domingo, janeiro 02, 2005

Histórias rotineiras

Um dia ela retornou ao seu lar, depois de muitos anos viajando por terras estranhas, de costumes diversos, de línguas a se aprender e conhecer.
Mas seus amigos agora eram outros, sua vida era outra. O mundo estava mudado.
No começo, a redaptação, a alteração de costumes, as dficuldades.
Se ela já era diferente quando havia partido, neste novo tempo o era muito mais.
Às noites, frio e calor conforme as estações passavam.
Sem histórias válidas para sua situação, reconquistou o conhecido e dominou os imprevistos.
Um dia, acordou e percebeu como uma vida distinta tomava conta dela. E gostou do que viu.


terça-feira, dezembro 28, 2004

O fim da viagem

Então, depois de sobreviver a falhas mecânicas e humanas em dois países , percorrer milhares de quilômetros, há uma hora em que a falha deve ser nossa e não dos outros.
Leia mais e saberá do que se trata.
Mas antes, vamos traçar a rota da viagem à Machupicchu, que começou no dia 12 de dezembro de 2004.

Boa Vista (RR) a Manaus (AM): bus
Manaus a Tabatinga (fronteira do Brasil com a Colômbia e o Peru): avião
Tabatinga a Iquitos (Peru): barco rápido
Iquitos a Lima (capital do Peru): bus
Lima a Arequipa: bus
Arequipa, Vale do Colca, Arequipa: bus
Arequipa a Cuzco: bus
Cuzco, Vale Sagrado dos Incas, Cuzco: bus
Cuzco a Puno: bus

Até aqui, havia rodado uns 5.500 km. Após a última postagem, feita em Puno, passei o maior frio de toda a viagem. Puno gelou às 17h, com uma chuva fina que me obrigou a esconder-me no hostal bem cedo. Aproveitei para ler o livro de quadrinhos da Mafalda, ouvir rádio e deixar tudo pronto para o dia 24 de dezembro, quando começaria a viagem de volta ao Brasil.

24 de dezembro, Puno, 8h, em direção a La Paz.

Deixo para trás os ciclotáxis de Puno e embarco no bus com muitos europeus que vão ficar em Copacabana, a única escala da viagem.
Na fronteira do Peru com a Bolívia, troco dólares por bolivianos, dou entrada no país no mesmo dia que vencia minha permissão de 10 dias para estar no Peru (prazo que pedi para que sobrasse tempo e não propositadamente, vale dizer).
Avançamos pelo altiplano, tendo o lago Titicaca como companheiro ao lado esquerdo da estrada e o atravessamos de balsa num estreito.
Descubro tarde que o câmbio do lado boliviano é mais vantajoso (um dólar por oito bolivianos e não 1x7,8 como no Peru).
Em Copacabana, todos pagamos um boliviano de taxa de entrada à cidade. Sem exceção. Adiantamos os relógios em uma hora e recomeçamos a viagem às 13hh30, depois de 60 minutos de descanso.
Há crianças gritando por dinheiro e doces ao longo do caminho boliviano. Invejo um pouco a coragem e disposição de uma britânica, filha de uma filipina com um cretense, que fez o caminho do Inka, trilha que dura vários dias e reproduz o trecho que unia a capital do império inka, Cuzco, a Machupichhu.
Chegamos a La Paz às 17 horas. Procuro pelas ruas cheias de fumaça uma agência para comprar uma passagem de avião. Não quero passar mais quatro dias viajando. Tem um avião sim, para amanhã, me diz a moça da agência. Custa 350 dólares e vai para São Paulo. Outro mais barato? Sim, custa 330 dólares...
Saio para procurar a rodoviária desta poluída cidade que me parece uma Sampa sem ordem no trânsito, mas com muito menos oxigênio. As duas mochilas me cansam e o ar seco irrita minhas narinas, de onde sai catarro com sangue há dias. Na entrada da rodoviária, um boliviano treina um salto de um jeito conhecido. Sim, é capoeira e ele treina sozinho, me conta.
Passagem para Cochabamba somente no ônibus das 21 horas. Meu natal será na estrada. O meu e o de muitas outras pessoas.
É o primeiro natal que passo realmente sozinho, sem amigos ou familiares por perto. Não foi tão ruim, concluirei no outro dia, já em Cochama, como apelidam a cidade.
Saímos da rodoviária às 21 horas, como combinado, mas ficamos parados 80 minutos no subúrbio de Lima. Entram vendedores de chocolates e livros para tentar tirar o lucro da noite. Poucas vendas, apesar da boa oratória.

