
Pior do que isso é a entrada do terreno, erodida até dizer basta pela ação de garimpeiros atrás de diamantes.
Não tem como convidar nenhum amigo
que sofra de labirintite ou esteja fora de forma.
Mas o que interessa é que estou em casa
e posso dormir tranquilo (quando conseguir fazer a picape pegar):
Olhando nos classificados, um
anúncio me chamou a atenção:
Vende-se casa no Tepequém.
Excelente localização, sem vizinhos chatos,
gramado amplo. Toda de madeira.
Preço de ocasião num dos pontos turísticos
mais legais de Roraima.
Não tive dúvidas e pensei: taí minha
casa de campo. Comprei sem ver.
Deu nisso aí do lado.
Pior do que isso é a entrada do terreno, erodida até dizer basta pela ação de garimpeiros atrás de diamantes.
Não tem como convidar nenhum amigo
que sofra de labirintite ou esteja fora de forma.
Mas o que interessa é que estou em casa
e posso dormir tranquilo (quando conseguir fazer a picape pegar):
segunda-feira, setembro 12, 2005
Mudança
(Escrito em parceria com Zanny Adairalba)
Vou mudar
Vou mudar desde ontem
Vou colocar numa ata
Minhas dores e maldições
Vou esquecer do futuro
Vou construir meu presente
Ser mais presente que choro
Menos ausente nas lágrimas
Navegar meus lagos
Cantar mais alto no escuro
Deixar de pedir aprovação de outros
Impor minhas vontades
Rasgar um beijo no meio da sala
Colocar para passear meus pensamentos nus
Vou mudar
Vou afirmar minhas dúvidas
Minhas idas, minhas cantigas
Ser diversa, colorida, ser viagem sem fim
Ser começo, clichê e reprise.
Gotas de chocolate e canela numa taça de café
Música alta na madrugada
Concerto de música clássica
Bach, Vivaldi e tenores
Santidade ouvindo Scorpions
Velocidade furiosa, certeira calma
Calma...
Vou mudar
Vou mudar para o meu mundo
Pés descalços, vagabundos
Esperanças na mochila
Descobridora dos Andes,
Deusa das neves eternas
Vulcão em erupção
Vida, sobrevivência, majestade.
Pergunta amorosa no meio da estrada.
Sofás na calçada, bêbados sem nome
Segredos no ar, filme noir
Serei Alfredo, Josefa, Severina e Monalisa
Dançando solta na brisa
Aos quatro cantos do mundo vou gritar
Que é bem preciso ser louco
Para no meio do jogo
Dar xeque-mate e mudar.
(Escrito em parceria com Zanny Adairalba)
Vou mudar
Vou mudar desde ontem
Vou colocar numa ata
Minhas dores e maldições
Vou esquecer do futuro
Vou construir meu presente
Ser mais presente que choro
Menos ausente nas lágrimas
Navegar meus lagos
Cantar mais alto no escuro
Deixar de pedir aprovação de outros
Impor minhas vontades
Rasgar um beijo no meio da sala
Colocar para passear meus pensamentos nus
Vou mudar
Vou afirmar minhas dúvidas
Minhas idas, minhas cantigas
Ser diversa, colorida, ser viagem sem fim
Ser começo, clichê e reprise.
Gotas de chocolate e canela numa taça de café
Música alta na madrugada
Concerto de música clássica
Bach, Vivaldi e tenores
Santidade ouvindo Scorpions
Velocidade furiosa, certeira calma
Calma...
Vou mudar
Vou mudar para o meu mundo
Pés descalços, vagabundos
Esperanças na mochila
Descobridora dos Andes,
Deusa das neves eternas
Vulcão em erupção
Vida, sobrevivência, majestade.
Pergunta amorosa no meio da estrada.
Sofás na calçada, bêbados sem nome
Segredos no ar, filme noir
Serei Alfredo, Josefa, Severina e Monalisa
Dançando solta na brisa
Aos quatro cantos do mundo vou gritar
Que é bem preciso ser louco
Para no meio do jogo
Dar xeque-mate e mudar.
quinta-feira, setembro 08, 2005
Da série Ouvidos na Rua: bola de marca
Na avenida Jaime Brasil, centro de Boa Vista, a dupla:
- Que bola de basquete legal! Esse material é diferente, né?
- É, essa aqui é igualzinha à dos caras que apareceram final de semana na televisão, no campeonato de basquete de rua.
- Mas o preço era igual àquela outra da primeira loja?
- Mesma coisa. E a outra era podrona. Essa aqui é da Nike.
Alguns metros e na esquina aparece uma moça com uma comissão de frente de responsa:
- Nossa, o que é aquilo?
- Caraca, será que são de verdade ou não?
- Eu acho que são da Nike...
Na avenida Jaime Brasil, centro de Boa Vista, a dupla:
- Que bola de basquete legal! Esse material é diferente, né?
- É, essa aqui é igualzinha à dos caras que apareceram final de semana na televisão, no campeonato de basquete de rua.
- Mas o preço era igual àquela outra da primeira loja?
- Mesma coisa. E a outra era podrona. Essa aqui é da Nike.