25 de dezembro, 4h40, Cochabamba

Os vendedores da empresa Expreso San Luiz gritam a toda voz que o próximo bus para Santa Cruz de la Sierra sai às 5h30, por apenas 50 bolivianos. Descubrirei na estrada que a passagem oscilou entre 30 e 50 pratas, dependendo do horário de compra.
O ônibus deixará a estação somente às 6h30, quebrará às 7h na saída de Cochama e o motorista e as duas crianças que o auxiliam nesta viagem de 495 km serão abordados pela polícia em seguida. Os responsáveis enviarão outro ônibus somente às 7h45 para recolher os passageiros e seguir viagem. Ao lado do motorista, um saco de folhas de coca.
Passamos pela serra da região do Chapare, onde o MAS, partido do deputado Evo Morales, liderança indígena boliviana, mantém uma luta para permitir que os agricultores possam continuar cultivando a planta da coca e manter uma tradição milenar. Como dizem no Peru, a coca é do bem, a cocaína, essa sim, é do mal.
Às 11 horas, já nos trópicos, o motorista e seu auxiliar, também um adolescente de não mais de 16 anos, aproveitam a parada de 60 minutos para o almoço e trocam todas as correias do motor.
Às 12h45, ao atravessar a ponte do rio Zapata, um dos pneus traseiros explodirá, sendo substituído por outro tão liso como um CD novo.
Na estrada, construções tomadas pela selva, cidadezinhas, plantações, fazendas, arvores frutíferas como só nos trópicos é possível. Pés de manga atiçam minha fome.
Chegamos vivos a Santa Cruz às 16h30.
Na estação de trem, filas imensas de turistas que vão passar o reveillon em Balneário Camburiu, São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia.
Não há passagem de trem, não há ônibus para Puerto Quijarro, as autoridades me recomendam não comprar as passagens oferecidas pelos cambistas e esperar até o próximo dia, quando talvez haja vagas nos vagões.
Decido arriscar com os cambistas se eles conseguirem me colocar dentro do trem, que sai às 17h30, ou seja, em menos de 20 minutos.
As propostas começam em 100 bolivianos. Outro me oferece uma passagem de janela por 80. Termino comprando pelo preço de balcão (52 bolivianos) e atravesso fácil pela fiscalização de documentos graças ao contato do cambista. Mas o medo sobreviverá até os fiscais do trem marcarem minha poltrona e me desejarem boa viagem.

26 de dezembro, Puerto Quijarro, 14 horas e 340 km e muitos ruídos de trem depois.

Para deixar a Bolívia, é necessário pagar 10 bolivianos. As moedas que seriam para a coleção acabam ficando na imigração.
Em Corumbá, a primeira grande marcada da viagem: esqueço de perguntar que horas são e quando percebo, meu ônibus já partiu há 30 minutos. O fuso agora está uma hora adiante do horário boliviano. Minhas atuais 14h são na verdade as 15h deste pedaço do Brasil
Ônibus, agora, só às 17h30, com previsão de chegada em Campo Grande à meia-noite.
Na estrada, uma boliviana fica assombrada quando digo que comprei passagens de trens na mão de cambistas. Segundo me conta, a venda oficial somente recomeçaria no dia 3 de setembro. Até lá, estavam todos os trens lotados.

20 minutos de 27 de dezembro, Campo Grande.

Como eu, há muitas pessoas querendo passagens para Santa Catarina.
Para ficar perto de Florianópolis, compro uma para Curitiba. Previsão de saída: 6h10 minutos. Não vale a pena dormir por cinco horas. Melhor ficar acordado e fazer a barba para tirar a barba de índio depois de 13 dias de estrada.
Deixamos Campo Grande às 8h. Por sorte (e pelos quase R$ 150 reais pagos) é um bus cama, o que garante o conforto.
Atravessamos plantações de soja e de milho, principalmente, e passamos por Londrina e outras cidades. Ao meu lado, um casal parece estar em lua-de-mel e disposto a fazer amor dentro do veículo.

30 minutos de 28 de dezembro, Curitiba, 1.000 km depois.

Curita está fria, apesar de ser verão por estas bandas.
Próximo ônibus para Floripa? À 1h30, com três vagas ainda.

Floripa, pela manhã

Chego em Florianópolis às 6 horas da matina e como bom filho único ligo para dar notícias e tranqüilizar minha mãe.
Totalmente desorientado pelos fusos horários, esqueço que em Boa Vista, cidade brasileira no hemisfério norte, ainda são 4 da matina. Melhor ligar de madrugada que ouvir que nunca dei notícias, acredito.
Agora, é descansar, pensar na volta para BV, desta vez em avião, e escrever minha tese de mestrado em transportes coletivos públicos.

quinta-feira, dezembro 23, 2004

Confusao entre Lima e La Paz

De Puno, a 3.827 msnm, margem do lago Titicaca

Depois de um dia inteiro em Machupicchu, conhecendo a cidade perdida e se metendo a conquistador de Waynapicchu, templo que fica no morro que sempre se ve nas clássicas fotos de MP (duas horas para subir e descer em ritmo de branco, 15 minutos em ritmo inka. E eu fiz em 1h45 em ritmo de índio que já subiu o Monte Roraima mas nao teve tanta acelarada de batimentos cardíacos), pegar o trem de volta para Cusco e perceber, depois de falar com alguns brazucas e peruanos, que as agencias deram o golpe em mais de 100 (bota mais) turistas enviando-nos para Ollantoytambo para pegar o trem (lucro médio de 50 dólares em cada um), peguei o bus para Puno.
Chegando aqui, cansado e com sono, troquei Lima por La Paz e comprei uma passagem de volta para Arequipa sem entender como a rota mais curta e barata poderia ser essa. Mas tudo bem...
Gracas ao guia turístico das ragazzas Paola e Fede, no qual checamos duas vezes a rota, decidi voltar para trocar a passagem por outra para Copacabana. Na rodoviária percebi como estava prestes a voltar ao ponto inicial da partida. Discute aqui, discute lá, deixa uns soles na mao do vendedor, compra outra passagem para La Paz e fica na boa. La Paz por Lima...acho que foi a letra L...

Nei, vc quer saber do Lago Titicaca? É água sem fim, com um horizonte cortado pelo totora, palha com a qual os Uros fazem as suas casas. A água é fria (9 graus em média)e é fascinante andar sobre as ilhas flutuantes.

MP? É de se parar e pensar o que levou os inkas a conquistarem uma montanha daquele tamanho, cujo acesso em microonibus demora 25 minutos por uma estrada de 8km ou uma hora pela trilha que nasce no povoado no pé da montanha, Águas Calientes.

Tocar nas pedras talhadas e lisas, perceber que eles moldaram uma montanha ao seu gosto e fizeram construcoes que sobrevivem até hoje, resistindo inclusive aos terremotos em Cusco, é a mágia do lugar. Entrar nos quartos,olhar o vale em frente e sentir o vento frio dos Andes no rosto, isso é fantástico.

Lá, encontrei dois catarinenses de Bombinhas (acho que o Orib já esteve lá mergulhando) que estao há um bom tempo excursionando pela América do Sul e já haviam estada em Boa Vista. Fotos e textos em wwww.expedicaotoriba.com.br, com o Raul e a Valquíria.

Agora, rumo a La Paz, na Bolívia.

terça-feira, dezembro 21, 2004

De novo, um imprevisto

Aí vc compra a viagem para MP numa agência, confiado que tudo vai rolar no esquema. Acorda 5 horas da madrugada fria de Cusco para estar na frente do hostal às 5h30. E o que acontece? Nada...
8h50, na agência, pronto para reclamar na Policia Turística do Perú caso nao fazam nada, fica a viagem adiada para o outro dia. Ainda bem que a hospedagem estava paga. O que resta é aproveitar para fazer um tour pelo Vale Sagrado dos Inkas e visitar seus templos , olhar seus relógios solares, a cruz inka, suas construcoes no pés de montanhas e se perguntar como os caras conseguiram fazer tudo isso há mais de 500 anos e como os espanhóis destruiram tudo para erguer sobre as bases das construcoes seus templos e casas.
O bom do dia é que o passeio foi compartido com as italianas Paola e Federica e com os chilenos Lisé e Osmar, conhecidos do city tour do dia anterior.
Na volta, a confirmacao da ida a MP e a saída para Puno, às margens do Titicaca na noite de quarta.
Enquanto isso, percebe-se que ser bilíngüe por aqui é o mínimo que se poder ser. Os turistas falam, em sua maioria, três linguas (a mae, o inglês e o espanhol, mas há quem fale até cinco).
Os guias, bom, deles nem se fala. Até os indígenas ambulantes falam ou arranham em três idiomas. A deles, o espanhol e o inglês.
E os brancos que os conquistaram é que eram espertos.


segunda-feira, dezembro 20, 2004

Cuzco, a um passo (e 95 dólares) de Machu-Picchu


A viagem ao Vale do Colca, onde esta o canyon mais profundo do mundo foi legal. Mas ver 1.200 metros de pedras, peruanas vendendo artesanado, lhamas, alpacas, conjuntos bolivianos cantando musica em idiomas indígenas, fazer caminhada à margem de um desfiladeiro, ver ao longe vulcoes e passar frio enche.
Cusco é pura história. É andar no meio da cultura inka (aqui se escreve assim) e espanhola.
Também é sentir que a indústria do turismo peruana nao perdoa. Te cobram tarifas para embarcar nos avioes e nos onibus. E nem pense em ter pelo menos o acesso ao banheiro garantido. Pague por isso ou fique na vontade.
Por isso, todo mundo entra logo no esquema de mochileiro. A pechincha é uma obrigacao.
Somente assim para encontrar um espanhol há 45 dias rodando no Perú ou uma francesinha que vai para 3 meses e meio rodando pelo Chile, Bolivia e Perú. Tudo na base do que for mais barato.
Pegar aviao é doideira aqui. Os precos quintuplicam e vc ainda tem que pagar uma taxa para a Infraero local. Por isso, os gringos viajam quase sempre de bus.
Bem, nesta terca MP e depois Puno, para ver as ilhas artificiais do Lago Titicaca.
Depois, bom, depois...Acho que La Paz. Um dia chego em Corumbá. Se a grana der.

Update

Entao...a galera cobra em dólares, mas depois que se passeia por construcoes inkas e se escuta a história de como fizeram seus templos, se toca em pedras talhadas há séculos e se olham altares onde eram feitos sacrifícios humanos, a inversao em cultura geral vale a pena.
Há também o prazer de encontrar os viajantes que se inspiraram em filmes como Diários da Motocicleta, como as italianas Paula e Frederica, que vao rodar pedacos do Perú e Bolívia só porque assistiram o filme.
E por hoje, depois de passear nas ruinas de Saqsaywama,, Q'enqo, Puka Pukara e Tambomachay, é bom lembrar de uma passagem de Diários: Tudo foi feito pelos inkas e destruído pelos espanhois, os incapazes.


sexta-feira, dezembro 17, 2004

Passando perrengue no Perú

De Arequipa, a 1003 km de Lima

Bem, somando Boa Vista - Manaus - Tabatinga - Iquitos - Lima - Arequipa, acho que já rodei uns 4 mil km em uma semana, via terra, ar e água.