Alguns metros e na esquina aparece uma moça com uma comissão de frente de responsa:
- Nossa, o que é aquilo?
- Caraca, será que são de verdade ou não?
- Eu acho que são da Nike...
terça-feira, setembro 06, 2005
Da deixa
Os dois estavam cansados. Haviam acabado de reencontrar-se depois de estarem muito tempo ausentes. Era o cheiro de um incrustando-se no outro, deixando suas marcas na pele, ampliando aquilo que Nelson Rodrigues chamou, com outras palavras, de nostalgia amorosa.
Aquela história havia começado assim, quase por acaso. Cheios de passado, não arriscavam dar-se totalmente. "Vá lá e a entrega vire uma arma mortal nas mãos desta figura", pensavam às escondidas.
Os cabelos da menina, cacheados, pretos e acariciados, grudavam na pele, como se fosse desleixo. Os olhos de ambos procuravam um tipo de verdade ? sempre faziam isso e nunca a achavam. "É incrível o tamanho do poço de mistérios cavado por uma pessoa sem que ninguém caia nele", lembravam ter lido em uma tabuleta pendurada na mureta de um bar. Costumavam repetir a frase durante conversas com seus amigos.
Era uma despedida. Ficara acordado: cada um procuraria o que fazer longe do outro. A cena era comum, pobre até, mas carregada de simbolismo. Dois corpos próximos pensando na distância.
"Do jeito que os relacionamentos terminam ou se estendem, as visões assumem tons surrealistas", filosofava o rapaz. A sua experiência, pouca mais válida, afirmava que sempre um dos que formam o romance desencanta-se e diz "tudo bem. Seremos bons amigos...". Entre parênteses e após as reticências, vem escrito em letras enormes: "talvez dentro de alguns anos!".
A menina lembrava de sua amiga mais querida. Ela sempre falava que quando há bom humor e um pouco de sordidez, rosas são enviadas aos alérgicos, acompanhadas de um cartão colorido, burlesco, com os seguintes dizeres em letras escandalosas: "lembranças de um passado inglório".
Não era este o caso deles. Casal jovem e bonito, decidiu acabar com o romance de uma maneira mais suave, como se fosse a queda de uma pétala, ato que não resulta em mágoas para a rosa ou para quem a admira. O motivo da deixa foi descoberto logo. Algo faltava entre os dois. Se era vivência, cumplicidade, sentimento, não conseguiram descobrir. Com pouco tempo para conversar sobre o futuro, só haviam achado espaço para debater o final de seu convívio.
Fora do quarto, a chuva caia. Por coincidência, tocava na rádio uma música antiga, dizendo "chove lá fora e aqui faz tanto frio...". Caras sérias, mãos tímidas, palavras pronunciadas suavemente. Parecia uma sessão inquisitorial, onde o juiz determina a morte do herege com total frieza, com a certeza de fazê-lo em nome de Deus e da moral. Se era assim, para que continuar?
Enquanto as lágrimas rolavam pelo rosto de um, o outro pensava como era possível gostar de alguém e não sentir a sua falta. Ele a puxou pelos braços e começou a beijá-la, com o mesmo desejo que um outro cantou: "venha me beijar, meu doce vampiro, à luz do luar...".
Tocaram-se, sentiram novamente o gosto do suor, disseram "até logo. Um dia a gente se cruza e comenta a nossa história, cheia de mentiras verdadeiras e verdades mentirosas".
Os dois estavam cansados. Haviam acabado de reencontrar-se depois de estarem muito tempo ausentes. Era o cheiro de um incrustando-se no outro, deixando suas marcas na pele, ampliando aquilo que Nelson Rodrigues chamou, com outras palavras, de nostalgia amorosa.
Aquela história havia começado assim, quase por acaso. Cheios de passado, não arriscavam dar-se totalmente. "Vá lá e a entrega vire uma arma mortal nas mãos desta figura", pensavam às escondidas.
Os cabelos da menina, cacheados, pretos e acariciados, grudavam na pele, como se fosse desleixo. Os olhos de ambos procuravam um tipo de verdade ? sempre faziam isso e nunca a achavam. "É incrível o tamanho do poço de mistérios cavado por uma pessoa sem que ninguém caia nele", lembravam ter lido em uma tabuleta pendurada na mureta de um bar. Costumavam repetir a frase durante conversas com seus amigos.
Era uma despedida. Ficara acordado: cada um procuraria o que fazer longe do outro. A cena era comum, pobre até, mas carregada de simbolismo. Dois corpos próximos pensando na distância.
"Do jeito que os relacionamentos terminam ou se estendem, as visões assumem tons surrealistas", filosofava o rapaz. A sua experiência, pouca mais válida, afirmava que sempre um dos que formam o romance desencanta-se e diz "tudo bem. Seremos bons amigos...". Entre parênteses e após as reticências, vem escrito em letras enormes: "talvez dentro de alguns anos!".
A menina lembrava de sua amiga mais querida. Ela sempre falava que quando há bom humor e um pouco de sordidez, rosas são enviadas aos alérgicos, acompanhadas de um cartão colorido, burlesco, com os seguintes dizeres em letras escandalosas: "lembranças de um passado inglório".