Até agora já passei perrengue no Rio Amazonas, com o barco de motor ferrado, e no trecho para Arequipa, na beira do oceano Pacífico, quando o bus que faria a viagem em 14 horas (saída as 17h de Lima) teve de parar na rodovia Panamericana Sur por conta de uns desmoranamentos de pedras. Isso foi as 4 horas desta sexta. Saímos de lá as 9h (ainda nao encontrei a crase no teclado) e a 15 minutos de Arequipa, o carro pifou. Daí, espera para fazer baldeacao, chega aqui, o dia já todo perdido, corre para ver o que pode ser visto tao tarde, topa com centenas de gringos, a temperatura baixando para os 21 graus desta época, compra o boleto para fazer uma viagem ao Vale do Colca, com um dos canions mais profundos do planeta (3.400 metros no ponto máximo) e esperar para manha um chá de coca (aqui tem uns blusas legais que dizem algo como a "a coca é legal, ruim é a cocaina. Mas os caras nao querem vender duas por 15 soles, se nao levava para um amigo mal humorado daí).
Lima foi uma droga. Para os visitantes futuros: fiquem em Miraflores, a parte mais central e turística da cidade. Daí é possível chegar ao centro velho e pirar,entre outras coisas,com uma igreja franciscana e suas catacumbas cheias de ossos. É fantástico...Nada de ficar fora do Centro Velho ou de Miraflores, repito. Se nao, vao se dar mal na hora do deslocamento.
Em Miraflores, por acaso, há um sítio arqueológico chamado Museu de Pucllana. A entrada custa cinco soles. Fica bem no meio de um bairro residencial. Agora é que os arqueólogos estao fazendo as escavacoes. É gigantesco (tem seis hectares e uma altura, calculo, de 15 metros. De noite parece um depósito de areia. Mas antes tinha 20 hectares. É de uma cultura de 700, 800 antes de Cristo, os Lima).
Agora vou passar dois dias no Vale do Colca e depois, finalmente, encarar o que vim fazer aqui: Cusco e Machu-Picchu.
Ah, curiosidades. A empresa de onibus na qual vim (Cruz del Sur, mas tem um bocado fazendo essa rota) dá janta com refri (lembra a comida de aviao) promove bingos sorteando a passagem de volta para Lima (quase...só faltaram dois números) e vende água e salgadinhos. Zero água.
Por favor, dá para mandar mais energia positiva? Ou tá pouca a enviada ou os Andes estao bloqueando a transferencia.
Bjs a todos os que estao comentando. Fico feliz em te-los perto nem que seja virtualmente. Afinal, estar ligado virtualmente perto de casa é uma coisa. No teto das Américas é outra.


quarta-feira, dezembro 15, 2004

Uma odisséia na água

(De Iquitos)

Resumindo: nunca fiquei tanto tempo perto de água. A viagem que duraria somente 9, 10 horas no máximo, transformou-se numa jornada de 27 horas, com direito a paradas em aldeias indígenas e vilarejos onde a energia elétrica é desligada quando batem as 21h30, batidas em troncos na noite no rio Amazonas, medo de naufragar na madrugada, barqueiros desorientados na nevoa do "cruzamento" dos rios Napo e Amazonas, canoas carregadas de pessoas e frutos que ultrapassam um barco considerado muuuuittto rápppiiiiiido como se fossem iates a jato.
Em Iquitos tem uns táxis que parecem aqueles "paxas" (acho que é assim que se escreve) indianos, só que puxados por motos. A parte central até que é bonita. Só o porto que é feio de se ver.
E o pior é que quando mais se navegava,mais parecia que tinha Amazonas para percorrer.
Bom agora é ir para Lima e depois para Arequipa e depois para Cusco, finalmente.

O bom deste tipo de atraso é que acabamos conhecendo pessoas que estao na estrada como a gente, seja a negócios, turismo ou trabalho. O barco, que pela averia foi trocado por uma lancha furreca, parecia um festival de sotaques da Amazonia.

Também se aproveita para refletir um pouco sobre a vida. Mas só um pouco, que cansa.

Bom, agora, da selva para os andes.

segunda-feira, dezembro 13, 2004

Um Pemón na estrada

De Tabatinga, uma outra fronteira


Se fosse de barco, demoraria 3 dias para chegar aqui. Mas nada que um investimento numa passagem de avião não resolva para ser possível cobrir 1.105 km em linha reta em duas horas e meia. Por água, a distância sobe para 1.607, segundo o portal da cidade. Somando com o trecho de ônibus de Boa Vista a Manaus (mais ou menos 800 km), já fiz quase dois mil km. Ou seja, tô rodado.
Tabatinga é abafada, como todas as cidades amazônicas. Tem moto-táxis que rodam sem capacete, tem contrabando de um monte de produtos que vão para Letícia, a cidade a lado, como importação (ou seja, mais baratos) e voltam sem pagar impostos. O comércio de confecções é agitado. O porto também. Muitos índios pobres na beira do mar vendem farinha que trazem em "baldes" feitos de palmeiras. É outro mundo, o que me lembra que se metade do que o poder público alega investir fosse usado para melhorar a qualidade de vida das pessoas chegasse até elas, o mundo estaria melhor.
A passagem para Iquitos, a próxima parada, custa 50 dólares por barco, numa viagem que demora 12 horas. Tem uma empresa de aviação que faz a rota duas vezes por semana, mas não descobri o preço.
O barco sai às 5 da manhã. Tomara que não vire. Afinal, ainda não sei nadar e ainda quero chegar em Floripa para comer peixe na beira do mar...
Esta é a terceira cidade fronteiriça que conheço. Em todas, por coincidência, há uma grande concentração de indígenas. Mas aqui é difícil saber quem é colombiano, peruano ou brasileiro. Sei que todos são índios pelos traços, principalmento o nariz adunco. Isso me lembra como o conceito de nação e país é abstrato, mais ocidental de que outra coisa.
Me sinto no entroncamento do fim do mundo, mas próximo ao teto do mundo.

(Aos amigos que vão me ler e tem seus blogs e fotologs, vai ser complicado retribuir a gentileza. Mas espero que continuem mandando força positiva.)


sexta-feira, dezembro 10, 2004

Alturas de Macchu Picchu,

do livro Canto Geral, de Pablo Neruda

Então na escada da terra subi
entre o emaranhado atroz das selvas perdidas
até a ti Macchu Picchu.
Alta cidade de pedras escalares,
por fim morada do que o terrestre
não escondeu nas adormecidas vestimentas.
Em ti, como duas linhas paralelas,
o berço do relâmpago e do homem
embalavam-se de espinhos.

Mãe de pedra, espuma de condores.
Alto arrecife da aurora humana.
Pá perdida na primeira areia.

.........................

Tomara que consiga pensar em alguma coisa parecida quando topar com as pedras escalares.

A cada viagem, sempre o receio:se alguma coisa ruim deve me acontecer, que seja depois e não antes ou durante a caminhada.

A cada viagem, o desconforto de deixar o conforto e a excitação de encarar o desconhecido.

A cada viagem, a tentativa de saber como retornarei, a fim de tentar validar a lei do Saramago: todo aquele que começa alguma coisa não é o que a começou.

A cada viagem, pensar na próxima viagem.

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Da série Redatores da Fronteira, Bruno Garmatz, tomador de chimarrão, escritor à procura de uma editora e zen foto-jornalista chefão do fotolog Veja Roraima.



Sumário

O que eu não gostava em você
Não eram os teus ataques histéricos
Nem teus porres homéricos
Nem teu jeito maluquinho de ser.

Também não eram tuas roupas esquisitas
E os cabelos vermelhos
E toda hora dando conselhos
Pelo telefone em conversas infinitas.

Nem tampouco os teus peneuzinhos
E o vício de mascar chicletes
Ou aqueles enormes joanetes
Que enfeitam teus pezinhos.

Também não era teu umbigo saltado
E nem a tua celulite
E essa tal sinusite
Que não saía do teu lado.

E nem as rugas do canto do olho
Que chamam de pés-de-galinha
E aquela tua comidinha
Sempre tão cheia de molho.

O que eu não gostava em você
Não era a tua mania de tirar sarro
E sim o maldito cigarro
Que você não conseguia esquecer.

quinta-feira, dezembro 02, 2004

Falando de uma viagem

Ao entrar na Venezuela, no posto de fiscalização, a revista do Guardia Nacional:

Desça de carro
Documentos
O que tem no bolso?
O que tem na pochete?
O que tem na carteira?
Que tipo de moeda você carrega?
De onde você vem, para onde vai?
Você é deste, daquele ou do outro estado? Parece.
O que você faz na vida e no Brasil?
Ok. Pode guardar. Fulano, vai checar o senhor? Sim, por ali, por favor.

Na tenda militar, quente e abafada:
Documentos
O que tem na pochete?De onde você, para onde vai?
O que você faz na vida e no Brasil?
Tem crachá? Posso ver?
Hum, jornalista é periodista? Tudo bem, pode ir. Nós levamos isso, quer dizer, eu levo em conta quando a pessoa tem uma profissão definida. Você sabe que tudo isto é procedimento rotineiro.

Na saída, depois que pego a bagagem, pela segunda vez neste ano ouço a frase, dita em tom de voz leve e esclarecedor aos outros Guardias: el chamo es periodista.

E aí eu lembro que a fronteira é uma rota de tráfico internacional de cocaína e me pergunto o que os Guardias fariam se fosse alguém sem um crachá, diploma ou profissão para ser referenciado.


segunda-feira, novembro 29, 2004

Manhã de segunda-feira. Calor em Boa Vista. Ar seco. Suor.
O calor me incomoda, me deixa enjoado. Mais de uma década depois, ainda não me acostumei com ele.
Na delegacia, o mau cheiro me deixa mal. Quase uma hora para registrar queixa.
O ambiente das delegacias e dos hospitais me deprime. Acho que não conseguiria trabalhar neles.
Na recepção e na sala onde se fazem os BOs, apenas um ventilador. Paredes sujas, descascando. Quero vomitar.
O policial é bom no atendimento, encaminha bem as coisas. O escrivão é educado, porém realista: vá comprar outra bike, meu rapaz. No tempo que estou aqui, nunca vi ninguém recuperar a sua.
Eu também, penso. É a quinta que me furtam desde que vim morar aqui. A mãe de uma amiga me orientava sempre a deixar preenchido o formulário de queixa. Agilizaria minha vida.
Já me levaram gravadores, tênis, sandálias, camisetas, bermudas, mochilas, livros...apenas para falar de objetos. Nunca os recuperei. Apenas para mencionar objetos.
Acho que não vou mais trilhar neste ano. Mais um da turma que entra de licença forçada.
Na rua, olho todos os ciclistas com mais atenção.
Perder é bom por isso. Os detalhes do mundo passam a ter mais importância.
A perda também quebra rotinas. Mas tudo o que não precisava nestas duas semanas era isso, assim como a necessidade de ir à Venezuela repentinamente.
O que desejo para o ladrão? Nada de mais. Não sou vingativo. Apenas que seja atropelado. Ou que um cachorro o morda na jugular na próxima vez que entrar no terreno alheio.
Acho que o calor me deixou irritado...


sexta-feira, novembro 26, 2004

Cenas românticas


Olhe para mim. Sinta minha fome de você.
Chegue mais.
Sorria, que eu te olho fascinado.
Cheiro teu rosto inteiro.
Se quiser rir, faça isso.
Ainda te cheiro, desta vez no cabelo. Minha mão direita na tua nuca.
Volto de teu cabelo, tocando teu rosto com meu nariz e minha boca.
As duas mãos na tua cintura.
Roço meus lábios nos teus e busco sentir tua respiração, teu hálito.
Os lábios se tocam, se molham.
O beijo, de fato.
As mãos, na nuca. As mãos no corpo.
O beijo lembra o primeiro do nosso namoro.

O restante é o de sempre. Você me lembra que hoje é quarta, diz que está com dor de cabeça e que prefere ler um livro. Eu vou pegar uma cerva enquanto te xingo mentalmente e depois ligo a TV para ver uma partida de futebol.

quarta-feira, novembro 24, 2004

Bomba mata promotor que investigava adversários de Chávez

"O promotor disse à agência de notícias Reuters há menos de duas semanas que esperava completar em breve o indicamento formal de todos os acusados."