Não era este o caso deles. Casal jovem e bonito, decidiu acabar com o romance de uma maneira mais suave, como se fosse a queda de uma pétala, ato que não resulta em mágoas para a rosa ou para quem a admira. O motivo da deixa foi descoberto logo. Algo faltava entre os dois. Se era vivência, cumplicidade, sentimento, não conseguiram descobrir. Com pouco tempo para conversar sobre o futuro, só haviam achado espaço para debater o final de seu convívio.
Fora do quarto, a chuva caia. Por coincidência, tocava na rádio uma música antiga, dizendo "chove lá fora e aqui faz tanto frio...". Caras sérias, mãos tímidas, palavras pronunciadas suavemente. Parecia uma sessão inquisitorial, onde o juiz determina a morte do herege com total frieza, com a certeza de fazê-lo em nome de Deus e da moral. Se era assim, para que continuar?
Enquanto as lágrimas rolavam pelo rosto de um, o outro pensava como era possível gostar de alguém e não sentir a sua falta. Ele a puxou pelos braços e começou a beijá-la, com o mesmo desejo que um outro cantou: "venha me beijar, meu doce vampiro, à luz do luar...".
Tocaram-se, sentiram novamente o gosto do suor, disseram "até logo. Um dia a gente se cruza e comenta a nossa história, cheia de mentiras verdadeiras e verdades mentirosas".
sexta-feira, setembro 02, 2005
quarta-feira, agosto 31, 2005
terça-feira, agosto 30, 2005
Detrás dos vidros
A dona da dor
Esquece sua força e
Baixa a guarda.
Seus olhos, protegidos pelo vidro,
Mostram pedaços de fragilidade.
A postura continua a mesma
Por alguns segundos. De repente,
Deita a cabeça e ri. Riso triste,
Parecendo um grito de socorro.
Dona da sua dor, conversa
Sobre o presente.
Lembra do passado, desanimada com o porvir.
Escudos abaixados, coloca
As armas em riste - não esquece
Por completo a sua situação - e sorri.
Maliciosa, molha os lábios com
A ponta da língua e eu,
Que me julgava senhor,
Viro uma criança dominada
Pela dona e sua dor.
Making of:
Feito de um tiro só, numa aula de história da Amazônia no milênio passado, quando cursava Jornalismo, pensando numa conversa tida uns dias ou horas antes com uma menina que muito me atraia. Classificado e interpretado num concurso de poesia, o texto foi parar numa coletânea poética impressa pelo Sesi Roraima. A palavra dor é repetida várias vezes devido ao nome da menina: Maria das Dores.
segunda-feira, agosto 29, 2005
Coisas de Roraima
Domingo, 17h30, tarde tranqüila, vento frio, o verão deu uma recuada. Nas arvores à margem do igarapé Mirandinha, muitos papagaios fazem a sua arruaça vespertina enquanto se alimentam. Na rua sem tráfego, voltando para casa, apenas eu, eles e o vento frio.
Muitas vezes é bom estar aqui.
Domingo, 17h30, tarde tranqüila, vento frio, o verão deu uma recuada. Nas arvores à margem do igarapé Mirandinha, muitos papagaios fazem a sua arruaça vespertina enquanto se alimentam. Na rua sem tráfego, voltando para casa, apenas eu, eles e o vento frio.
Muitas vezes é bom estar aqui.
quinta-feira, agosto 25, 2005
Pensamentos
Ela disse, brincalhonamente manhosa:
- Faz tempo que não te dou prejuízo nem dor de cabeça, né, amor?
Ele respondeu carinhosamente:
- É, querida. Faz tempo que você não me dá prejuízo ou dor de cabeça.
E pensou, triste e ressentido:
- Na verdade, faz tempo que você não me dá nada...
terça-feira, agosto 23, 2005
segunda-feira, agosto 22, 2005
quinta-feira, agosto 18, 2005
Atentado
Foi assim: saquei a grana na terça à noite para tocar um pouco do muito que falta do mês. Na quarta, 18h, procurando um número de telefone na carteira, o vazio. Em vez das cédulas, o nada, o agoniante nada, a maior agressão ao corpo humano que se conhece na história.
O golpe certeiro, calculado, foi frio. A carteira estava dentro de uma pochete, que estava dentro de uma mochila. Nada estava fora do lugar.
A única alegria é que não foi no começo do mês, senão o ladrão ia levar muito mais que os R$ 120 da semana.
Foi assim: saquei a grana na terça à noite para tocar um pouco do muito que falta do mês. Na quarta, 18h, procurando um número de telefone na carteira, o vazio. Em vez das cédulas, o nada, o agoniante nada, a maior agressão ao corpo humano que se conhece na história.
O golpe certeiro, calculado, foi frio. A carteira estava dentro de uma pochete, que estava dentro de uma mochila. Nada estava fora do lugar.
A única alegria é que não foi no começo do mês, senão o ladrão ia levar muito mais que os R$ 120 da semana.
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