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Na Venezuela, quem se mete a besta com as elites que dominaram o país durante 43 anos morre.

Foi esse o destino do promotor de justiça Danilo Anderson, que investigava as pessoas envolvidas no, por enquanto, último golpe de estado do país vizinho, em 2002.

O governo Hugo Chávez Frias, incluído no eixo do mal pelo reeleito Bush Júnior, já está adiantado na caça dos assassinos que explodiram uma bomba no carro de Danilo e movimenta sua bancada parlamentar para aprovar uma lei anti-terrorista que limite a ação dos paramilitares supostamente treinados pela CIA para desestabilizar a V República.

Alguns desses homens já foram presos neste ano a poucos quilômetros da residência oficial do presidente. E de vez em quando aparece um líder oposicionista dizendo que a solução para os problemas da Venezuela está numa arma de precisão com mira telescópica apontada para a cabeça de Chávez.

Chávez, falastrão e altaneiro quando se trata de defender o que considera ser o melhor para os venezuelanos, não poupa críticas à política externa dos Estados Unidos da América (sic) de levar a democracia e a paz a todos os rincões do planeta, citando sempre o Iraque, Afeganistão e Colômbia, entre outros países.

O que será do futuro político do país vizinho é uma incógnita.

De certo, só que na Venezuela se leva muito a sério o refrão "quien a hierro mata, a hierro muere", amaciado em português para "quem com ferro fere, com ferro será ferido."

segunda-feira, novembro 22, 2004

Da série "Redatores da Fronteira", um texto de Ricardo "Pcapuleto" Amaral, estudante de jornalismo da UFRR, jogador de futsal e integrante do Orkut, escrito num dia não muito distante de sua adolescência.


Depois de tudo, sempre viverei no limite
No limite extremo
Que a determinação me permite.
Com os olhos talvez perdidos
No desejo de querer-te,
Envoltos em lágrimas
Que escorrem pelo chão,
Formando um oceano infinito,
Mar de paixão...
Talvez nem mesmo me encontre
Neste labirinto,
Mistura de emoções que trituram meu coração,
E me fazem morrer por dentro...
Mesmo assim,
Talvez sem estarmos presentes
A esses encontros que duram para sempre...
Nossas almas persistam em viver
Nos desencontros casuais de nossos destinos...
Talvez nossos pensamentos se busquem mutuamente
Para juntos recordarem todos os momentos.
Lembranças guardadas junto de suas existências são como o tempo,
Nunca terminam e não morrem jamais.

sexta-feira, novembro 19, 2004

Euzébio, o contador

(De G. Guarabyra, publicitário, jornalista e amante de futebol e da boa cozinha)


Em seu quarto alugado, Euzébio era o retrato da solidão. Sozinho desde que a mulher confessou, em lágrimas, que não agüentava mais aquilo, passou a viver com a metade do coração. Procurava um emprego, desesperadamente, ainda alimentando a esperança de que um dinheirinho - pouco, mas certo - seria o suficiente para arrumar as camisas no guarda-roupa e a vida nos trilhos. Calças e camisas amarrotadas se espalhavam sobre a cama sempre desarrumada, a pia do banheiro repleta de cuecas mergulhadas na água.

Acordara cedo, disposto a arriscar na passagem de ônibus os últimos trocados emprestados por um amigo. Não é possível que nessa cidade ninguém esteja precisando de um contador habilidoso e experiente com eu, injetava confiança em si mesmo. Tentava desamarrotar a camisa usando as mãos como se fossem um ferro de engomar.

A barriga não cabia mais dentro da calça. Em todas as peças romperam os botões. Havia encontrado um grande alfinete que servira para prender as fraldas da pequena Camila, quando ele, a filha e a mulher, Marilza, ainda viviam juntos. As duas partes da calça que precisavam ficar presas corriam para os lados, mas acabavam contidas pelo grande alfinete, uma peça formada por duas hastes de metal, uma delas presa por uma presilha na ponta.

Na parte mais abaixo o zíper permanecia aberto até o meio da braguilha, mas as bordas da camisa encobriam o alfinete, um detalhe, para ele, fundamental. A exibição daquele arranjo seria o mesmo que anunciar publicamente o estado de humilhação em que vivia. Por isso mesmo, habituara-se a caminhar pelas ruas sempre com uma das mãos segurando a camisa na altura do alfinete, de modo a impedir que um vento levantasse a roupa e expusesse aos passantes sua penúria.

Ônibus cheio, como sempre, ficou em pé bem no meio, pronto para avançar quando se aproximasse o ponto onde deveria descer. Uma mão segurando o suporte colado ao teto, a outra impedindo que a camisa levantasse muito.

- É um assalto!
O grito veio do fundo do ônibus. A freada brusca jogou algumas pessoas sobre Euzébio, ele segurou firme o corrimão do teto e, mais firme ainda, manteve a camisa no lugar. Duas portas de emergência foram abertas num piscar de olhos, passageiros caíam no asfalto e corriam em desespero, dois policiais militares surgiram não se sabe de onde, armas em punho, um entrando pela porta da frente, outro pela porta de trás.

No ônibus praticamente vazio os policiais avistaram Euzébio com uma cara suspeita. No empurra-empurra, ele percebeu que o alfinete se abrira. Rápido, meteu a mão por baixo da camisa para impedir que a calça fosse ao chão.
- Ele tá armado!
O cabo Oliveira, campeão de tiro da 8ª Companhia, não teve dificuldade para acertar um disparo bem no meio do peito gordo do contador.
- O elemento ia atirar, Oliveira!
- Se eu não sou ligeiro, hein, sargento!

quinta-feira, novembro 18, 2004

A casa dos barões continua caindo


Manhã agitada na sede da superintendência da Polícia Federal de Roraima. Por conta das investigações do Caso dos Gafanhotos, vários figurões de Boa Vista foram presos, entre eles um ex-secretário de Fazenda, o ex-responsável pelo Tesouro Estadual e os sócios da empresa que fazia os pagamentos dos servidores públicos.

Do lado de fora da superintendência, sob o sol, os representantes da imprensa, ávidos e de óculos escuros. Estavam acompanhados de algumas pessoas que gritavam 'ladrão", "bem feito" e coisas do tipo a cada sujeito que chegava na parte de trás dos camburões da Federal.

Das três rádios FMs da cidade (o sinal das AMs estava péssimo), apenas uma deu cobertura à movimentação. Em certo momento, uma delas falava sobre melancias e outra mandava abraços aos ouvintes.

Na emissora que ficou de plantão, comentários exaltados sobre a ladroagem, sobre a corrupção, sobre justiça sendo feita. Um radialista se revoltou por ter entrado no prédio da Federal algemado, depois que foi pego contrabandeando gasolina da Venezuela, mas não viu os figurões tendo o mesmo tratamento. Falaram em justiça desigual.

Outras pessoas falaram em fortalecimento da democracia, moral e ética.

Como de costume, também se falou (e vai ser escrito, com certeza) em vergonha para o Estado, exposição desnecessária, constrangimento.

Parece que todos querem ver presas as pessoas acusadas de desviar cerca de 230 milhões de reais dos cofres públicos, mas de preferência sem alarde, afinal, todos se conhecem em Boa Vista, todos freqüentam as mesmas festas e aparecem nas mesmas colunas sociais, têm a mesma pinta de boa gente, usam quase sempre as mesmas marcas de carros e motos importadas.

É sempre a mesma reação. Os servidores-fantasmas, ou gafanhotos, por serem os devoradores da folha de pagamento, não são uma novidade. Nas eleições de 1998, o extinto jornal O Diário, ligado intimamente ao governador Ottomar Pinto, publicou uma listagem dos deputados e secretários estaduais e a cota de gafanhotos de cada um. No outro dia, na mídia escrita, apenas as defesas do grupo do então governador Neudo Campos. Ninguém questionou muito, talvez para não perder as cotas de publicidade, talvez por acreditar que eram mentiras criadas pela imaginação de um grupo de descontentes.

E assim se faz a história em Roraima.

terça-feira, novembro 16, 2004


Depois de uma semana de surrealismo político, O Crônicas da Fronteira tem o prazer de apresentar mais uma edição de sua série de maior sucesso: Escritos para mulheres especiais.


Acuerdo

(para ler ouvindo "Il postino" ou "Beatrice", da trilha sonora d?O Carteiro e o Poeta)

Hagamos un trato:
Si quieres me voy.
Si no, me pongo donde mandes,
Me vuelvo un polo sur
Uma aldea a orillas del Amazonas.

Hagamos un trato:
Yo me quedo tranquilo
Si me dejas dormir en paz
Acompañado solamente de la luna.
Acéptalo, por favor,
Mis lágrimas te lo imploran
Lo necesitam como cielo azul al sol
Como isla al oceano.

Déjame vivir lejos
O recibe mis poemas
Y leelos por las noches.
Cuando amanezca, miénteme
Si es necesario y dime que
Se parecen a los de Neruda.

Hagamos un trato:
Dime que trato quieres
Para arreglar esta situación
Y echar el barco al mar
Para ver en que lugar podemos navegar.

Hagamos la paz o la guerra
Hagamos distancia o amor.
Pero tiene que ser ahora.
Lo siento, pero soy así.
Como agua sin sed
Com letra sin papel.
Soy así, sin ti.

Por eso te lo pido
Por la vida, por Dios en el cielo,
Antes que sea tarde
Y todo sea imposible,
Hagamos un trato.

sexta-feira, novembro 12, 2004

De novo, política.

Não deu pra aguentar...Leia na tarde de sexta o que sairá no sábado n'O Globo. Depois, lá embaixo, clique no link que te leva para um artigo no site do Marlen sobre a situação da política roraimense. Até semana que vem.
(Sobre o post anterior, mudou tudo na Assessoria de Comunicação, com o descarte do nome anunciado em plena cerimônia de posse. É o jeito Ottomar de ser.)


Ottomar consegue recuperar R$ 12 milhões
desviados de convênios federais em Roraima

Humberto Silva
Especial para O GLOBO



BOA VISTA (RR). O novo governador de Roraima, Ottomar de Sousa Pinto (PTB), empossado na quarta-feira após decisão do Tribunal Superior Eleitoral que confirmou a cassação do mandato de Flamarion Portela (licenciado do PT) anunciou ontem que encontrou nos cofres do estado pouco mais de R$ 1 milhão, porém, numa operação entre a Secretaria da Fazenda e a rede bancária, conseguiu recuperar mais R$ 12 milhões, que segundo ele, ?através de manobra conseguiram desviar os recursos de convênio federal para fazer pagamentos que não correspondiam ao convênio?.

Ottomar disse que com a recuperação dos aproximadamente R$ 12 milhões, de convênios federais, recebeu o governo com um caixa de R$ 14 milhões. ?Tivemos que agir rápido para que não fossem descontadas as ordens bancárias?, afirmou o governador negando-se a informar em nome quem eram os pagamentos, para não atrapalhar a auditoria que determinou em todas as secretarias.

Dívidas

Além da tentativa de desvio de R$ 12 milhões, de convênios federais, Ottomar Pinto herda diversos acordos de renegociação de dívidas junto ao INSS, Eletronorte e ainda o empréstimo concedido pela CAF ? Corporação Andina de Fomento ? no valor de US$ 23 milhões, ainda na administração do ex-governador Neudo Campos, cujos recursos deveriam ser destinados a interiorização da energia de Guri.

A obra de interiorização não foi realizada na administração de Neudo Campos nem na de Flamarion Portela e a partir de 2004, o governo de Roraima tem que pagar duas parcelas por ano no valor de R$ 7 milhões cada, sendo uma em junho e outra em dezembro.
Junto ao INSS, antes de sair do governo, Flamarion Portela fez uma renegociação da dívida reconhecida no valor de R$ 232 milhões. Hoje o Estado paga R$ 600 mil por mês.

Além do empréstimo com a CAF e a renegociação com o INSS, Roraima tem outro acordo, junto com a Eletronorte e tem que desembolsar mensalmente R$ 1 milhão. Desde que o Estado foi implantado em 1991, nunca se pagou a energia consumida pelos prédios públicos.

Lula

Durante entrevista ao jornal O Globo Ottomar Pinto disse que vai ter uma relação respeitosa com o Palácio do Planalto, alertando que ?não vamos ser alinhados com tudo que o presidente Lula queira. Teremos relação respeitosa?, disse ele acrescentando após ter o levantamento das dívidas do estado com a União, vai buscar o Poder Central para discutir a situação.

Gafanhotos

Após a posse de Ottomar Pinto no governo de Roraima, o Tribunal Regional Eleitoral anunciou para o dia 23 de novembro o julgamento de uma Investigação Judicial Eleitoral impetrada por Pinto contra o ex-governador Flamarion Portela e mais cinco deputado reeleitos em 2002 ? Chico Guerra (atual vice-presidente da Assembléia), Mecias de Jesus (presidente da Assembléia), Berinho Bantin, Urzeni Rocha e Sérgio Ferreira, além 11 ex-deputados e um vereador de Boa Vista.

O processo é pautado no Escândalo dos Gafanhotos, que em novembro de 2003 levou mais de 57 pessoas para a prisão, inclusive o ex-governador Neudo Campos.
Na pauta da sessão do TRE-RR do dia 23 de novembro serão julgadas três Investigações Judiciais Eleitorais movidas por Ottomar Pinto contra Flamarion Portela, deputados e ex-deputados. O processo já está com relatório final elaborado pelo Corregedor-Eleitoral, desembargador José Pedro Fernandes que não se encontra em Boa Vista.

Na Investigação, os advogados de Ottomar Pinto acusam o ex-governador e parlamentares de sua base aliada de terem utilizado um grupo de 20 pessoas para receberem de janeiro a julho de 2002, por meio de procuração, o salário que o governo de Roraima pagou para 319 servidores ?fantasmas?.

O TRE-RR cassou em 2004 os mandatos dos deputados estaduais Flávio Chaves (PV) e Jálser Renier (PFL). Chaves conseguiu voltar ao mandato por decisão do Tribunal Superior Eleitoral que por sua vez manteve a cassação de Renier. Ambos foram acusados de compra de votos.

Juristas ouvidos no Tribunal Regional Eleitoral não adiantam qual pode ser a decisão de relator as investigações, antecipando apenas que no caso dos ex-deputados envolvidos a pena pode ser apenas de inelegibilidade. Quantos aos parlamentares detentores de mandatos, podem ser cassados.

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Muito bem, já que vc aguentou a leitura e deve estar pensando como diabos Roraima chegou a este ponto, vale a pena ler a versão do Marlen:


E ASSIM TUDO COMEÇOU

Eduardo Levischi, então ex-diretor geral e todo poderoso do DER foi exonerado e abandonado pelo Reizinho de Coreaú. Estando entregue a própria sorte e tendo o Ministério Público em seu calcanhar, o matreiro Levischi tomou a decisão mais sensata para sua vida. Assim pensou...'entrego tudo o que sei e o que tenho de documentos, tendo em troca privilégios no processo do roubo de milhões de reais...'. (Leia o artigo completo)


Ainda sobre o novo governo

(Infome da gerência: Voltaremos da surrealidade na próxima semana)


Em tempos de mudança de governo, o melhor informativo a ser lido não é da iniciativa privada, mas sim o Diário Oficial do Estado.

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Nem nas festas feitas pelo ex-governador Flamarion Portela tantos carros ficavam parados por tantas horas na área de estacionamento da sede do Executivo.

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O mundo da política não é lógico. Quem estava à frente, fica para trás. Quem estava nos bastidores, ganha um holofote só para ele. Ou, no caso, a Assessoria de Comunicação.

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Ottomar resgatou do ostracismo o dono do jingle mais lembrado das campanhas políticas de Roraima: Belgerrac Batista, que nas primeiras eleições diretas para governador de Roraima, no início da década de 90, com a slogam: tá tudo bem, tudo Bell!

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O secretariado do novo governo é formado por antigos colaboradores e uma turma que se aliou e acompanhou o brigadeiro mais recentemente. Entre os cargos que já distribuiu, beneficiou um cunhado, a esposa (ex-senadora Marluce Pinto), um genro e um sobrinho. Alguém falou em nepotismo?

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O governador já disse a que veio: é sim candidato a reeleição e vai trabalhar para que a reserva Raposa ? Serra do Sol não seja homologada em área única, com seus 1,8 milhão de hectares. O CIR que se dane.

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O PT nacional disse à Agência Folha que aceitar Flamarion no partido foi um erro que poderia ter sido evitado, um alerta, para ser mais exato. Mas só agora eles perceberam, depois de dezenas de denúncias de corrupção, um ano de afastamento da sigla, vários julgamentos na Justiça e cassação do mandato do homem?